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A direita é global

Paulo Cannabrava Filho

Tradução:

Se não nos deixam sonhar…

Não os deixaremos dormir…
(anônimo)

Paulo Cannabrava Filho*
paulo canabravaAs TIC, maravilhas e desafios deste novo século, paralelamente à volatilização do capital financeiro favoreceu a globalização da direita. Direita entendida como protagonista e/ou favorecida ou levada pela corrente. Ideológica ou alienada, oportunista ou utilizada, não importa, tem organização, direção e rumo, seja nos âmbitos locais, nacionais, regionais ou global.
A alternativa a essa realidade poderia ser uma esquerda global? Esquerda entendida como protagonista da construção de alternativas ao que a direita impõe como modelo parece estar longe disso. Esquerda ideológica, consciente de que esse modelo leva ao cataclismo, tampouco.

A direita impõe seus conceitos.
A direita impõe seus conceitos.

Marx, Lênin, Trotski e outros que protagonizaram as Internacionais (da 1a à 4a) entendiam que era necessário buscar uma confluência nos pensamentos e uma unidade na ação para enfrentar o capitalismo não tão globalizado da época, mas já com uma estratégia imperialista bem definida para assumir o controle. Com tantos e brilhantes pensadores e líderes, os paradigmas formulados para construir um mundo alternativo, melhor, não duraram cem anos.
Aqui, na nossa América, essas utopias sequer chegaram a amadurecer como alternativas. Difícil. A própria esquerda que se desenvolveu entre nós, que se vê, nasceu no autoritarismo, cresceu no individualismo consumista, foi formada para servir de contraponto necessário para manter a aparência de democracia à hegemonia oligárquica.
De maneira geral, assim se teoriza, a esquerda não foi formada para disputar o poder e ser alternativa ao sistema. Com raras exceções, essa esquerda não pensou o país. Preferiu seguir cartilhas e deu com os burros n’água.
Aqueles que ousaram pensar o país, emancipar o povo, foram demonizados e não fazem parte da historiografia oficial. O pouco que conseguiram construir em parcos períodos de revolução ou de progressismo ou de democracia, foi e tem sido violentado por contrarrevoluções ou ações desestabilizadoras promovidas pela direita global.
A decadência da escola pública entre nós, por exemplo, faz parte do projeto de prolongação da vida dessa direita global, assim como a cooptação de intelectuais. A escola perde a visão crítica da realidade e a universidade deixa de ser laboratório para pensar o país.

Nesta guerra cibernética ou ciberguerra que vem sendo travada para ampliar o controle da direita global, as bombas são lógicas e semiológicas.
Nesta guerra cibernética ou ciberguerra que vem sendo travada para ampliar o controle da direita global, as bombas são lógicas e semiológicas.

Nossos centros de ensino formam servos intelectuais capacitados para servir ao sistema. Servir e ser vil, o que dá na mesma.
Nesse vazio a direita impõe seus conceitos. Democracia perde o sentido de demos para auto ou pluto e os servos intelectuais teorizam para que assim seja. Se não é como desejam os senhores das armas não é democracia.
O próprio sentido do ser de esquerda perde seu conteúdo original. Basta atrapalhar minimamente o projeto hegemônico entram em cena os cientistas, ou os guerreiros da semiologia. Esquerdista é logo identificado como terrorista e este como ameaça mundial ao bem estar global. Um jogo perverso, perigoso, vitimando os desavisados.
Nesta guerra cibernética ou ciberguerra que vem sendo travada para ampliar o controle da direita global, as bombas são lógicas e semiológicas. Seus estrategistas sabem onde pegar e como pegar.
O diário La Jornada, no México, é uma ilha ética num oceano de indignidade midiática. Janela aberta a intelectuais livres, o jornal e seus trabalhadores vêm resistindo heroicamente numa conjuntura das mais difíceis do processo histórico mexicano. México, que já vinha de mal a pior, com a adesão ao tratado de livre comércio com os EUA mergulha numa ausência quase total de perspectivas de desenvolvimento. O que se vê é vazio de poder econômico, vazio de poder político, desemprego rural e urbano, aumento das empresas estadunidenses e a presença de seus agentes, paralelamente ao crescimento do narcotráfico. “En México se perdió el control”, expressou com estrema objetividade Carmen Lira, diretora do La Jornada, para definir a atual conjuntura.
O narcotráfico convive com o terrorismo, que por sua vez convive com os agentes dos serviços de inteligência imperiais: CIA, SNA, Mossad e “tutti capi mafiosi”. Nesse clima, o narcoterrorismo torna-se o grande medo da população, induzida pela mídia global.
Para eles La Jornada esta se tornando inconveniente. É hora de utilizar as bombas semióticas. “Jornada é conivente com o terrorismo do ETA”. O que sobressai é “terrorismo”. Terroristas são os Zapatistas, são os comunistas, os talebans e o narcotráfico. Está feita a confusão semiológica.
Dizer que isso não afeta a credibilidade e a circulação do jornal seria ingenuidade. Afeta e estão sentindo no dia-a-dia. Como não existe uma esquerda global organizada, cabe a cada um dos democratas sinceros, a cada uma das organizações sociais de caráter popular defender La Jornada.
Em nome da liberdade de expressão a mídia dos poderosos pode plantar calúnias, dizer o que bem entende e não dar espaço para que os difamados se defendam. As redes sociais estão aí para dar as respostas necessárias.
 
*Paulo Cannabrava Filho é editor de Diálogos do Sul.
 


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Paulo Cannabrava Filho Iniciou a carreira como repórter no jornal O Tempo, em 1957. Quatro anos depois, integrou a primeira equipe de correspondentes da Agência Prensa Latina. Hoje dirige a revista eletrônica Diálogos do Sul, inspirada no projeto Cadernos do Terceiro Mundo.

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