Pesquisar
Pesquisar

Cristina Kirchner denuncia lawfare na Argentina comandado a partir dos EUA

Cristina Kirchner combate contra 8 processos, em capítulos de um grande show da mídia hegemônica, sobretudo em um ano eleitoral
Helena Iono
Brasil 247
Brasília (DF)

Tradução:

A ex-presidenta Cristina Kirchner, com um fortíssimo discurso, reitera o alerta à estratégia do chamado “lawfare” em andamento contra os governos e forças progressistas da América Latina, expondo com precisão as recentes denúncias reveladas no chamado “D’Alessiogate” que compromete o promotor Carlos Stornelli, o juiz Bonadio (o Moro argentino) do Tribunal Comodoro Py e toda rede do sistema judicial argentino na formulação da falsa causa dos famosos “Cadernos”,  com evidente participação da embaixada dos EUA.

Leia também:
Diálogos do Sul lança campanha de assinaturas colaborativas no Catarse 

O escândalo das revelações iniciadas pelo portal “Cohete a la luna” (Foguete para a lua), do jornalista Horácio Verbitsky, surgiu a partir de denúncias e gravações apresentadas por um empresário sobre a participação de um agente, Marcelo D’Alessio, a serviço do promotor Stornelli, num sistema ilegal de extorsão e pressão através de delações premiadas e falsos arrependidos, para incriminar empresários e funcionários do governo anterior (ou desalinhados com os interesses neo-liberais do governo Macri), citados nas causas dos “Cadernos”.

Tal denúncia, apenas enfocada por alguns meios de comunicação independentes, tomou uma dimensão de extrema gravidade institucional e política, desde que um juiz, Ramos Padilla, decidiu assumir dita causa baseada em devidas comprovações gravadas e escritas (algumas em inglês), sobre a participação direta da embaixada dos EUA.

Por isso, Cristina Kirchner, se refere no seu discurso a um caderno de provas (no Alessiogate); esse sim, certificado, diferentemente das fotocópias da chamada causa dos “Cadernos” acionada pelo juiz Bonadio e montada num esquema ilícito de espionagem desde o exterior, com apoio de poderes políticos, legisladores oficialistas e jornalistas da mídia hegemônica.

O tribunal Comodoro Py trata de tirar essa causa das mãos do juiz Padilla, que se lança a cumprir seu dever constitucional. Não obstante pressões contrárias, inclusive de representantes de “Cambiemos” no Parlamento, um procurador geral, Eduardo Casal, decidiu cumprir seu dever e convocar o promotor Stornelli a declarar, enquanto o agente D’Alessio já está preso. A oposição parlamentar acaba de constituir uma Comissão Bicameral de investigação e controle dos serviços de inteligência, convocando o juiz Ramos Padilla a expor a causa em questão perante o Congresso, na dependência da aprovação do chefe da Comissão que é de Cambiemos.

Cristina Kirchner combate contra 8 processos, em capítulos de um grande show da mídia hegemônica, sobretudo em um ano eleitoral

Brasil 247
A ex-presidenta Cristina Kirchner

A ex-presidenta Cristina Kirchner chama a que uma causa de tal gravidade, com comprovada intromissão direta dos EUA no sistema judicial da Argentina, passe urgentemente à alçada da Corte Suprema de Justiça. Mecanismos de prisões preventivas como a do deputado Júlio De Vido (FPV), prisioneiro sem provas; do ex-vice-presidente, Amado Boudou (FPV), novamente preso, sem provas; do ex-chanceler Héctor Timerman (FPV) falecido por câncer, e injustamente acusado, junto à ex-presidenta, por traição à pátria, devido à assinatura de um memorando de entendimento com o Irã para investigar o caso AMIA; indicam o mesmo esquema do “lawfare” vivido no Brasil, com a criação da Lava Jato, para perseguir dirigentes do PT, derrubar Dilma Rousseff, e alimentar o meio de cultura do ódio e dos fakenews para a exclusão de Lula da Silva e eleger Bolsonaro como garantia da repressão para impor o saqueio do projeto neo-liberal do FMI, da privatização da previdência social, da Petrobrás e da desnacionalização total do país.

Cristina Kirchner combate contra 8 processos, em capítulos de um grande show da mídia hegemônica, sobretudo em um ano eleitoral. Mas a ex-presidenta não se intimida. Faz público e notório que o Departamento de Estado de Justiça dos EUA, com conluio da grande mídia, levou dois anos para revelar que as informações divulgadas por Daniel Santoro (jornalista do Clarin), incluindo a revista Veja, sobre contas milionárias no exterior, da ex-ministra de defesa Nilda Garret, e do deputado e filho de Cristina, Máximo Kirchner (FPV), eram totalmente falsas.

Cristina Kirchner, deixa claro que uma causa onde se comprova a participação direta de uma embaixada estrangeira em assuntos judiciais, é de “competência originária e exclusiva da Corte Suprema de Justiça”. A Argentina, marcada pelos anos históricos do peronismo, já sofreu reiteradas ameaças à soberania nacional, com o ex-embaixador dos EUA, Spruille Braden, metido por anos desde 1945 nas conspirações e disputa de poder com Perón. Bem lembrado por FC Leite Filho no seu vídeo. Deputados da Unidade Cidadã e da Frente para a Vitória (FPV) alertam para a gravidade do escândalo institucional trazido à luz com o “D’Alessiogate, representando uma ameaça às garantias democráticas e aos direitos humanos de toda a cidadania, como no período da ditadura dos anos 70. Torna-se evidente que reformar o Judiciário tem a ver com garantir a justiça social e a soberania nacional. Tal situação tem colocado também na ordem do dia dos vários legisladores da esquerda, algo já defendido no fim da gestão kirchnerista: a eleição direta e popular dos juízes e membros do poder Judiciário e a revogabilidade dos seus mandatos.

O destape desta crise institucional, e destas denúncias contra os fabricantes dos “Cadernos”, conta, provavelmente, com um setor da indústria nacional argentina disposta a colocar um basta na situação de colapso total da economia e de exclusão social. A entrega do país ao FMI, está levando a uma hecatombe do comércio e da pequena e média indústria. Há 13,6 milhões de pobres, 33,6% da população na área da pobreza, 190 mil desempregados no setor privado em 2018 (atualmente, 20 desemprego/hora, e 1 comércio falido/dia). A indústria nacional manufatureira colapsa sobretudo com os “tarifaços” impagáveis, que entram na conta das demissões em massa. Portanto, as estatísticas que dão 80% de imagem negativa do governo, estão dentro desta lógica; estão na mobilização crescente e multitudinária dos movimentos sociais e sindicatos. Buenos Aires, nesta noite, foi cenário de uma gigantesca manifestação nacional de “barulhaço” contra as tarifas energéticas impagáveis, mas extrapolaram as palavras de ordem rumo a um massivo “Fora Macri”. O ano escolar se reinicia com uma greve nacional de 48 horas dos professores. E no dia 8 de março, as mulheres argentinas, completando 72 horas de greve, prometem voltar com grande força contra o femicídio crescente e pelo “aborto, legal, seguro e gratuito”, mas muito mais.

Cristina Kirchner, senadora e duas vezes presidenta, a candidata com maiores possibilidades de derrotar Macri nas eleições de outubro, revela, neste discurso, ser a referência com maior experiência política e autoridade social para constituir uma aliança de forças opositoras, desde o campo industrial ao movimento popular e sindical, em tecer de um programa amplo de reconstrução do país.

A tentativa de golpe dos EUA contra o presidente Nicolás Maduro redunda num fracasso, graças à determinação heroica do povo e das Forças Armadas venezuelanas, e a solidariedade internacional, acentua um salto qualitativo nos discursos das próprias lideranças latino-americanas, nas quais se inclui a decisão de Cristina Kirchner. Se aprofunda a meta socialista no discurso de Maduro no dia 24 em  Caracas; ampliam-se as relações econômicas e militares e políticas da Venezuela com a Rússia e a China. O chanceler, Jorge Andreazza (veja discurso) se ilumina no Conselho de Segurança da ONU, rebatendo com precisão a tentativa de agressão dos EUA.

Não há dúvidas de que mesmo a disposição e o dinamismo de López Obrador no México de acelerar as metas transformadoras de seu governo se alimenta na consciência do papel que a Venezuela e Cuba representam para o conjunto da América Latina. E vice-versa, o novo México representa uma peça fundamental de estímulo para a revolução bolivariana. O exemplo de Obrador, “duro, mas sem perder a ternura”, é acompanhado diariamente pelo mundo, através das suas medidas anunciadas nas coletivas de imprensa. Abre-se uma nova era, a da democracia participativa, em que as lideranças de esquerda são obrigadas a avançar nas suas capacidades e revisar suas relações com o movimento popular.

O discurso bombástico de Cristina, traz o vento do sucesso venezuelano para dentro da Argentina; na contramão de Macri que corre para receber Guaidó, após dar um débil discurso presidencial de abertura da sessão anual do Congresso, vazio de balanços de governo, nulo em proposições, e encoberto de ira diante da contestação social e da perda dos seus aliados internos.

O povo brasileiro não ficará fora desta contraofensiva latino-americana, apesar de Bolsonaro. Os Comitês pela libertação de Lula deixarão de existir somente quando Lula estiver Livre. É hora de despertar a consciência popular de que não há outro caminho para recuperar a democracia e a soberania popular e nacional sem que a dita Justiça contemple a libertação de Lula; despertar a consciência de que a Justiça verdadeira deve se impor sobre a barbárie judicial fascista desencadeada contra o presidente e ser humano que mais fez pelo povo brasileiro e um dos maiores líderes populares latino-americanos e mundiais. Se as relações de forças internacionais tem jogado a favor da Venezuela, haverão de pesar também na Argentina e no Brasil. Mas, a sintonia fina do povo unido, conscientizado e mobilizado na rua é indispensável.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Helena Iono Jornalista e produtora de TV, correspondente em Buenos Aires

LEIA tAMBÉM

Com Trump, EUA vão retomar política de pressão máxima contra Cuba, diz analista político
Com Trump, EUA vão retomar política de "pressão máxima" contra Cuba, diz analista político
Visita de Macron à Argentina é marcada por protestos contra ataques de Milei aos direitos humanos
Visita de Macron à Argentina é marcada por protestos contra ataques de Milei aos direitos humanos
Apec Peru China protagoniza reunião e renova perspectivas para América Latina
Apec no Peru: China protagoniza reunião e renova perspectivas para América Latina
Cuba luta para se recuperar após ciclone, furacão e terremotos; entenda situação na ilha (4)
Cuba luta para se recuperar após ciclone, furacão e terremotos; entenda situação na ilha