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Foto: Volodymyr Zelensky / X

A visita de Narendra Modi a Zelensky: apoio à Ucrânia ou pragmatismo?

Um dia antes da viagem, Modi declarou que a Índia não se considera mediadora entre a Rússia e Ucrânia, mas se dispôs a ajudar a dar fim ao conflito
Juan Pablo Duch
La Jornada
Moscou

Tradução:

Beatriz Cannabrava

A visita do primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, à capital da Ucrânia na última sexta-feira (23) ocorreu em um momento em que a perspectiva de iniciar negociações para alcançar uma solução política para o conflito armado que envolve dois povos eslavos, antes irmãos, o russo e o ucraniano, parece cada vez mais distante, sobretudo a partir do momento em que o governo de Volodymir Zelensky decidiu levar a guerra ao território russo através da estratégia de invadir a região de Kursk e de desferir golpes com drones, cada vez mais distantes da fronteira, na retaguarda da Rússia.

O contexto da visita, levando em conta que o exército russo continua sua ofensiva lenta, mas sustentada, na parte sob controle ucraniano de Donietsk e Lugansk e que nenhuma das partes envolvidas está disposta, por enquanto, a fazer concessões, não é o mais favorável para falar de paz, o que levou Modi a precisar, na véspera de sua viagem, que a Índia não se considera mediadora entre a Rússia e a Ucrânia, embora esteja sempre disposta a contribuir para que se ponha fim ao derramamento de sangue, convencida de que a guerra não pode ser a solução para ninguém.

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No entanto, a presença de Modi em Kiev é significativa por ser a primeira de um grande líder do chamado Sul Global – o chinês Xi Jinping e o brasileiro Luis Inácio Lula da Silva ainda não se encontraram com Zelensky – e por demonstrar que a Índia pratica uma política externa independente e pragmática que prioriza proteger seus interesses nacionais acima de qualquer crítica, como faz o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, que desafia seus parceiros da Otan ao ajudar a Rússia a eludir as sanções ocidentais, ao mesmo tempo em que vende armas à Ucrânia.

Modi pode tanto abraçar em Moscou o titular do Kremlin, Vladimir Putin, como Zelensky em Kiev, além de visitá-lo um dia antes da comemoração da independência da Ucrânia, mas não faria nem uma coisa, nem outra, se não obtivesse benefícios para a Índia: é, junto com a China, um comprador sortudo de petróleo russo com desconto e reforça sua liderança moral ao propor o fim das hostilidades, enquanto o colunista russo Dimitri Drizé não exclui que ele poderia vender parte de seu arsenal de armamento soviético a um terceiro país, e o que esse país fizer com as armas já não é assunto seu.

Tomada de reféns em prisão

A tomada de reféns – oito guardas e quatro presos – na última sexta-feira (23) por um grupo de quatro detentos, em posse de armas brancas, no centro penitenciário número 19, a poucos quilômetros da cidade de Surovikino, na região de Volgogrado, deixou um saldo mortal de quatro guardas e outros quatro feridos, hospitalizados com diferentes graus de gravidade, entre eles o diretor da prisão, Andrei Deviatov, informou o Serviço Federal de Instituições Penitenciárias da Rússia (FSIN, pela sigla em russo).

O FSIN agregou que também morreram os sequestradores, originários da Ásia Central, dois do Uzbequistão e dois do Tajiquistão, que haviam subido às redes sociais um vídeo em que se declararam seguidores do grupo radical Estado Islâmico, proibido na Rússia como “organização terrorista”. Neste vídeo mostram que obrigaram um guarda de segurança ensanguentado a pedir ao presidente Vladimir Putin que cumprisse as exigências dos atacantes para libertar os outros integrantes do pessoal retidos e os outros reféns, assim como fornecer, de acordo com fontes policiais citadas pelo serviço de notícias Baza, dois milhões de dólares e um helicóptero para escapar.

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Por mera casualidade, o mandatário russo tomou conhecimento da notícia enquanto presidia, por videoconferência, a habitual reunião semanal com os membros do Conselho de Segurança da Rússia. Após cercar as instalações da prisão e posicionar atiradores de elite, unidades especiais da Guarda Nacional tomaram de assalto o centro e “neutralizaram” (executaram) todos os sequestradores, segundo o comunicado desse corpo policial.

Quem são os “terroristas”

Através do Telegram, que tem se convertido no meio de comunicação mais rápido na Rússia, os canais Baza, Shot e Ostorzhno, Novosti (Cuidado, notícias) divulgaram as fichas policiais dos quatro atacantes, três condenados por venda de entorpecentes e um por homicídio involuntário durante uma briga. Tratam-se de Ramzindin Toshev (Uzbequistão), Nazirchon Toshov e Navruzi Rostamchon (ambos do Tajiquistão), os três condenados por narcotráfico, e Temur Jusinov (Uzbequistão), que cumpria pena por homicídio por imprudência.

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As autoridades ainda têm que averiguar de que maneira os presos conseguiram os facas em um centro que se supunha de alta segurança e não faltam as versões extraoficiais que envolvem algum membro do serviço de guarda que, por dinheiro ou por vingança a seus superiores, introduziu as armas brancas.

Outro caso

O caso de sexta-feira é o segundo parecido nos últimos meses. Em 16 de julho, seis islamitas radicais, originários da Inguchétia, república russa do Cáucaso do Norte – três já condenados em dezembro de 2023 por tentar colocar uma bomba na sede de uma corte – em espera de julgamento sob suspeita de militar “em organização terrorista”, tomaram, também com armas brancas, dois reféns entre os guardas da prisão preventiva número 1 da cidade de Rostov do Don.

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Exigiam armas de fogo, um veículo e a possibilidade de sair do país. Terminou da mesma forma: durante o assalto das unidades especiais, morreram todos os sequestradores, menos um, gravemente ferido.

La Jornada, especial para Diálogos do Sul – Direitos reservados.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Juan Pablo Duch Correspondente do La Jornada em Moscou.

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