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A batalha eleitoral no Peru

Gustavo Espinoza M.

Tradução:

Gustavo Espinoza M.*

enuesta_loginPoderia ser qualquer dia do mês ou do ano. Porém, podemos situar nossa preocupação em um, em particular: 3 de março de 2016. Foi emblemático.

Ocorreram três fatos que mostram o verdadeiro sentido da luta que trava hoje em nosso continente: em Washington, o presidente Obama ratificou a declaração do  executivo que considera Venezuela como “uma ameaça contra a segurança nacional de Estados Unidos”. Em Honduras, capangas mascarados atacaram a residência de Berta Cáceres, ativa lutadora ambientalista e a assassinaram. No Brasil desencadearam uma ofensiva contra José Ignácio Lula da Silva, com o objetivo de esmagar a ele e a presidenta Dilma Rousseff, demolindo sua imagem.
Três ações sucessivas e três fatos que servem para evidenciar concretamente o que constitui a atuação do império nestes tempos. E é que só um fio condutor união uma renovada campanha de imprensa desencadeada contra as forças progressistas de nosso continente.
Há que advertir, contudo, que tais fatos não estiveram desligados de outros com propósito idêntico:  a decisão do presidente Macri de buscar acordo em benefício dos “fundos abutres” na pátria do Libertador José de San Martín; e a ofensiva mediática contra Evo Morales, o líder do Estado Multinacional de Bolívia; a campanha contra Rafael Correa, no mandatário equatoriano, e o início de um operativo anti-sandinista na Nicarágua onde haverá eleições no próximo 6 de novembro. Tudo isso, ligado também ao incremento de ações sediciosas dos “Maras” contra o regime salvadorenho de Sánchez Cerén.
América Latina voltou a ser, como antes, um campo de batalha áspero, ríspido e pedregoso.
Poderia o Peru estar ausente desse cenário? Em outras palavras, poderiam os peruanos decidir o tipo de governo que queremos para o próximo qüinqüênio, sem que a mão do império se meta em nossos assuntos e manipule para influir em nossas decisões?
Boa parte do que ocorre agora na disputa que definirá na primeira etapa, 10 de abril, permite considerar que não nos livramos, até hoje, da ingerência ianque em nossos assuntos e que os serviços secretos de Estados Unidos e suas infinitas ramificações tocam todas as cordas de nossa política.
Desde o início temos dito – e acertamos – que todo o processo eleitoral estava orientado para restituir o poder da Máfia genocida do passado, que se expressa na aliança tácita entre Keiko Fujimori e Alan García.
Os passos registrados até hoje confirmam essa ideia. A divisão das forças progressistas, a eliminação de candidaturas presumivelmente competitivas, como a de César Acuña ou Julio Guzmán, a impunidade para Keiko e García, autores de bandidagens  piores que a dos bandidos marginais; no contubérnio das autoridades eleitorais que criaram o clima que hoje se está vivendo, de confusão e desconcerto; fazem com que temamos o pior.
Pensando bem, o país está diante de um desafio extremamente perigoso diante do qual só cabe resignar-se ou combater. Certamente há que optar pela segunda alternativa.
As massas populares já perceberam isso e já estão nas ruas. Calou fundo a ideia de que a tarefa principal no momento atual é barrar a marcha da Máfia. E por isso, em todos os rincões da pátria, Keiko e García são recebido com ovos podres, vaias , protestos constantes.
Na capital já tiveram início nutridas mobilizações que estão se incrementando e que sacudirão as bases da sociedade no próximo dia 5 de abril, ao completar 24 anos do Golpe neo-nazi dado por Alberto Fujimori para instaurar seu império.
Um marco distintivo e de real importância é o fato de que tais manifestações populares estão integradas basicamente por jovens que assomam à vida nacional com uma clara mensagem democrática e patriótica. Estudante, mulheres, trabalhadores e público em geral despertam numa circunstancia em que há que manter os olhos abertos ou morrer.
Na campanha eleitoral já aparecem novos elementos. Crescem as estimativas sobre Alfredo Barnechea, de Acción Popular- e de Verónika Mendoza, do Frente Amplio, enquanto mergulham no anonimato as candidaturas de Guerra García e Yehude Simon, Gregório Santos -provavelmente será libertado no próximo dia 29 de março- melhora sua auto estima cidadã e Vladimir Cerrón não consegue afirmar sua proposta, a mais coerente e lúcida da esquerda.
No ambiente parlamentar, a Frente Amplio apresenta candidatos que merecem apoio. Manuel Dammert e Indira Huilca –números 2 e 3 da lista de Lima; Flor de María Gonzáles –número 2 em Junín- também da FA; Manuel Bautista, de Democracia Direta, no Callao; são alguns dos candidatos que merecem apoio por sua trajetória e atuação constante.
Contudo, nada ainda está definido. Novos elos poderão modificar os cálculos de uns e outros. Porém o importante é não perder de vista o objetivo principal: derrotar a máfia a qualquer custo. Isso passa por assegurar que Alan García não consiga chegar ao segundo turno e que Keiko Fujimori seja massivamente rechaçada no dia 5 de junho, dia do segundo turno.
Muito pouco podemos os peruanos esperar de um novo governo, qualquer que seja. A sociedade peruana atravessa um período de aguda crise que se expressa em todas as áreas da vida nacional. Também na confusão, no desconserto e na violência. Temor o dever de estar conscientes de duas ideias bem claras: libertemos nós mesmos das correntes que nos atam ao império e entendemos que o processo eleitoral não é garantia para nada.
Já se disse, e é verdade, que no Peru de hoje, tudo pode acontecer. No passado, não se pode esquecer, diante de um processo eleitoral confuso e contraditório, em que se via o “veto” contra a candidatura de Haya de la Torre, o então chefe do Exército, general Julio Doig Sánchez assegurou que a palavra “veto” tinha sido retirada do dicionário da força armada.
Poucas horas depois, o comando militar anunciou que a palavra “doig” tinha sido retirada do dicionário da força armada. Assim desencadeou o golpe de 18 de julho de 1962.
Uma saída militar poderia ser nefasta. Como seria também a imposição da Máfia. Para impedir que uma ou outra coisa se concretizem a consciência cidadã deve encontra uma saída que afirme a esperança. A batalha já teve início.
*Colaborador de Diálogos do Sul, de Lima, Peru


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Gustavo Espinoza M. Jornalista e colaborador da Diálogos de Sul em Lima, Peru, é diretor da edição peruana da Resumen Latinoamericano e professor universitário de língua e literatura. Em sua trajetória de lutas, foi líder da Federação de Estudantes do Peru e da Confederação Geral do Trabalho do Peru. Escreveu “Mariátegui y nuestro tiempo” e “Memorias de un comunista peruano”, entre outras obras. Acompanhou e militou contra o golpe de Estado no Chile e a ditadura de Pinochet.

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