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Feliz dia, vão te dizer solenemente como se tiveste realizado uma proeza, porém não. Deste à luz um filho sem que o quiseste, quase sem saber, um filho que ao chegar, nos teus 12 anos apenas, marcou o início de uma etapa sem perspectivas. O pequeno produto de um ato de baixeza infinita que acabou com tua infância e a converteu em uma maturidade indesejada. Pior ainda, te condenou a mais injusta cadeia de privações.
Carolina Vásquez Araya*
Feliz dia, mãe de um dos 26.400 crianças e jovens meninos assassinados na América Latina e Caribe só no transcorrer de um ano, por causas que ainda não podes compreender e cuja dor sentes com a mesma intensidade de quando te informaram que foi morto por um tiro certeiro. Nunca pudeste entender o porque.
O que resta de ti, mãe desse jovem no limiar de seus sonhos, desaparecido ou morto, quem sabe onde e como? Esse adolescente cujas pistas o governo mexicano, hondurenho, salvadorenho ou guatemalteco se nega a escutar-te porque não sabem ou talvez prefiram manter o enigma que te perseguirá para sempre como um pesadelo sem fim? Esse jovem que um dia saiu da escola ou do trabalho ou de sua própria casa para desvanecer-se no ar como um fantasma, deixando-te submersa na tristeza.
Feliz dia das mães, menina-mulher, ignorante de teus direitos porque nunca te permitiram frequentar uma escola. Assim acorrentaram tua liberdade a um fogão, um esfregão, um sulco de arado. Tu, que desde teus primeiros dias de vida aprendestes o papel que outros te assignaram para este mundo: o de uma maternidade forçada e uma escravidão institucionalizada por uma sociedade para a qual não tens nenhum valor.
Feliz dia também para ti, avó aos 25 porque tua menina de 10 ficou grávida pelo homem que acreditava amar, o mesmo que a gerou. Drama cotidiano marcado por tuas carências abismais nos países mais ricos do planeta. Ricos em recursos, ricos em desigualdades. A ti te tocou a parte ruim da equação mas continuas a acreditar que é coisa de Deus, e não te revoltas porque nem sequem conheces a dimensão da injustiça.
Feliz dia, mãe marginalizada por um Estado que não atende tuas demandas porque outras são suas prioridades. Viste teus filhos languidescer pela desnutrição, perder o brilho de seus olhos e a força de seu corpo. Perdeste a conta das vezes que solicitaste ajuda e te a negaram por qualquer razão. Foste esmagada contra uma burocracia inclemente e um sistema indiferente a tua dor.
Feliz dia, menina destinada a exercer trabalhos de mãe por força das circunstâncias. Porque nasceste menina em uma sociedade permeada por tantos preconceitos sexistas e estereótipos que seria difícil enumerar para que compreendas a dimensão de tuas desvantagens. Porque ser menina é uma condição para o abuso, a discriminação e a exploração em todas suas formas. Não importa se nascente em um lar acomodado ou num pobre barraco de favela. Sempre marcarão teu lugar na vida.
Feliz dia, mães cujo dia tem início nos portões das penitenciárias, nos tribunais de justiça ou, talvez, na frente dos hospitais ou morgues procurando um filho, uma filha, que saíram para nunca mais regressar. São essas mães que continuarão procurando, esperando sem prazo fixo, porque assim são as coisas em nossos países. São essas mães aprisionadas nas mais absurdas desculpas. São as mulheres sem voz em um mundo perfeitamente desenhado para silenciá-las. Feliz dia…
*Colabora com Diálogos do Sul, de Guatemala