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ToggleEste texto aborda as mazelas da ausência de política econômica por parte do desgoverno Jair Messias e por isso foca, em especial, nos absurdos comandados por Paulo Guedes e cia.
Como os artigos de análise que produzo semanalmente tem razoável circulação, peço perdão pelos eufemismos, porque se fosse digitar o que realmente penso a respeito desse tema, o volume de palavrões e xingamentos seria de calão tão baixo quanto o das autoridades que comandam a liquidação econômica do país.
A queda de braço com Braga Netto. Houve mesmo uma inflexão do Pró-Brasil?
A última semana de abril e os primeiros dias de maio são marcados por duas inflexões. Uma é a ruptura da Lava Jato com Bolsonaro ou do Moro com a linha protofascista do presidente eleito através do WhatsApp. Outra inflexão é a tentativa desesperada, tanto de Bolsonaro como das Organizações Globo (porta-voz dos capitais especulativos e dos bancos mais poderosos) em salvar Paulo Guedes, o modelo austericida, as mentiras do ajuste fiscal, as falácias fiscalistas e o conjunto do embuste marcado pelo “receituário neoliberal”.
Cabe um apontamento. Logo que foi lançado (em entrevista coletiva, através de Power Point do coitado do estagiário), o Pró-Brasil mais parecia um balão de ensaio do que uma proposta real de governo. Reconheço que fiz uma crítica muito dura ao tal plano (Pró-Brasil, do Braga Netto) e a mantenho, porque os recursos são ínfimos, ainda mais diante do trem da alegria dos bancos, com o aporte de um trilhão e 200 bilhões de reais para a conta da agiotagem com pessoa jurídica e autorização para operar no Bacen. A alegação é “garantir liquidez”, mas a verdade é privilégio no conflito distributivo.
Outra meta do Chicago Boy pinochetista e seus auxiliares é assegurar a compra de papéis podres na carteira desses bancos. A proposta veio no mesmo modus operandi de sempre: largam no ar a ideia absurda e, se colar, colou. Mas não colou. Guedes nem ponderou essa medida, entupiu de liquidez os bancos, prometeu refinanciar a parte podre que já foi refinanciada há pouco e não obrigou contrapartida para as instituições privadas. As mesmas “contrapartidas responsáveis” exigidas em suas falas asquerosas e repetidas em simulacro pelos reprodutores e reprodutoras da mentira sobre temas econômicos, que chafurdam e poluem o imaginário da população brasileira.
CUT
Era possível realizar o auxílio com máxima agilidade
Militares de pijama
Voltando ao balão de ensaio dos “militares de pijama”, creio que a massa pensante do Brasil até desejou ver ali algo semelhante a um PAC ou, quem sabe, uma versão tímida do Plano Nacional de Desenvolvimento do regime ditatorial. Na queda de braço dos fantasmas de Roberto Campos e Golbery do Couto e Silva, o bruxo da ditadura ganhou de Bob Fields em nosso imaginário. Mas, foi isso. Ao menos até agora, não passou de quase nada, um espinho no pé. O tal do Pró-Brasil é ínfimo, diminuto, mínimo. E pelo que vi, incomoda. Incomoda muito e pode vir a motivar a milicada de alta patente, encastelada no Palácio do Planalto. Assim, se sair um pacote de obras públicas, de retomada de obras paradas, cartelizado com o capital nacional que sobreviveu a si mesmo e à fúria entreguista da Lava Jato, ao menos vai gerar algum aumento de emprego direto. Caso seja retomado esse debate, o processo de consecução é mais briga na interna do governo Bolsonaro e choque, mesmo que indireto, com a agiotagem chantagista que opera nos dois lados do balcão, forçando fuga de dólares e ataques especulativos.
Parece que não fui só eu que vi a crise das crises se aproximar. Considero ser muito importante a queda do Guedes e, com ele, de todo o primeiro escalão e cargos indicados no “super” Ministério da Economia, fragmentando essa pasta absurda. Isso porque o apetite insaciável da “piranha voraz”, conforme apelido de seus pares no Chile, engoliu a Fazenda, Planejamento, Indústria e Comércio. Mas isso não basta. É preciso trocar todos os cargos de direção do Banco Central do Brasil, Tesouro Nacional, BNDES, Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil, Banco da Amazônia, Banco do Nordeste e BRDE. Que a “bancada da especulação”, travestida de tecnocracia, caia por completo, rachada entre si e cada vez mais fragilizada.
O que desejei acima virou profecia anunciada e a nave mãe começou a se mover novamente. Abandonou as notas cobertas, explicando a necessária economia de crise, pacto keynesiano e expansão da base monetária. Diante do possível enfraquecimento de Paulo Guedes e dos financistas que ele colocou em postos-chave do Estado brasileiro, a Globo lembrou que é a Globo e já começou a falar nas mentiras de “necessidade Teto dos Gastos” e manter a “Regra de Ouro”.
Ao mesmo tempo, deu sequência na coletânea de matérias rec (matérias 500), apontando a agenda positiva empresarial que pode fortalecer o caixa da emissora. Nesta “venda casada”, demonstram o “lado humano” do capitalismo periférico, colocando cada vez mais distante do imaginário a necessidade de reconversão industrial, racionalidade regionalizada e a planificação econômica dos setores essenciais.
Filas na Caixa e crueldade institucional
A dinâmica do jornalismo, por vezes, obriga as editorias a fazerem um arranjo estranho. Elogiam o Guedes e criticam a política de auxílio emergencial. Assim, apontam a bateria contra o ministro da Cidadania, Ônix Lorenzoni (DEM-RS, aquele que admitiu caixa dois e que o Moro deu “sentença”, perdoando-o na internet) e passam o pano para os bancos privados e a equipe do Paulo Guedes. Explico de novo. Tem mais de um trilhão e 200 bilhões de reais nos bancos. A Caixa está repassando o auxílio emergencial que foi destinado do Tesouro. A turma do Guedes diz que não pode se comparar com a Alemanha – que já alocou mais de 35% do PIB no combate à pandemia e recessão -, que aqui não era possível, justo porque o Tesouro não está com esta alocação. MENTIRA!
A PEC do Estado de Calamidade permite à União fazer tudo e gastar o que quiser. Não faz, porque não quer! E mais: os bancos instalados no Brasil poderiam ser pagadores – todos os bancos e não apenas a Caixa. Poderíamos colocar uma força tarefa emergencial para regular presencialmente os cadastros em todos os municípios. O conjunto das instalações de toda a praça bancária, incluindo as agências lotéricas credenciadas da Caixa (mais de 13.000 pontos), o banco postal (aquele que o Lula criou e deu de bandeja para o Bradesco, sendo que o banco privado rompeu a parceria tempos depois), os bancos de empréstimos consignados (como o BMG, aquele mesmo, denunciado em 2005), os bancos favoritos do baronato financeiro (como Safra, Santander, Itaú e Bradesco), ou ainda, os sistemas cooperativos (como Sicredi, com mais de 1.700 agências e Sicoob, com 2.800 pontos de atendimento).
Enfim, era possível realizar o auxílio com máxima agilidade. E essa mesma força de instalação poderia liberar as linhas de crédito, com juros zero e carência de dois anos, para salvar negócios locais e os empregos diretos. Mas, ao invés disso, o que eles fazem? Promovem a contaminação em massa, nas filas sem fim na frente das agências da Caixa. Decretam o lock down do INSS e condenam à morte milhões de empregos diretos, através da quebradeira (que poderia ser evitada) de milhões de micro e pequenos negócios locais.
Empatia seletiva das Organizações Globo e o novo normal na crise
O Jornal Nacional destrói o Bolsonaro (muito bem feito por sinal, com critério e rigor jornalístico), enquanto salva tanto o Paulo Guedes como as mentiras austericidas. A família Marinho aceita rifar o pai dos parlamentares “bananinhas”, mas jamais vão abrir mão do golpe contra os direitos sociais e a necessidade de renda mínima e do financiamento público, mesmo em uma sociedade com cada vez menos possibilidade de emprego vivo.
A dona Miriam Leitão expressa a dupla face da emissora, ainda líder do país. Por um lado, faz um comentário perfeito lembrando que Bolsonaro não tem empatia com ninguém e se recusa a liderar o Brasil. Ou seja: é um presidente que não governa. 24 horas antes, ela mesma elogia o sociopata do Paulo Guedes, cujas medidas de política econômica condenam a maioria a viver na miséria e na informalidade.
Repito. Já foi alocado um total de 35% do PIB alemão para combater os efeitos da recessão pela pandemia. Enquanto isso, o maldito Chicago Boy fala em “investimento privado e austeridade”.
No senado, Davi Alcolumbre (DEM-Amapá) quer fazer graça de “garantidor da governabilidade” do Guedes e, com isso, vai acabar levando à falência os governos estaduais. A conta é outra. O ex-capitão de artilharia, que foi reformado para não ser expulso do exército de Caxias, foi às compras. A tal da “nova política” vai custar R$ 68,5 bilhões, em troca dos 146 votos na Câmara, necessários para evitar qualquer um dos quase trinta pedidos de impeachment que se avolumavam até este texto ser concluído. Do total desses recursos alocados, a bagatela sob controle das legendas PP, PL, Republicanos e PSD (juntas, essas legendas à direita somam o volume necessário para a “vacina anti-impeachment”) seria de R$ 10,6 bilhões, que podem ser remanejados para serem usados conforme o desejo dos políticos do tal do Centrão da direita.
É um impasse a empatia seletiva da Globo? Ou será que é momento de crise mesmo e os agentes econômicos, políticos e ideológicos que não são centralizados pela demência bolsonarista, que fazem cálculos apressados tentando se salvar da desgraça? Apostaria na segunda hipótese.
Por sorte, os demônios estão todos soltos – literalmente, ao menos os que ainda não se juntaram ao capitão Adriano da Nóbrega – e prometendo a mútua destruição ampla, geral e irrestrita. Como a aposta do Bolsonaro é do tamanho de seu blefe, deve estar desesperado à procura do “cabo e do soldado” prometidos pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro, como necessários para fechar o STF. Como os cercos jurídico e midiático não vão aliviar, talvez nem o Paulo Guedes resista. Como bom apostador, quem sabe ele levante da mesa antes de perder as fichas? Tomara.
Bruno Lima Rocha é cientista político e professor nos cursos de Relações Internacionais, Jornalismo e Direito. Editor do blog Estratégia & Análise: análise política para a esquerda mais à esquerda.
As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul
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