Pesquisar
Pesquisar

Eleições na Turquia: para Ocidente, Erdogan deve ser derrotado. O que isso nos diz?

Estados Unidos e outros regimes ocidentais não mantiveram o silêncio e parecem decididos a se intrometer nos assuntos domésticos da Turquia
Motasem A Dalloul
Monitor Do Oriente Médio
Gaza

Tradução:

A Turquia correu às urnas neste domingo, 14 de maio, para – quem sabe – as eleições gerais mais importantes de sua história recente, sob um acalorado debate em âmbito nacional, regional e internacional. A maior parte das pessoas considera que o pleito à presidência e ao parlamento mudará a própria feição da Turquia.

Neste contexto, o presidente Recep Tayyip Erdogan e seus correligionários acreditam que o país está em fase de se reposicionar como uma firme potência econômica e industrial. Para eles, é fundamental que Erdogan conquiste um terceiro mandato.

Assista na TV Diálogos do Sul

Grupos de oposição, no entanto, acusam Erdogan de afastar a Turquia do campo ocidental, que – segundo seu ponto de vista – representa um oásis de democracia e liberdade. Seus opositores contestam a campanha de Erdogan, que insiste que suas duas décadas no poder transpuseram o país da margem da dependência em relação ao Ocidente à quase independência em diversos setores, desde gás natural e petróleo à indústria militar.

Leia também: Eleição na Turquia será decidida no segundo turno

Estados Unidos e outros regimes ocidentais não mantiveram o silêncio e parecem decididos a se intrometer nos assuntos domésticos da Turquia. O presidente americano Joe Biden prometeu, por exemplo, trabalhar em favor da alternância de poder e a grande imprensa se engajou em se opor a Erdogan e seu partido Justiça e Desenvolvimento (AK). Neste entremeio, parecem tentar limpar a imagem de seus rivais, em particular, o opositor secularista Kemal Kilicdaroglu.

Após acordo nuclear, Rússia e Turquia decidem doar grãos para África, Ásia e América Latina

O semanário The Economist, por exemplo, diz aos turcos “Fora Erdogan”, ao pedir à população que vote para “salvar a democracia” no país. A revista acusa o presidente de governar “de modo cada vez mais autocrata”, ao destacar: “Caso [Erdogan] perca, seria uma reviravolta política com consequências globais. O povo turco teria mais liberdade, menos medo e – com o tempo – mais prosperidade”.

Erdogan, no entanto, argumenta ter introduzido liberdades que a Turquia moderna jamais teve, desde seu estabelecimento como república em 1925, até que seu partido alcançou o poder. De fato, antes de Erdogan, havia não mais do que dez partidos políticos regularizados no país; nos 20 anos desde então, chegaram a mais de 100.

Continua após o banner

Antes de Erdogan, políticos islâmicos que venciam as eleições e mesmo compunham governos eram combatidos, criminalizados e aprisionados. Ao longo da atribulada história do país, golpes militares depuseram governos democráticos e encarceraram ou executaram líderes. Até mesmo Erdogan foi preso por discursar em um ato popular e banido por anos da vida pública. Erdogan foi insultado, atacado e caluniado, mas insiste não ter prendido qualquer oponente.

Estados Unidos e outros regimes ocidentais não mantiveram o silêncio e parecem decididos a se intrometer nos assuntos domésticos da Turquia

Reprodução/Twitter
Dificilmente alguém que conseguiu superar o sectarismo crônico na Turquia, nos campos étnico e religioso, pode se mostrar como ditador




Antes de Erdogan

O The Economist parece ignorar também que a lira turca antes de seu governo era considerada a moeda menos valorizada do mundo, conforme registros de 1995, 1996, 1999 e 2004. Apesar da atual depreciação da moeda – orquestrada por bancos ocidentais, conforme correligionários de Erdogan –, a maioria dos setores econômicos do país de fato prosperaram nos últimos anos, consolidando uma economia presente na arena global, em vez de um Estado subalterno sobre o qual bancos impõem alarmante regularidade e colapsos fiscais.

Expliquei previamente como a economia turca continuou a se desenvolver apesar da inflação e da queda da moeda. Minhas fontes eram economistas radicados no país, analistas e civis.

Guerra na Ucrânia: acordo para exportar grãos é repactuado com ajuda de Turquia e ONU

Os britânicos The Independent e The Guardian, os franceses Le Point e Le Monde, os americanos The New York Times, New Yorker, Wall Street Journal e muitos outros jornais e revistas parecem pôr de lado a ética profissional para atacar unilateralmente Erdogan. Tais periódicos ocidentais promovem Kilicdaroglu como um eventual messias, destinado a salvar a Turquia e os turcos, ao ignorar suas sucessivas derrotas contra Erdogan.

Um artigo publicado pela rede Associated Press e difundido na mídia ocidental antagonizou de maneira direta a figura de Erdogan, ao introduzir seu rival como eventual responsável por salvar a Turquia de uma “ditadura”. O artigo citou o adversário político e apoiadores, mas não o outro lado. “Estas eleições são sobre reconstruir a Turquia e garantir que nenhuma criança vá dormir com fonte”, afirmou Kilicdaroglu durante um comício do Partido Republicano do Povo (CHP) em Izmir. “Estas eleições são para garantir a igualdade de gênero”, prosseguiu o candidato.


Fome zero

A Turquia, podemos argumentar, contudo, não tem mais gente com fome entre sua população, incluindo mais de quatro milhões de refugiados e centenas de milhares de requerentes de asilo, nenhum dos quais encarcerado em centros de detenção por meses – como no Ocidente, onde certamente vão para a cama de estômago vazio.

Pouco se diz sobre o fato de que a Turquia tem como política abrigar tais milhões de refugiados, enquanto Europa e Estados Unidos lutam contra o “fardo” de um número bastante menor. Não se comenta também que tais refugiados costumam chegar de países onde governos ocidentais instauraram guerras de agressão.

Continua após o banner

O artigo descreve Kilicdaroglu como “político social-democrata que construiu uma reputação de integridade e honestidade”, ao ignorar acusações de corrupção em seu partido e promessas não cumpridas em pleitos anteriores, quando venceu a maioria das prefeituras do país.

“Estas eleições são sobre a reconciliação e não conflito”, insistiu a Associated Press. “São sobre levar a democracia à Turquia”. Podemos argumentar, neste ponto, que um líder eleito de modo livre e transparente por seu povo em diversas ocasiões não é, por definição, um ditador, pouco importa sua postura. Poderíamos afirmar ainda que a ofensiva contra Erdogan se deve à política de seu regime contra a política externa e o estrangulamento imposto pelo sistema bancário, ao levar a Turquia aos salões do G20, como economia estável, que fornece gás natural gratuito à população.


Conquistas

Há diversas conquistas no período de Erdogan. E dificilmente alguém que conseguiu superar o sectarismo crônico na Turquia, nos campos étnico e religioso, pode se mostrar como ditador.

Argumenta o artigo sobre o assunto da revista The Economist: “Em uma era na qual a autocracia está em ascensão, da Hungria à Índia, a rejeição pacífica ao sr. Erdogan mostraria a democratas em todo o mundo que ‘homens fortes’ podem ser batidos”. Não obstante, podemos esperar a mesma contundência ao tratar de autocracias aliadas do Ocidente, como Egito, Jordânia, Tunísia e Marrocos, além dos Estados do Golfo? Ditadores nesses países, ao contrário, são obedientes e oprimem seu povo de uma maneira que parece agradar Washington, Londres e Paris.

Continua após o banner

A “democracia ocidental”, que ostenta agentes belicistas, como Biden e seus antecessores, além de figuras subalternas nas capitais mundiais, acolhe de bom grado criminosos de guerra, como o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu. Este sistema busca garantir que as pessoas “certas” cheguem ao poder, para servirem a interesses externos em detrimento do povo. Este é o modelo de “democracia” contemplado pela imprensa ocidental, para impor a política externa de seus respectivos governos. Esta é a face das “liberdades” que tanto apregoam.

Motasem A Dalloul | Monitor do Oriente Médio


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

Assista na TV Diálogos do Sul


Se você chegou até aqui é porque valoriza o conteúdo jornalístico e de qualidade.

A Diálogos do Sul é herdeira virtual da Revista Cadernos do Terceiro Mundo. Como defensores deste legado, todos os nossos conteúdos se pautam pela mesma ética e qualidade de produção jornalística.

Você pode apoiar a revista Diálogos do Sul de diversas formas. Veja como:


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Motasem A Dalloul

LEIA tAMBÉM

Rússia Uso de minas antipessoais e mísseis Atacms é manobra dos EUA para prolongar conflito
Rússia: Uso de minas antipessoais e mísseis Atacms é manobra dos EUA para prolongar conflito
Após escalar conflito na Ucrânia com mísseis de longo alcance, EUA chamam Rússia de “irresponsável”
Após escalar conflito na Ucrânia com mísseis de longo alcance, EUA chamam Rússia de “irresponsável”
Misseis Atacms “Escalada desnecessária” na Ucrânia é uma armadilha do Governo Biden para Trump
Mísseis Atacms: “Escalada desnecessária” na Ucrânia é armadilha do Governo Biden para Trump
1000 dias de Guerra na Ucrânia estratégia de esquecimento, lucros e impactos globais
1000 dias de Guerra na Ucrânia: estratégia de esquecimento, lucros e impactos globais