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À beira da liberdade, membros do Movimento Túpac Amaru sofrem perseguição judicial

Justiça no Peru busca assegurar que Víctor Polay e Miguel Rincón nunca mais vejam a luz do sol
Gustavo Espinoza M.
Diálogos do Sul
Lima

Tradução:

Não se trata do livro que o historiador peruano-estadunidense, Miguel La Serna publicou há alguns meses, nem da consigna que o Movimento Revolucionário Túpac Amaru (MRTA) publicitou em um momento, para elaborar o que considerava um imbatível binômio de vitória. É melhor uma reflexão referida a uma dura experiência nacional vivida nos últimos anos do século passado, e da qual ainda temos uma herança que pesa na consciência de muitos peruanos.  

Na realidade, o MRTA teve uma vida curta. Seus inícios podem precisar-se em janeiro de 1984, quando um destacamento adscrito ao movimento atacou o quartel da Guarda Civil em Villa El Salvador. Em seu ocaso, nas fumegantes ruínas da residência do embaixador do Japão no Peru, depois dos sucessos ocorridos ali em 22 de abril de 1997. Em 2016, o MRTA oficialmente se dissolveu, e resolveu reinserir-se no cenário político nacional. Mas já estava inativo. 

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Os 13 anos que separam o início do fim dessa organização foram sem dúvida violentos. O MRTA começou com ações armadas na zona Norte-Oriental do país, que geraram uma certa onda de simpatia em determinados setores da sociedade, pois perceberam uma opção guerrilheira e juvenil a enfrentar regimes carcomidos pela decomposição global do capitalismo dependente, como os dos ex-presidentes Fernando Belaúnde (1963-1965/1980-1985) e Alan García (1985-1990/2006-2011).

No entanto, foi durante a gestão de García que o MRTA alcançou maior protagonismo. Suas incursões em Juanjui, Soritor, Nuevo Progreso e outras localidades da selva alta culminaram nesse período com a espetacular fuga das dirigentes do movimento que se encontravam presos em um presídio da capital. O fato – que ocorreu em julho de 1990 – encerrou uma etapa do movimento e abriu outra, que se operou no regime fujimorista.

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Houve de tudo em ambos os momentos da história. Nem tudo foi burlado pelo romantismo de uma luta aberta e arriscada. Também foram registrados – mortes incluídas – deformações que deram lugar a ações deploráveis, como o sequestro de pessoas e maus tratos consumados contra elas. Por isso, os estudiosos do fenômeno falaram de luzes e sombras que selaram um caminho convulso da vida peruana.

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Justiça no Peru busca assegurar que Víctor Polay e Miguel Rincón nunca mais vejam a luz do sol

Foto: ideasGraves / Flickr
Para alguém que foi condenado, o que pode se esperar é que cumpra sua sentença e recupere sua liberdade




Confrontação final

A expressão final da confrontação entre o MRTA e o Estado foi a captura da residência nipona, em dezembro de 1996, e a Operação “Chavín de Huántar”, que pôs fim à mesma em abril do ano seguinte. Embora no plano interno o caso seja considerado formalmente “fechado”, a justiça supranacional guarda reservas a respeito do modo como se executou esse operativo no qual um Comando denominado “Os Nazistas” havia desenvolvido ações condenáveis. 

O real é que depois destes episódios se sucederam os julgamentos, as sentenças e o cumprimento delas. Hoje, vários dirigentes do então MRTA cumpriram as condenações e vivem em liberdade, aqui ou no exterior. Dois deles, no entanto, não somente estão continuam encarcerados, mas afrontam novos processos certamente “rebuscados”.

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Há aqueles que vivem empenhados em assegurar que nunca mais vejam a luz do sol. Essa situação é a que ameaça a Víctor Polay e Miguel Rincón. Sobre ambos – que nunca se acolheram a benefícios penitenciários, se encontram prestes a concluir suas sentenças e assoma um novo processo, um julgamento sem causa alguma.

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Outros exemplos

Na América Latina são conhecidos diversos casos de pessoas que, em um momento de suas vidas, tomaram as armas para fazer política. Depois, cumpriram funções de governo e até foram recebidos com tapete vermelho nas Nações Unidos. Foi o caso de Fidel e Raúl Castro, e Ernesto Guevara; de Daniel Ortega, Tomás Borge e seus companheiros sandinistas; de “Pepe” Mujica – ex-Presidente do Uruguai –, Gustavo Petro – o atual mandatário colombiano – e Dilma Rousseff, que integrara a guerrilha VAR Palmares na luta de seu povo contra a ditadura militar; ela foi brutalmente torturada e depois eleita Presidenta do Brasil.

Inclusive, Salvador Sánchez Cerén (2014-2019), antigo guerrilheiro, foi presidente de El Salvador, e até Nayib Bukele (2019-) formou parte do FMLN. A vida das pessoas nem sempre acaba com uma experiência episódica.

Para alguém que foi condenado, o que pode se esperar é que cumpra sua sentença e recupere sua liberdade. Não é sadio prolongar com pretextos e ódios irracionais castigos indevidos rebuscando temas, nem “delitos” inexistentes. As sanções não podem ser eternas.

Gustavo Espinoza M. | Colaborador da Diálogos do Sul direto de Lima, Peru.
Tradução: Beatriz Cannabrava


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul


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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.
Gustavo Espinoza M. Jornalista e colaborador da Diálogos de Sul em Lima, Peru, é diretor da edição peruana da Resumen Latinoamericano e professor universitário de língua e literatura. Em sua trajetória de lutas, foi líder da Federação de Estudantes do Peru e da Confederação Geral do Trabalho do Peru. Escreveu “Mariátegui y nuestro tiempo” e “Memorias de un comunista peruano”, entre outras obras. Acompanhou e militou contra o golpe de Estado no Chile e a ditadura de Pinochet.

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