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Marta Denis Valle*
A França disputou com a Espanha seu império colonial e pelas mãos de piratas e corsários introduziu-se nas chamadas Antilhas francesas onde, como sua rival, implantou a escravidão de aborígenes e negros de origem africana.
Mas tanto a exploração colonial como a escravagista tiveram particularidades, por tratar-se de possessões adquiridas de forma diferente das conquistas e colonizações feitas pela Coroa de Castela.
A luta foi intensa entre franceses, ingleses e holandeses para se apoderarem de ilhas e ilhotes no entorno caribenho, que mais de uma vez mudaram de dono.
Foram constantes as incursões às Grandes Antilhas (Cuba, A Espanhola (Hoje Haiti e R. Dominicana), Porto Rico e Jamaica), as colônias espanholas mais protegidas na área.
Inglaterra conseguiu a Jamaica, mediante uma invasão militar, e a França a zona ocidental de A Espanhola e outros enclaves, pela ocupação sucessiva de seus territórios.
Pouco a pouco os franceses, corsários uns, comerciantes e navegantes independentes outros, conseguiram, no século XVII, apoderar-se de parte de A Espanhola (hoje o Haiti) e de pequenas ilhas caribenhas de onde prosseguiram com suas incursões de pilhagem contra Cuba e outras colônias espanholas.
Nas Antilhas francesas implantou-se o sistema de plantação escravagista praticando-se o comércio de escravos entre as ilhas, assim como importação em massa da África.
Pela primeira vez, além do abastecimento local, produziram para o mercado mundial, açúcar e outros produtos.
O próprio regime de exploração da mão de obra escrava, entre outros fatores, gerou revoltas e rebeliões que culminaram, no final do século seguinte, em 1791, em um fato transcendental, a Revolução do Haiti.
Guerras de rapina
Marinheiros franceses, ingleses e holandeses disputaram com a Espanha, principal potência colonial no denominado Novo Mundo, durante vários séculos, o controle dos mares, as pequenas ilhas antilhanas e outros territórios americanos. Ao mesmo tempo, Madri travava numerosas guerras no cenário europeu, desde o século XVI e seguintes, contra França, Inglaterra, Holanda e Portugal.
Os frequentes ataques de corsários franceses levaram a Espanha a compreender a necessidade de estabelecer o sistema de frotas no século XVI e da fortificação de Havana, escala das naves no transporte de grandes riquezas americanas para o porto de Sevilha.
Entre 1600 e 1635 aventureiros franceses e ingleses fixaram suas guaritas em A Espanhola, a primeira colônia da Espanha na América, por encontrar-se em grande medida deserta.
Um rosário de enclaves ingleses, franceses e holandeses estabeleceu-se na zona do Caribe (Antilhas Menores, Bahamas e outros territórios) por aventureiros, cujas pilhagens eram estimuladas pelas potências inimigas da Coroa Espanhola.
No final do século XVII eram frequentes suas incursões na Jamaica – ocupada pela Inglaterra em 1655 e cedida oficialmente pela Espanha em 1670 -, para roubar escravos a ponto de chamarem esta ilha de Pequena Guiné.
Durante um ataque a Veracruz (México), em 1683, levaram 1.500 escravos, assim como negros e mulatos livres.
Em 1697, mediante a Paz de Ryswick, ficou acertado que este tipo de agressão seria suprimido, já que dificultava a navegação e a vida nas Antilhas, onde já estavam presentes várias potências coloniais e os flibusteiros e piratas se dedicavam à pilhagem sem distinção de bandeiras.
Por este tratado, a Espanha cedeu também à França a parte ocidental de A Espanhola, Santo Domingo (Haiti), o que marcou a reconciliação franco-espanhola depois que tropas gaulesas ocuparam Barcelona.
A França, que chegou a possuir na América do Norte importantes territórios, perdeu a maior parte em guerras com a Inglaterra, no século XVIII.
Exploração e comércio de escravos
A mão de obra escrava desempenhara seu papel nos desmandos destes traficantes franceses, primeiro de aborígenes e depois de negros, uma vez exterminada praticamente a população indo-antilhana que haviam escravizado.
Para o povoamento das colônias, que não podia ser deixado apenas por conta da espontaneidade da pilhagem e do saque, o governo francês apoiou várias empresas, a partir da primeira, fundada em 1626 pelo Cardeal de Richelieu (Companhia de São Cristóvão).
Depois do ensaio de colonização com lavradores brancos (normandos e bretões), contratados com a promessa de algumas terras (1627), foram os negros o fator fundamental na economia destas colônias antilhanas.
O governo gaulês fez diversos contratos para a introdução anual de escravos nas Antilhas francesas. Os primeiros escravos africanos foram levados à Martinica no período 1642-1645 e, por volta de 1700 existiam ali 14.566 e 6.725 em Guadalupe, duas possessões que complementavam Santo Domingo (Haiti), que chegou a ser a mais importante.
A Martinica empregava seus escravos no cultivo de anil, tabaco, algodão e cacau; tinha 183 engenhos de açúcar e foi durante um tempo a melhor cliente dos negreiros, até que o Haiti passou para o primeiro plano.
A introdução de escravos, na média, chegou anualmente a cerca de 20.000, de 1717 a 1724, na Martinica, Guadalupe e Granada, na época em mãos francesas.
Embora a França tenha continuado envolvida em guerras com a Inglaterra que afetaram o desenvolvimento de suas colônias e o tráfico de escravos, a população escrava do Haití situava-se em torno de 140.000, em 1744, e mais de 240.000, em 1774.
Às vésperas da Revolução em Santo Domingo viviam ali 40.000 brancos, 24.000 libertos e 405.000 escravos.
O comércio entre a França e sua principal colônia, em 1789, precisava de 750 grandes navios, tripulados por 80.000 marinheiros, afirma o historiador José Luciano Franco, em sua célebre obra História da Revolução do Haiti.
Em 1790 eram 792 os engenhos açucareiros e 182 destilarias de rum, a pouco mais de um século do primeiro, construído em 1680 na parte francesa de A Espanhola, e dotado de escravos negros.
Sua economia, baseada na escravidão, exportava algodão (705 plantações), café, anil, mel, couros, e produzia outros itens agrícolas para consumo interno.
A grande açucareira mundial fazia correr suor e sangue de quase meio milhão de escravos.
*Historiadora, jornalista – de Prensa Latina para Diálogos do Sul – Tradução: Ana Corbisier