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Aliança antidrogas Colômbia-EUA promete mudança, mas documento final reafirma atraso

Rosário de boas intenções nada tem a ver com os novos enfoques sobre o problema das drogas defendidos por Petros
Jorge Enrique Botero
La Jornada
Bogotá

Tradução:

Com uma declaração cheia de lugares-comuns e palavras estranhas que contrastam com o insistente pedido do presidente Gustavo Petro para que se abra um novo enfoque sobre o tema das drogas, delegações da Colômbia e dos Estados Unidos encerraram a terceira reunião do chamado Grupo de Trabalho Antinarcóticos criado em Washington em 2019.

Frases como “reiterar compromissos conjuntos para uma relação mais dinâmica” ou “nossa relação de mais de 200 anos é a base de esforços comuns”, enfeitadas com um conceito da moda chamado “estratégia holística”, adornam a declaração conjunta de apenas duas páginas, emitida ao meio-dia pela chancelaria colombiana, onde se reuniram os funcionários dos dois países.

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O pronunciamento foi feito a apenas onze dias depois da publicação do informe anual das Nações Unidas sobre cultivos ilícitos, segundo o qual a Colômbia rompeu seu próprio recorde de áreas de coca cultivadas – com 250 mil hectares – voltando a ocupar o primeiro lugar entre os países exportadores de cocaína.

E coincidiu com os ecos do estrondo provocado por uma sequência de ataques com explosivos em mãos de grupos armados irregulares que operam nos departamentos com maior produção de narcóticos, no sul e sudoeste do país.

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O rosário de boas intenções que o documento contém “nada tem a ver com os novos enfoques sobre o problema das drogas que Petro defendeu em foros internacionais e na própria reunião que teve com o presidente Biden em Washington em março passado”, opinou o analista Horacio Duque.

“Cobater”

Conforme o publicado pelas partes, as autoridades da Colômbia e dos Estados Unidos “incrementarão a interdição e fortalecerão a inteligência e a capacidade da Colômbia para combater a delinquência organizada transnacional”.

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O verbo “combater” predomina nos parágrafos seguintes: “combater a lavagem de dinheiro”, “combater os delitos contra o meio ambiente” e cooperar com quem combate “atividades relacionadas com cocaína”, texto pouco feliz – segundo analistas locais – à luz da categórica afirmação feita por Petro de que “a guerra contra as drogas fracassou”.

Rosário de boas intenções nada tem a ver com os novos enfoques sobre o problema das drogas defendidos por Petros

Cortesia da Chancelaria
Reunião do Grupo de Trabalho Antinarcóticos entre as delegações da Colômbia e dos Estados Unidos. (

Em meio a um álgido debate nacional sobre o assunto da erradicação forçada dos cultivos de coca, o Grupo de Trabalho propõe uma “erradicação estratégica e contínua”, fortalecendo “a presença judicial e policial em zonas rurais”, ainda que também se refira ao apoio a estratégias para fazer a transição da coca para outros cultivos.

Um tímido apelo ao fortalecimento das estratégias contra o consumo, consignado no último parágrafo da declaração, assim como o anúncio de que serão fortalecidos mecanismos para a medição de cultivos, encerram a declaração conjunta, fruto de duas meias jornadas de trabalho, ontem à tarde e esta manhã.

Assinaram o documento os vice-ministros Francisco Coy e Camilo Umaña, de relações exteriores e justiça da Colômbia, e Adam Cohen do departamento de controle de drogas da Casa Branca e Todd Robins, subsecretário de Estado para temas de narcóticos.

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Petro e AMLO

No começo deste mês, na cidade de Cali, Petro e o presidente do México, Andrés Manuel López Obrador concordaram em que já era hora de arquivar os velhos paradigmas que guiaram por décadas o tema do narcotráfico insistindo em que os caminhos escolhidos para enfrentá-lo só tinham deixado milhões de vítimas nos países produtores.

Participante da cúpula antidrogas de Cali, a pesquisadora Estefanía Ciro disse a La Jornada que este tipo de declaração “parece assinada há alguns anos pelo governo de Juan Manuel Santos”.

Ciro, considerada uma autoridade mundial na matéria, acrescentou que ali “não há nova política nem novas abordagens” e criticou que se continue falando genericamente do “problema das drogas”.

“Petro prometeu outras coisas a esse respeito e evidentemente não são estas”, sentenciou.

Jorge Enrique Botero | La Jornada, especial para Diálogos do Sul – Direitos reservados.
Tradução: Ana Corbisier


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.
Jorge Enrique Botero Jornalista, escritor, documentarista e correspondente do La Jornada na Colômbia, trabalha há 40 anos em mídia escrita, rádio e televisão. Também foi repórter da Prensa Latina e fundador do Canal Telesur, em 2005. Publicou cinco livros: “Espérame en el cielo, capitán”, “Últimas Noticias de la Guerra”, “Hostage Nation”, “La vida no es fácil, papi” y “Simón Trinidad, el hombre de hierro”. Obteve, entre outros, os prêmios Rei da Espanha (1997); Nuevo Periodismo-Cemex (2003) e Melhor Livro Colombiano, concedido pela fundação Libros y Letras (2005).

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