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Provocador, incendiário, colaborador de causas e da Revista Diálogos do Sul. Confira a entrevista do ilustrador Vitor Teixeira à Obvius.
O Jovem paulista de 27 anos, Vitor Teixeira, ganhou notoriedade na época dos prostestos de junho de 2013. Você pode não conhece-lo, mas provavelmente já viu alguns de seus trabalhos compartilhados no Facebook, principalmente em páginas de esquerda. Vitor é um desenhista talentoso e politizado que através de sua arte critica o corporativismo, capitalismo e a direita. Defende as minorias e nos mostra as contradições de uma sociedade doente.
Em seus desenhos, mesmo quem não compactua com a mesma ideologia, pode admirar o traço peculiar do ilustrador latino americano à esquerda. Conversei com ele sobre seu trabalho, suas inspirações e a ideologia por trás de sua arte.
MANIFESTO DAS ARTES: Como surgiu a ideia da página “Vitor Teixeira”?
Vitor Teixeira: Eu tinha feito uma página pra hospedar meus desenhos pessoais, que não tinham caráter crítico algum, até começar a fazer as charges e tiras em junho do ano passado. Influenciado pelas “jornadas de junho”, comecei a produzir esse material politizado e a enviar para os meios de comunicação alternativos, coletivos, movimentos sociais e blogueiros.
MANIFESTO DAS ARTES: O que gosta de fazer quando não está desenhando?
Vitor Teixeira: Tenho gostado de ler muito sobre história e sociologia, especialmente do Brasil e da América Latina. Ajuda muito no meu trabalho. Viajar também.
MANIFESTO DAS ARTES: O que te motiva a continuar?
Vitor Teixeira: Ver internautas, estudantes, movimentos sociais e comunidades utilizando meus trabalhos para defenderem suas lutas e pontos de vista.
MANIFESTO DAS ARTES: Qual é a dificuldade de ser um ilustrador independente no Brasil? É necessário ter outro emprego? Tem como viver disso?
Vitor Teixeira: Se não quiser ficar rico, tem como viver como ilustrador sim (risos). São muitas as dificuldades, não existe um modelo quando se é independente, cada um vai ter uma resposta para essa pergunta. Não atuo apenas como chargista, pois presto serviço para empresas em outras áreas, mas sempre como ilustrador. O difícil mesmo é quando se tem princípios. Por exemplo: hoje em dia eu não aceitaria fazer desenhos para empresas do ramo têxtil que utilizam trabalho escravo, ou ilustrar para campanhas de empresas ou meios de comunicação elitistas e preconceituosos.
MANIFESTO DAS ARTES: Que dicas daria para quem almeja ser ilustrador?
Vitor Teixeira: Depende do que você quer fazer com o seu trabalho. A criatividade e os ideais são mais importantes do que o aspecto visual no meu trabalho. Minha dica é se impregnar da produção de gente que já está na estrada. Pesquisar, se informar e buscar conhecimento. Técnica se aprende rápido, ainda mais sendo jovem. Já bagagem cultural é algo que exige dedicação para ser constituído.
MANIFESTO DAS ARTES: Quando e como começou sua paixão por desenhar?
Vitor Teixeira: Desde as minhas primeiras memórias. Mas foi intensificada quando eu tinha entre 10 e 13 anos, quando tive contato com histórias em quadrinhos.
MANIFESTO DAS ARTES: Quais são suas inspirações?
Vitor Teixeira: A lista é grande, mas vamos lá: Ziraldo, Henfil, Robert Crumb, Ricardo Liniers, Rômolo, André Dahmer, Andy Singer, Laerte, Jean Julien, Carlos Latuff, Joan Cornellà, Allan Sieber, Quino, entre vários outros, de diversos campos de atuação, dos cartunistas aos conceituais. Mas minhas atuais inspirações também estão no campo do pensamento. Figuras como Darcy Ribeiro, Eduardo Galeano e Pablo Neruda também tem influenciado à beça meu trabalho.
MANIFESTO DAS ARTES: Quais são as mensagem de suas artes?
Vitor Teixeira: Costumo dizer que são três frentes. A primeira, de apoio às minorias, aos direitos humanos e oprimidos pelo sistema: negros, índios, mulheres, LGBT, sem teto, etc. A segunda, de crítica aos meios de comunicação corporativistas e burgueses que monopolizam a informação no nosso país. E a terceira, pela integração com o continente latinoamericano, por um Brasil cada vez mais integrado a nossos irmãos de língua espanhola.
MANIFESTO DAS ARTES: Que estilos de desenho mais te agradam?
Vitor Teixeira: Os que despertam reações maiores que “Oh, que bonito!”.
MANIFESTO DAS ARTES: Como é o seu processo de criação de um desenho? Quais são os materiais que usa para finalizar sua arte e colocar em sua página?
Vitor Teixeira: Varia muito. Tem dias que acordo cheio de idéias, e em outros passo horas buscando um assunto e uma interpretação para ele. O pessoal que segue a página no Facebook ajuda muito, propondo assuntos e inúmeras abordagens. Meu material para as charges é quase todo digital, feito com tablet, edição de imagens, etc. Quando tenho tempo, gosto de usar nanquim e aquarela.
MANIFESTO DAS ARTES: Quando e como começou seu interesse por política? Quando se descobriu de esquerda? Você apoia algum partido político?
Vitor Teixeira: Meu interesse por política começou do meio para o final de 2012, quando, por algum motivo que não me lembro, comecei a buscar outros portais de internet fora do circuito comercial para me informar. Foi quando me deparei com a blogosfera independente brasileira, e com o twitter, onde os jornalistas atuam de maneira mais livre. Depois veio junho de 2013, fiz alguns desenhos que tiveram muita exposição, graças a esses blogueiros e portais alternativos. A partir daí, conheci muitas pessoas e movimentos e tenho tentado ler e me informar o máximo possível para ter base teórica e histórica para fundamentar meus desenhos, e ter uma linha de raciocínio e produção coerente.
MANIFESTO DAS ARTES: Como você costuma responder à afirmações clichês como: a esquerda não tem compromisso com a realidade, vai para Cuba, entre outras? Você usa Iphone e internet, acredita que isso é contraditório?
Vitor Teixeira: Respondo com meu trabalho. A maioria das pessoas que utiliza esse tipo de argumento vazio não dá abertura para questionamentos nem debate. Nem toda discussão vale a pena, especialmente em caixas de comentário de portais como o G1 ou UOL ou no churrasco com a família. Não tenho iPhone, uso internet, mas independente disso tudo sei que tecnologia não é algo inerente ao sistema capitalista. Acho que tem muito de polêmica e pouco de profundidade nessa discussão.
MANIFESTO DAS ARTES: O conceito de esquerda no Brasil é associado em defender certas causas como legalização de drogas, aborto, coletivismo, etc. É possível ser de esquerda e não concordar com estes pontos?
Vitor Teixeira: Sou branco e tive condições sociais para me formar e para trabalhar. Posso usar drogas tranquilamente no meu apartamento, enquanto jovens negros tomam tapa na cara de PM na favela se for pego fumando um baseado. Se eu for pego, provavelmente com a ajuda de um advogado serei enquadrado como usuário e pagarei algumas cestas básicas. Se o jovem negro e pobre for pego com duas buchas no bolso, ficará enjaulado em uma escola do crime. Se eu não me solidarizar com isso, não me considere de esquerda.
MANIFESTO DAS ARTES: Alguém com viés ideológico diferente já te fez mudar de idéia com relação a algum assunto que você tinha plena convicção?
Vitor Teixeira: O tempo todo. Só tenho 27 anos, estou no despertar da minha “consciência social e política”. Tenho muito a aprender com quem está na luta há muito mais tempo que eu, seja seu viés ideológico qual for.
MANIFESTO DAS ARTES: O que pensa sobre essa onda de justiceiros que tem surgido? Acredita que a mídia tem influenciado nisso?
Vitor Teixeira: É revoltante. A mídia influencia tudo, tem televisor em todo canto desse país. Bares, barbeiros, salões de beleza, salas de espera, hospitais, restaurantes, mansões e barracos. O povo se impregna dessas porcarias, e alguns seguem as cartilhas da intolerância à risca. Nos centros urbanos temos a internet, mas no Brasil profundo, a TV ainda é quem manda. Novamente, o grupo atacado por essas aberrações é o de pobres e pretos, inclusive mulheres. A propósito, a truculência da “justiça” executada por esses trogloditas é muito semelhante à truculência de um certo juiz do alto escalão, adorado pelos meios de comunicação (acabei de ter uma idéia pra um cartum, risos).
MANIFESTO DAS ARTES: Como seu trabalho é exposto diretamente em sua página de Facebook e em seu Tumblr, usando a internet como o meio de propagar sua arte, qual seria sua opinião sobre o Marco Civil?
Vitor Teixeira: Tem gente muito mais qualificada do que eu para responder isso. O criador da www disse que esse projeto será copiado pelo mundo todo, que o texto do nosso Marco Civil é a vanguarda da rede. Quem critica negativamente, ou não leu o projeto, ou tem interesses políticos na desmoralização dele.
MANIFESTO DAS ARTES: Em suas ilustrações, você satiriza com frequência o filósofo Olavo de Carvalho. Acredita que ele é uma má influência a jovens não politizados assim como a revista Veja, Rodrigo Constantino, Reinaldo Azevedo,Luiz Felipe Pondé, Datena e Rachel Sheherazade?
Vitor Teixeira: Esses que você citou são símbolos da intolerância, truculência, servilismo, viralatismo tupiniquim e da total ausência de solidariedade. Seja no campo econômico, filosófico ou da opinião popular. Mas diferente do que muitos falam por aí, o povo é astuto, e sabe quem está do lado dele. A juventude é de fato o alvo mais frágil, ainda mais com o alcance que Constantino e Datena têm, por serem arautos do corporativismo midiático. Mas nós, que geramos conteúdo independente na internet, somos muitos, e dispostos a enfrentar esse senso comum fascistóide.
MANIFESTO DAS ARTES: O que pensa sobre os jovens conservadores que tem surgido? Acredita que o povo brasileiro está mais politizado depois das manifestações de Junho?
Vitor Teixeira: Esses novos conservadores são produto dessa mídia elitista, anti-povo, que ainda não foi combatida frontalmente pelo governo federal. A política institucional (parlamento, ministérios, assembléias legislativas) e sua falta de representatividade também ajudam esse jovem a se desinteressar, e consequentemente a se identificar com gente que usa discurso raso e intolerante pra arrebanhar seguidores raivosos. De qualquer maneira, as pessoas estão mais afim de falar sobre política desde junho, sem dúvida. Os partidos menores, coletivos, estudantes e as comunidades estão se fortalecendo, mas o classe média de direita também está se libertando da vergonha que tinha de falar que “bandido bom é bandido morto”.
MANIFESTO DAS ARTES: O que pensa sobre a política na internet? Como você encara as páginas populares como “TV Revolta”? Você acredita que páginas como essa são financiadas por políticos de direita?
Vitor Teixeira: Penso que nesse cenário, onde o poder executivo não dissolve esse monopólio de mídia que existe a mais de 50 anos, a internet é a única opção para expor seus pontos de vista. Não temos espaço nos grandes meios, pois são concentrados e elitizados. Nesse barco da internet vamos nós, mas vêm também os malucos radicais de extrema direita que pregam ódio à política para encher suas páginas. É importante sabermos diferenciar quem é quem nesse espaço, e não nos deixarmos ser confundidos. Sobre financiamento, não sei dizer. Muita gente fala muita coisa sem fundamento. Muitos me acusam de receber do PT. Ainda não caiu nada na minha conta.
MANIFESTO DAS ARTES: O que pensa sobre o governo de Lula e Dilma com o polêmico Bolsa Famíla? Acredita que o governo é assistencialista?
Vitor Teixeira: Assistencialismo virou um termo pejorativo no âmbito do senso comum da classe média brasileira depois da criação das bolsas e cotas. Assistir as classes mais pobres é o mínimo para tentar criar igualdade em uma sociedade tão desproporcional como a nossa. Convido as pessoas a conhecerem o sertão nordestino e comunidades ribeirinhas no interior do Pará, ou as favelas urbanas de São Paulo, Rio e Recife. Se enfiar nos grotões e nas margens do nosso país talvez sensibilize minimamente as pessoas que criticam esses programas. Além disso, é importante olhar os indicadores, os estudos, e ler os teóricos e estudiosos do programa. Ao meu ver, são programas que devem ser política de estado, e ampliados ao máximo.
MANIFESTO DAS ARTES: Você acha que suas ilustrações podem despertar um interesse político nos seus seguidores? Acredita que é um formador de opinião?
Vitor Teixeira: Sem dúvida que desperta. Espero ter cada vez mais espaço e respaldo dos movimentos, partidos sérios e organizações do povo para colaborar com sua politização e formação crítica. Não gosto do termo “formador de opinião”, prefiro provocador, incendiário ou colaborador de causas.
MANIFESTO DAS ARTES: Você é à favor ou contra a Copa do mundo ser realizada no Brasil?
Vitor Teixeira: Sou a favor da Copa, pois o futebol é um bem cultural das massas no nosso país. Sou contra os métodos do Estado e as condições da Fifa. São questões difíceis e polêmicas, que devem ser amplamente debatida em todos os setores da sociedade, antes, durante e depois da Copa. Mas será muito mais fácil me encontrar fora do que dentro dos estádios daqui a um mês. Sou contra remoções, truculência, leis absurdas contra greves ou terrorismo, desvios de verbas, superfaturamento, mas torcerei muito pela nossa seleção.
MANIFESTO DAS ARTES: Como você enxerga o Brasil pós-Copa?
Vitor Teixeira: Estamos em processo de fortalecimento da nossa democracia, isso é o mais importante. Precisamos de reformas, e a mais importante delas talvez seja a política, para mudarmos as regras do jogo eleitoral e a cara do parlamento, para que ele seja mais coerente e plural. Esse é um passo imprescindível que precisa ser dado, para que outras reformas sejam feitas, para aperfeiçoar a estrutura das nossas instituições. Mídia democratizada por uma regulação que crie mais vozes e conteúdo nacional, terras com mais famílias trabalhando, mais poder e representatividade para o pobre, negro, gay, indígena e para toda a massa de trabalhadores que move esse país.
Vitor Teixeira ( Página no Facebook)
@vitortegom ( Twitter)