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A hora e a vez do Cerrado

Revista Diálogos do Sul

Tradução:

René Capriles e Lúcia Chayb*

Nenhum respeito à natureza
Nenhum respeito à natureza

Foi necessário ouvir as vozes das ONGs que há décadas denunciam a devastação do Bioma Cerrado para que o Governo finalmente tomasse uma atitude severa contra o desmatamento. O Cerrado ocupa um quarto de todo o território nacional; com 212 milhões de hectares está distribuído em 11 Estados. Segundo o último levantamento divulgado em 2006 pelo MMA, mas com base em fotos registradas em 2002, 39% da área original do Cerrado já foi perdida restando 61% da cobertura vegetal do Bioma, que, por sua vez, não está totalmente preservada.

A agricultura e a pecuária são as principais atividades responsáveis pelo desmatamento na região. Laurindo Elias Pedrosa, professor de geografia da Universidade Federal de Goiás ressalta que, atualmente, dentro da área das bacias hidrográficas dos rios Paranaíba, Tocantins, Araguaia e São Francisco, estão localizados “importantes empreendimentos altamente impactantes, estudos e enquadramentos vinculados ao agronegócio, agroenergético e de aproveitamentos hidrelétricos, que se apresentam para estudos e licenciamentos negligenciando ou desconsiderando os efeitos e processos de interações e de sinergia que ocorrem no meio antrópico, físico e biológico”.

Um dos resultados dessa ocupação é que a degradação fez com que Cerrado fosse responsável pelo mesmo nível de emissões de CO2 da Amazônia e pelo dobro do desmatamento da floresta. A constatação é parte de um estudo do MMA apresentado recentemente pelo Ministro Carlos Minc como parte das celebrações do “Dia Nacional do Cerrado” (11 de Setembro). Ele também anunciou a abertura de consulta pública para o “Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento e das Queimadas no Cerrado – PPCerrado”. A área técnica do MMA, com base em levantamentos dos satélites CBERS e Landsat, coletados entre 2002 e 2008, concluiu, em estudo inédito, que o ritmo de desmatamento no Cerrado já corresponde a 21 mil km2 por ano, contra no máximo, 10 mil km² da Amazônia. Estima-se para o período estudado uma redução próxima a 50% nas taxas de desmatamento na floresta amazônica, enquanto o Cerrado vem mantendo taxas de desmatamento idênticas, em torno de 21% de sua cobertura ao ano.

O estudo não identifica se o desmatamento é legal ou ilegal. Para Minc, isso é importante do ponto de vista das medidas de repressão, mas para o meio ambiente “é desmatamento e contribui para as emissões”.

Mananciais que formam os principais rios brasileiros ameaçados
Mananciais que formam os principais rios brasileiros ameaçados

Na parte do Cerrado que integra a Amazônia Legal, o Código Florestal obriga a preservação de 35% das propriedades; fora delas, a Reserva Legal é de 20%. Segundo Maria Cecília Wey, Secretária de Biodiversidade e Florestas do MMA, além do estrago a uma biodiversidade riquíssima que registra algo em torno de 12 mil espécies, a perda da cobertura vegetal original afeta o ciclo hídrico nas principais bacias brasileiras.

O Centro-Oeste brasileiro, que abriga 50% da área do Cerrado, é considerado o berço das águas, já que é onde nascem as principais bacias hidrográficas do País. Ela destaca que já se conhece amplamente o efeito nocivo da substituição das espécies nativas da flora do Cerrado pelo cultivo agrícola. O maior problema, ela adverte, “será a diminuição da oferta de água em todas as bacias. O impacto na produção de energia limpa hidrelétrica, também será sentido. Cerca de 50% da geração nos níveis atuais depende do ciclo das águas em bacias do Cerrado”.

Para piorar a situação, segundo Laurindo Pedrosa, o total de empreendimentos instalados e planejados no Estado de Goiás é superior a 100 hidrelétricas, somados os em estudo e licenciamento, deverão inundar uma área superior a 6.500 km2, que adicionados aos 3.500 km2 já inundados, chegará ao montante de um milhão de hectares de terras férteis, ocupadas quase sempre por pequenos e médios produtores que trabalham em regime familiar. No Rio Paranaíba, no Estado de Minas Gerais, mais de uma dezena de barragens completarão o futuro cenário da região do Cerrado. Com a experiência da destruição da Mata Atlântica e seus nocivos efeitos, facilmente constados nos desastres de Santa Catarina, a luta pela preservação do Cerrado deve ser responsabilidade de toda a sociedade, não somente das ONGs, que há décadas lutam contra a especulação fundiária e o obscurantismo da bancada ruralista no Congresso Nacional. Parafraseando um grande filho do Cerrado, João Guimarães Rosa, podemos afirmar que chegou a hora e vez de salvar o Cerrado.

Gaia viverá!

Original revista Eco-21 da PUC/Rio http://www.eco21.com.br/edicoes/edicoes.asp?edi%E7%E3o=154


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

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