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Para cantar quando o Carnaval passar

Marli Gonçalves

Tradução:

Marli Gonçalves*

Marli-Gonçalves-Perfil-Diálogos-Do-SulAgora a gente não se guarda mais para quando o carnaval chegar. Guarda e estoca coisas para quando o carnaval passar. Como as coisas mudam, não?

Antes, falávamos em encher os canecos, e estávamos nos referindo ao chopp e à cerveja. As marchinhas hoje ganharam novos sentidos e vamos precisar qu sejam entoadas por algum bloco na rua para que sejam ouvidas. Esse texto espera que você lembre as melodias para a gente passar na avenida
MascarasMas não é só isso. Pensa só. Antes pensávamos em máscaras de carnaval, e elas eram lindas, luxuosas – “Na mesma máscara negra/Que esconde o teu rosto/Eu quero matar a saudade/ Vou beijar-te agora/Não me leve a mal/Hoje é carnaval” …Agora a gente está vendo são máscaras com a fuça desses uns e outros feios desajeitados que escorregam no ouro negro, saqueado até antes de chegar a jorrar; ou tem de ver os meninos que já andam mascarados para fazer as arruaças que os divertem e deixam rastros de destruição. Podíamos até compor uma marchinha para os blackbobocas, os estraga-passeatas. “A estrela d’alva no céu desponta/ E a lua anda tonta com tamanho estupor”… ou “Seus panacas, seus panaquinhas, a polícia te pega, olha que a polícia te pega. Vem cá, seu bobo” …
Não quero deixar ninguém deprimido que sei que carnaval aqui no Brasil pra muita gente é igual à religião, só não sei se ainda dá pra cantar livremente “Allah-lá-ô, ô ô ô ô ô ô, Mas que calor ô ô ô ô ô ô/Atravessamos o deserto do Saara/O sol estava quente/ Queimou a nossa cara/ Allah-lá-ô, ô ô ô ô ô ô/Mas que calor ô ô ô ô ô ô” . Melhor perguntar antes, sem brincar com a burca de alguém.
Para não dizerem mesmo que quero estragar a festa, aderi e andei recolhendo uns trechinhos super legais e que você vai lembrar na hora. Tá, tá bom, fiz algumas modificaçõezinhas numas, mas certamente os autores me perdoariam, afinal, tudo é Carnaval. Nem vem também com a bobagem de dizer que São Paulo é o túmulo do samba. Aqui a gente não atravessa o samba. Atravessa ciclovias. Não pulamos carnaval. Pulamos buracos de rua e nosso cordão, se der bobeira, o pivete arranca.
“Ela critica o meu trabalho e até debocha, Eu sou pintor e ganho a vida com a brocha, Vivo pintando, o que não é nada demais. É à custa desta brocha, que ele faz o seu cartaz…” cantarola o prefeito (A Marcha do Pintor). “E o cordão dos puxa-sacos / Cada vez aumenta mais (bis)/Vossa Excelência / Vossa Eminência/ Quanta referência nos cordões eleitorais! / Mas se o “Doutor” cai do galho e vai pro chão/A turma logo evolui de opinião/E o cordão dos puxa-sacos cada vez aumenta mais…”
Tá bom, o Brasil é maior que isso. “Ei, você aí/Me dá um dinheiro aí/ Me dá um dinheiro aí! /Não vai dar? /Não vai dar não? Você vai ver a grande confusão”… E para o governo novo e acontecimentos que nos cercam, “Eu sou o pirata da perna de pau/Do olho de vidro, da cara de mau/ Eu sou o pirata da perna de pau/ Do olho de vidro, da cara de mau”…
Lembrou da Petrobras? Tenho sugestões de cantilenas. “Acorda, Maria Bonita/ Levanta, vai fazer o café/ Que o dia já vem raiando/E a polícia já está de pé” … Ou: “Ai, a bruxa vem aí/ E não vem sozinha/Vem na base do saci. Pula, pula, pula/Numa perna só/Vem largando brasa/No cachimbo da vovó”.
“Bandeira vermelha, amor/ Não posso mais pagar a luz” …
Acaso já recebeu sua conta de luz nova, agora com sinalização? Pois bem, a bandeira vermelha começa a sacolejar e a gente que fica que nem maluco pulando de um lado a outro apagando tudo, sassaricando. “Sas-sas-saricando/Todo mundo leva a vida no arame/ Sassassaricando pego o arame para fazer um gato…” “Eu mato, eu mato, Quem roubou minha cueca pra fazer pano de prato” …
Cai, cai, cai, cai/Eu não vou te levantar/ Cai, cai, cai, cai/ Quem mandou escorregar? Acende a vela Iaiá, Acende a vela, que a Light cortou a luz/No escuro eu não vejo aquela carinha que me seduz”.
Nada mais atual, ainda, do que essa aqui, que a gente nem precisa aperfeiçoar: “Tomara que chova/Três dias sem parar/Tomara que chova/ Três dias sem parar. A minha grande mágoa/ É lá em casa/ Não ter água/Eu preciso me lavar/De promessa eu ando cheio” .
“Quando eu conto a minha vida/Ninguém quer acreditar/Trabalho não me cansa/O que cansa é pensar/ Que lá em casa não tem água/Nem pra cozinhar” . Jakson do Pandeiro continua: “Tá chuchu beleza, tá chuchu beleza/Como tem mulher neste arrasta-pé, Tá chuchu beleza!” “Lata d’água na cabeça/ Lá vai Maria, lá vai Maria/Sobe o morro e não se cansa/Pela mão leva a criança/ Lá vai Maria” …
Mas eu queria cantar mais uma com você: “Chegou a turma do jatão/ Todo mundo rouba, mas ninguém dorme no ponto/ Ai, ai ninguém dorme no ponto/ Nós é que nos ferramos e eles que ganham muito”
“Eu tô só vendo, sabendo, Sentindo, escutando e não posso falar…Tô me guardando pra quando o carnaval passar…”
São Paulo, fevereiro, 2015, inacreditável!
* Marli Gonçalves é jornalista e colaboradora da Diálogos Do Sul — Andando pelo mundo das marchinhas, achei esta, e adaptei para meu nome – virou Marlicota e fico bem mais bonitinha. “É a Marlicota com a direita/é a Marlicota com a canhota/é a Maricota com a direita/é a Marlicota com a canhota. Embodocou a minha vara, Marlicota/Veja que tamanho que tá/ Embodocou a minha vara, Marlicota/Veja que tamanho que tá”.
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E-mails:
marli@brickmann.com.br
marligo@uol.com.br


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Marli Gonçalves

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