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A grande crise do século 21: entre a acumulação e a degradação ecológica

Revista Diálogos do Sul

Tradução:

Acumulação ou degradação? Tanto faz, quaisquer dessas duas bombas de tempo que exploda primeiro fará com que exploda a outra. Então, veremos uma catástrofe mundial sem precedentes. Talvez a maior degradação ecológica de todos os tempos.

Jorge Majfud*

Sendo que o passado está lá na frente e o futuro lá atrás, só podemos ver com certa precisão o primeiro, e apenas sentir o segundo, às vezes como uma brisa outras como um vendaval. Se pelo menos tivéssemos um espelho para poder dar uma olhada no futuro… Mas não. A não ser que esse espelho seja o passado, aquele que, como disse Mark Twain, não se repete, mas rima.

Cada vez que alguém se detém por instantes em sua marcha pra trás, vozes se erguem advertindo dos perigos, se não da inutilidade, das predições que, de maneira depreciativa chamam de futurologia.

O primeiro é certo: é uma tentativa perigosa. O segundo não: não só é útil, mas é também uma necessidade, ou uma obrigação moral.

Hoje, em 2018, estamos sentados sobre uma bomba relógio. Melhor dizendo, sobre duas, interconectadas.

A primeira é a crescente, excessiva e desproporcional acumulação de dinheiro e, por consequência, de poder político e militar de uma minoria cada vez mais minoritária, tanto em escala global como em escala nacional. Essa acumulação crescentemente desproporcional, produto da espiral que retroalimenta o poder do dinheiro com o poder político-midiático e vice-versa (dinâmica que produz bolas de neve no início e avalanches em seguida) se agravará ainda mais pela automação do trabalho. O desemprego nos países ricos, centros de controle financeiro, burocrático e militar, aumentará a tensão, não porque a economia do mundo rico entra em colapso mas, talvez, pelo contrário. O fascismo crescente e as reações micropolíticas da esquerda com marchas e contramarchas, serão só sintomas violentos de um problema maior.

A segunda bomba de tempo é a gravíssima ameaça ecológica, produto naturalmente, da avareza dessa minoria e do sistema econômico baseado no consumo e no desperdício ilimitado, no desesperado crescimento do PIB a qualquer custo, inclusive ao custo da destruição dos recursos naturais (flora e fauna) e de seus próprios produtos (automóveis, televisores e seres humanos). O deslocamento de milhões de pessoas por causa das enchentes e dos desertos, novas enfermidades e o crescente custo da terra, acelerarão a crise.

Quaisquer dessas duas bombas de tempo que exploda primeiro fará com que exploda a outra. Então, veremos uma catástrofe mundial sem precedentes.

A hegemonia dos Estados Unidos será assumida, e será também compartilhada pacificamente por uma associação de conveniência com a China, e provavelmente se está diante da “Trampa de Tucídides” (duas potência em tensão máxima) o evento decisivo, do conflito e da derrota militar da Pax Americana. Será, com certeza, um evento de magnitude gigantesca na área do Pacífico Leste.

A marinha mais poderosa do mundo e da história sofrerá uma derrota material, política e, sobretudo, simbólica. Só a futura crise demográfica na China (o envelhecimento da população e as anacrônicas políticas de imigração e a inconformidade de uma geração acostumada com o crescimento econômico) poderia atrasar esse acontecimento por décadas.

O panorama, por onde que se olhe, não é alentador. Talvez daí o pertinaz negativismo dos que estão hoje no poder. Esse negativismo cego em todas as esferas está hoje representado pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e pelas correntes nacionalistas e neo racistas, precisamente quando o problema é global. A presidência desse país poderá ser substituída por um candidato de esquerda em 2020 ou em 2024, mas não será suficiente para frear o desenvolvimento dos acontecimentos já desencadeados. Muito pelo contrário, será uma forma de renovar a esperança em um sistema e uma ordem mundial que está chegando ao fim dramaticamente.

Se bem seja necessário continuar lutando pelas causas justas das micropolíticas, como a dos direitos de gênero no uso de sanitários públicos (que para os indivíduos nada têm de “micro”), etc., nenhuma dessas medidas e nenhuma dessas lutas nos salvará de uma catástrofe maior. Quando já não houver terra, água, alimentos, leis, quando os indivíduos e os povos estiverem lutando pela sobrevivência de forma mais desesperada e egoísta possível, ninguém se importará com as causas da micropolítica.

O bom é que, ainda que não seja possível, honestamente, mudar o passado, o futuro sim. Mas para conseguir primeiro temos que tomar consciência da gravidade da situação. Se realmente estamos caminhando pra trás, em direção ao abismo, o simples ato de parar por um momento para pensar numa mudança de rumo parece ser o mais razoável.

*Jorge Majfud é escritor uruguaio estadunidense, autor de Crisis e outras novelas. Publicado originalmente na Alainet.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

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