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Acordo de Bolsonaro com Israel oficializa apoio do Brasil à violência contra povo palestino

Posição vai contra postura imparcial brasileira em relação à política internacional de abordagem pacífica, respaldada nos valores da paz e da convivência
Robson Valdez
Congresso em Foco
Brasília (DF)

Tradução:

O Acordo Brasil-Israel de Cooperação em Questões Relacionadas à Defesa, aprovado pela Câmara dos Deputados no final do ano passado e que agora, na última terça feira, 29/03, teve seu texto aprovado também pelo plenário do Senado e deverá ser promulgado pelo governo federal nos próximos dias.

Trata-se de um acordo que posiciona o Brasil flagrantemente em favor de Israel no que se refere à busca de uma solução para o conflito envolvendo a criação de um Estado Palestino livre e soberano.

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Adicionalmente, a aprovação desse acordo pelo Congresso Nacional – e sua quase certa ratificação – representa a indiferença (para não dizer apoio) do país às graves e notórias violações dos direitos humanos dos palestinos por parte dos sucessivos governos israelenses e que agora encontram-se sistematicamente documentados nos relatórios da Human Rights Watch (HRW), da organização israelense B’Tselem e, mais recentemente, da Anistia Internacional (AI), que classificou como apartheid a perseguição e o tratamento discriminatório impostos por Israel à população palestina, por meio de um “sistema de opressão e dominação”.

O posicionamento do Governo Bolsonaro no que diz respeito à Questão Palestina está estritamente alinhado ao dos Estados Unidos. Vale lembrar que além de reafirmar o desejo de mudança da embaixada brasileira de Tel-aviv para Jerusalém, Bolsonaro endossou o plano unilateral de “paz” para o conflito na Palestina apresentado pelo Presidente Donald Trump em 2020.

Nesse plano, proposto à revelia da Autoridade Palestina, Jerusalém aparece como “capital indivisível do estado de Israel”. Já o estado palestino seria formado por um conjunto de pequenas extensões de terra sem continuidade, com acessos controlados por autoridades israelenses, impedindo que a Autoridade Palestina tenha, de fato, soberania sobre seu território.

O plano viola frontalmente a Resolução 242 do Conselho de Segurança da ONU, que condena a anexação de territórios por meio de guerra, determina que os acordos de paz devam levar em consideração as fronteiras territoriais anteriores à Guerra dos Seis Dias em 1967 e determina a retirada das tropas israelenses de todos os territórios ocupados.

Posição vai contra postura imparcial brasileira em relação à política internacional de abordagem pacífica, respaldada nos valores da paz e da convivência

Palácio do Planalto / Flickr
Posicionamento do Governo Bolsonaro no que diz respeito à Questão Palestina está estritamente alinhado ao dos Estados Unidos

Convenção IV de Genebra para a Proteção das Vítimas da Guerra

Ademais, as ações militares de Israel em territórios palestinos contrariam o artigo 49 da Convenção IV de Genebra para a Proteção das Vítimas da Guerra, que proíbe a transferência forçada de pessoas dentro do território ocupado, e a Resolução 478 do Conselho de Segurança da ONU, que não reconhece a lei do parlamento israelense que, em 1980, proclamou Jerusalém como capital indivisível do Estado de Israel, e proíbe o estabelecimento de representações diplomáticas ou escritórios de negócios na cidade disputada pelos dois povos.

A complacência com essas violações, que embasam os relatórios sobre o apartheid israelense da HRW, da B’Tselem e da AI, contraria o posicionamento tradicional da diplomacia brasileira, que tem sido, até o Governo Bolsonaro, o de se respaldar justamente no respeito às mencionadas resoluções que sustentam, da mesma forma, o posicionamento da maioria dos países. Trata-se de graves violações apontadas por respeitadas organizações internacionais que minam a confiança necessária para o estabelecimento de acordos de cooperação entre os países.

Palestina e Israel: acordo anunciado por Trump não resolve conflito, diz embaixador palestino

Reparem: não há notícia de que o governo brasileiro tenha sequer consultado o Embaixador de Israel no Brasil sobre as graves denúncias de existência de um regime de apartheid no relacionamento do governo israelense com a população palestina! Como é sabido, a troca de experiências em matéria de defesa, como prevê o referido acordo, envolve a expertise das forças militares israelenses no decorrer de décadas de operações militares em territórios palestinos.

Como o Brasil pode confiar que essa eventual troca de experiência não se dará à custa do “sistema de opressão e dominação”, como informam os relatórios da Anistia Internacional? Ainda no campo da confiança mútua, que deve pautar os acordos de cooperação – principalmente na área de defesa –, o Brasil, signatário do Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares (TNP), também não tem (e não terá!) garantias oficiais de que o Estado de Israel não seja um país possuidor de arsenal nuclear!

Como se vê, o Brasil celebrou de forma voluntária um acordo na área de defesa com um país que viola e desafia sistematicamente o ordenamento jurídico internacional.

Hoje esse acordo representa o endosso, direto e indireto, do governo brasileiro à prática de crimes de lesa-humanidade, praticados pelo governo israelense, que há muito tempo vêm sendo denunciados por vários setores da comunidade internacional. A perplexidade em relação à promulgação desse acordo de defesa entre Brasil e Israel é maior porque, no início deste ano, o governo federal promulgou a Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância (depreende-se, daí, o apartheid).

Denunciar o Acordo de Cooperação em Questões Relacionadas à Defesa não significa romper relações com Israel. Na verdade, afirmaria o tradicional posicionamento do Brasil na defesa dos Direitos Humanos, bem como seu posicionamento independente e propositivo na defesa da postura imparcial do Brasil em relação à política internacional, reforçando sua abordagem pacífica, respaldada nos valores da paz e da convivência.

Robson Valdez, Pós-doutorando em Relações Internacionais do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (IREL/UnB), doutor em Estudos Estratégicos Internacionais (UFRGS) e pesquisador do Núcleo de Estudos Latino-Americanos/IREL-UnB.


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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