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"A liberdade de expressão é um direito coletivo"

Revista Diálogos do Sul

Tradução:

Frank La Rue: “As rádios comunitárias devem ter os mesmos direitos que as comerciais”.
Frank La Rue: “As rádios comunitárias devem ter os mesmos direitos que as comerciais”.

Daniela Pastrana

“É preciso entender que a informação, acima de qualquer coisa, é um serviço social. Se perdemos essa dimensão, começamos a fazer as regulações em função de seu caráter mercantil e o Estado tem muitas outras obrigações, como garantir a liberdade”, afirmou Frank La Rue.

“Na América Latina cometemos um erro histórico ao permitir que prevaleça a versão comercial da informação”, acrescentou La Rue, relator especial da Organização das Nações Unidas (ONU) para a Liberdade de Opinião e Expressão.

Em entrevista à IPS este especialista guatemalteco disse que “a liberdade de expressão deve ser entendida como um direito coletivo da sociedade de estar informada, associar-se e se expressar, mas também como um direito dos povos de ter uma cultura, idioma, valores e difundi-los ao mundo com meios próprios de comunicação”. Também se referiu aos outros desafios que a liberdade de expressão enfrenta na região.

Um deles são as chamadas “leis de censura” que punem, por exemplo, a difamação de funcionários públicos e que inibem a possibilidade de haver críticas aos que estão no poder, ou a sanção penal ao uso não autorizado de frequências de rádio. Outro, “muito importante”, é o caso das leis de telecomunicações que estão em discussão em países como Honduras e México

Quais condições básicas devem cumprir as novas leis de telecomunicações?

FRANK LA RUE: Parte da liberdade de expressão é defender a diversidade cultural. Tenho afirmado que deve haver quatro categorias de meios de comunicação com o uso de frequências eletromagnéticas. Uma, são as rádios comerciais, que devem ser reguladas por uma norma de concessão; as comunitárias, que devem ter os mesmos direitos das primeiras sem importar se são de baixa potência e de curto alcance; uma terceira para os grupos étnicos claramente identificáveis; e, finalmente, a telecomunicação pública, que é do Estado, não do governo da vez. Neste último caso, não se trata de meios controlados por quem tem o poder político, mas do uso de recursos públicos para um meio público. E deve haver uma recuperação do público. Isso se perdeu na América Latina, ao contrário da Europa, onde há vários países nos quais se mantém a visão do público. Mas as frequências são um bem público, existem no ambiente, e o Estado é que regula como são administradas para benefício de todos, da mesma forma que outros recursos naturais.

 É necessário dividir o espectro em partes iguais? 

FLR: O Estado não precisa de um terço das frequências, como na Argentina. Não teria a capacidade administrativa nem os recursos para fazê-lo. O que se deve fazer é uma reserva para frequências comunitárias. Existe um princípio em direitos humanos, de diversidade de meios e pluralismo de posições: acima do direito individual do jornalista está o direito humano da sociedade de estar informada. A ideia é que as pessoas de uma localidade possam construir um pensamento próprio. Nesse sentido, a concentração de meios de comunicação é um atentado contra a democracia, não apenas contra os direitos humanos. Onde está o truque? Nos mecanismos de concessão. O leilão não é o mecanismo idôneo, porque privilegia o poder econômico. Deve haver concursos públicos e transparentes, com regras claras.

Que tipo de regras

FLR: As frequências, como são um bem do Estado, não são presente nem concessão vitalícia. Por isso devem ser entregues por um tempo determinado. Há uma característica básica: frequência que não é usada no momento da concessão deve perder o direito, porque haverá gente que as acumulará sem usá-las, mantendo-as apenas para evitar a competição. Então, devem ser criadas normas que regulem como se pode perder a concessão, e deve haver um limite de quantas frequências uma pessoa pode ter, porque o acúmulo indevido leva ao manejo da opinião pública e isso não é correto.

Isso nos leva a outro tema, que se discute no México, por exemplo, sobre mecanismos de financiamento, porque se entende que só os veículos comerciais podem ter acesso à publicidade. 

FLR: Uma entidade não lucrativa não significa que não cobre, mas sim que não lucra com isso, não se beneficia com o usufruto das vendas. O Estado deve ter uma regulamentação de distribuição da publicidade oficial, com critérios claros. E colocar ordem, sem criminalizar as rádios comunitárias. Ter uma emissora fora das normas legais não pode ser um crime, porque, além do mais, se alguém revisar a origem dos grandes consórcios, tampouco houve processos legítimos de entrega de concessões. Todas foram entregues por governos ditatoriais ou corruptos.

Em Honduras se criou muita controvérsia com a inclusão de regulação de conteúdos no projeto de lei de telecomunicações…

FLR: O Estado não deve se meter nos conteúdos em nenhum caso. Há limitações legítimas à liberdade de expressão, baseadas em normas e princípios de direitos humanos, mas eu deixaria apenas um aspecto de conteúdo, que é a regulamentação de horário para proteger a infância. Deve-se prevenir que meninos e meninas, e adolescentes, presenciem cenas de violência direta e de atos sexuais, não de sexualidade, mas de atos sexuais e de pornografia ou do uso mal intencionado da sexualidade. Nada mais. Na liberdade de expressão, a norma que prevalece é a abertura e a amplitude. As limitações são a exceção e não devem ser generalizadas em demasia, porque é aí que se cai na censura. E sempre existe a tentação, na hora de legislar, de cada um querer impor sua opinião.

E a internet?

FLR: Menos. Internet é um espaço aberto no qual todos cabem. Por sua natureza, está fora das possibilidades de regulação, que não seja o monitoramento, mas isso atenta contra a privacidade. É um tema de autorregulamentação. Há um novo desafio de profissionalismo e de ética que cabe à própria imprensa defini-lo. Não é o Estado que deve defini-lo, mas os próprios jornalistas e meios de comunicação. Envolverde/IPS (FIN/2013)


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

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