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Roberto Correa Wilson*
No século XV Portugal foi o primeiro país da Europa a estar presente na África, quando seus navegantes chegaram às costas da região, o que abriu um dos capítulos mais tristes e humilhantes para os povos do continente.
No século seguinte traficantes portugueses associados à Coroa lusitana iniciaram a caça e envio de homens e mulheres das regiões ocidentais africanas para o Brasil colônia, para trabalhar em regime de exploração escravagista em plantações de cana de açúcar.
Mais tarde o comércio de escravos intensificou-se. Traficantes ingleses, franceses, holandeses e espanhóis imitaram os portugueses, porque essas nações europeias tinham firmado seu domínio colonial na América e no Caribe, onde utilizavam igualmente o sistema escravagista em fazendas de cana de açúcar, algodão e otras culturas, e também na extração mineral.
A mão de obra aborígene, submetida a cruéis abusos, não era suficiente, e os donos de plantações precisavam de mais força de trabalho. Nas zonas ocidentais africanas aumentou a caça aos nativos, que eram levados a centros como Gore, para posteriormente serem embarcados em navios negreiros com destino ao chamado Novo Mundo.
Cuidadosos pesquisadores calcularam em mais de 20 milhões os africanos que chegaram à América e ao Caribe. Outra cifra considerável, ainda que desconhecida, morrreu no trajeto, não podendo suportar os rigores da travessia.
Em quase todas as nações americanas e caribenhas os senhores submetiam os africanos a abusivos sistemas de trabalho, aplicando-lhes castigos que pareciam saídos de mentes diabólicas, o que fez com que, desde o próprio século XVI, ocorressem as primeiras resistências dos escravos; estas tiveram sua expressão mais notável na fuga e formação dos quilombos.
Com o trabalho escravo foi construída a riqueza e o bem estar da classe dominante branca de ascendência majoritariamente europeia nas nações onde floresceu esse sistema. Mas, na medida em que os exploradores enriqueciam, aumentava a rebeldia dos escravos, que fugiam das fazendas para a mata, as montanhas ou a selva, de acordo com os países, formando povoados, os chamados quilombos, onde levavam vida comunitária, devendo defender-se das perseguições organizadas pelos senhores e executadas por seus implacáveis capatazes e bandos armados.
Nas colônias caribenhas da Grã Bretanha, França, Holanda e Espanha, a resistência dos escravos chegou a proporções que alarmaram os propietários de plantações, mas a bárbara repressão dos escravagistas não pôde conter o desenvolvimento contínuo do processo de formação dos quilombos.
Zumbi, o rebelde
Um exemplo paradigmático foi o de Zumbi, no Brasil. Muito jovem, Zumbi assumiu o comando do quilombo dos Palmares, formado por escravos fugitivos no final do século XVI, em uma zona afastada, de mata, do atual Estado de Alagoas. Dali conduziu-se a resistência contra numerosas investidas do exército colonial e de grupos mercenários.
Na região dominada por escravos fugitivos existiam vários povoados no meio da mata. O maior deles era uma vila batizada de Macaco, com umas 1.500 casas e mais de 8.000 habitantes que se dedicavam a uma agricultura básica e a uma metalurgia rudimentar.
Sob o comando de Zumbi, os “palmarinos” organizaram-se para atacar de surpresa as enormes plantações de cana de açúcar e libertar mais escravos que fugiam em direção ao quilombo dos Palmares, levando as ferramentas de seus antigos donos. Em 20 de novembro de 1695 morreu Zumbi, num combate desigual; mas grupos armados resistiram na zona até 1730.
No Haiti, a revolução de 1791, protagonizada pelos escravos haitianos, sob a direção de Toussaint Louverture, não apenas marcou a independência da nação caribenha, a primeira a emancipar-se do jugo colonial europeu no hemisfério ocidental, como foi ponto de partida para as guerras de independência na América Latina e no Caribe.
Em 1834 a Grã Bretanha, pioneira da Revolução industrial, já não estava interessada no tráfico de escravos e o declarou ilegal, ao mesmo tempo em que proibia a escravidão em suas colônias da América e da África. No entanto, essa ordem encontrou tenaz resistência nas colônias dominadas pelos europeus.
O repúdio à norma britânica pelos donos de plantações que se beneficiavam com o trabalho escravo fez com que sua aplicação não se tornasse efetiva de imediato e a escravidão continuou em numerosos países durante várias décadas ao longo do século XIX.
Aliás, a Coroa britânica estabeleceu uma base naval na baía de Freetown, em sua Colônia africana de Serra Leoa, para perseguir os violadores da decisão de Londres.
Mas nada poderia deter o curso da história, apesar da oposição dos escravagistas. Não sem lutas ou pressões dos abolicionistas, progressivamente o infamante flagelo da escravidão foi abolido nas nações da América e do Caribe.
Monumentos em homenagem à rebeldia escrava, considerada precursora da independência da América, foram erguidos em vários países.
No Brasil, a primeira nação a receber escravos no século XVI e a última a abolir a escravidão, em 13 de maio de 1888, a cada 20 de novembro rende-se tributo a Zumbi, símbolo dos africanos escravizados; em sua honra foi erigido um busto de bronze na cidade do Rio de Janeiro.
*Prensa Latina, de Havana, Cuba, especial para Diálogos do Sul – Tradução de Ana Corbisier