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Combate à corrupção e fim do neoliberalismo marcam discurso de posse de Obrador

AMLO foi empossado neste sábado (2) e agradeceu o presidente que deixa o poder, Peña Nieto, por não ter fraudado as eleições
Vanessa Martina-Silva

Tradução:

Manuel López Obrador é a exceção à atual regra direitista na América Latina. Após três tentativas de chegar à presidência, o esquerdista AMLO, como é conhecido popularmente, tomou posse neste sábado (2) com um forte discurso de combate à corrupção, fim do neoliberalismo e retomada do crescimento e desenvolvimento econômico do México.

Eleito em julho, Obrador considera ter sido vítima de fraudes eleitorais nas eleições anteriores, de 2006 e 2012 — o mandato presidencial no México é de seis anos — o que o impediu de assumir o poder. Em menção a este fato, agradeceu o presidente que se retira, Enrique Peña Nieto, por não ter fraudado a votação e por ter permitido que o povo escolhesse seu sucessor.

Peña Nieto deixa o poder marcado por diversas denúncias de corrupção. Nesse sentido, AMLO garantiu que será contra a reeleição e que vai se submeter à revogação do mandato após dois anos e meio no poder. “O povo coloca e o povo tira do poder”, disse.  

A posse contou com a presença de diversos presidente e chefes de Estado de todo o mundo, com representantes de Guatemala, Honduras, Cuba, Equador, Colômbia, Venezuela, Bolívia, Colômbia, Belize, Argentina, Estados Unidos, Canadá, Reino Unido, Espanha, República Popular da Coreia e China, entre outros, mas a ausência de um representante brasileiro se fez sentir. Sequer o chanceler brasileiro foi prestigiar a posse do novo mandatário.

AMLO foi empossado neste sábado (2) e agradeceu o presidente que deixa o poder, Peña Nieto, por não ter fraudado as eleições

Reprodução/ Twitter
Manuel López Obrador durante posse no Congresso da União, que reúne deputados e senadores mexicanos

Em um dos pontos altos do discurso, Obrador anunciou a criação de uma comissão da Verdade para investigar o desaparecimento dos 43 estudantes de Ayotzinapa. Antes do anúncio, o público presente contou de um a 43 em memória dos jovens. O crime, ocorrido em setembro de 2014 segue, até hoje sem resolução.  

Neoliberalismo

“Iniciamos hoje a Quarta Transformação política do México. Pode parecer pretencioso ou exagerado, mas hoje não só se inicia um novo governo, hoje começa uma mudança de regime político”, afirmou. 

Obrador fez uma retomada histórica da situação econômica do país e apontou o que considera ser um “desastre, uma calamidade para a vida do país”.

Em uma crítica direta a Peña Nieto, criticou abertamente a reforma energética que “diziam que ia nos salvar”, mas que “resultou na queda da produção do petróleo e aumento da gasolina, diesel, gás e eletricidade”.

Corrupção

Apesar de ter sido o tema mais recorrente em seu discurso e também um dos bastiões de sua campanha à presidência, Obrador ressaltou que vai combater a corrupção, mas não vai “perseguir ninguém, nenhum funcionário dos governos anteriores”. “Não haveria prisões suficientes”, disse para complementar que tal processo colocaria o país em uma confrontação e fratura que consumiria muito tempo e energia.

De acordo com o mandatário, “a corrupção no neoliberalismo é essencial. No México, privatização é sinônimo de corrupção”. Para enfrentá-la, então, propõe a ruptura com o modelo neoliberal e a fundação de um novo país.

“No terreno da política se pode castigar os erros do passado, mas o importante é evitar os delitos do futuro. Proponho que coloquemos um ponto final nessa horrível história e começemos de novo”, disse.

O presidente anunciou que vai promover uma lei para converter a corrupção em um crime grave. “Com apego às minhas convicções me comprometo a não roubar e não permitir que se aproveite do poder para enriquecer isso se aplica a amigos, companheiros de luta e familiares”, ressaltou.

Propôs ainda o fim do foro privilegiado para o presidente da República que, de acordo com a proposta de AMLO, “poderá ser julgado por qualquer delito ainda que esteja em funções”.

Desenvolvimento econômico

López Obrador aproveitou o momento para ressaltar promessas importantes de campanha e a anunciar medidas como o fim da discussão da reforma estudantil, a criação de cem novas universidades e um projeto para oferecer emprego para os jovens chamados de nini (ni trabajan, ni estudian – nem trabalham, nem estudam).

Com relação à imigração, anunciou um ambicioso plano de desenvolvimento regional para que as pessoas do interior do país, sobretudo do Norte e do Sul não sejam obrigadas a imigrar e que “prosperem onde estão suas famílias e suas culturas”.

Ainda sobre o tema, disse que, coordenadamente com os Estados Unidos e com o Canadá — os três integram o Tratado Norte-Americano de Livre Comércio (Nafta)

Anunciou a apresentação de reformas constitucionais para criar um estado de bem-estar social com direito à saúde, educação e previdência social. “Faremos o Estado se ocupará de diminuir as desigualdades, não seguirá tirando a justiça social da agenda do governo. Não se condenará quem nasce pobre a morrer pobre”.

“Não é lícito defender a faculdade do estado para resgatar instituições quebradas e considerar um peso quando se trata de defender os interesses dos mais necessitados. Vamos atender e respeitar a todos, mas vamos dar preferência aos mais pobres”, afirmou.  

Em uma medida polêmica, anunciou que seu salário será 40% do que ganhava Peña Nieto. A medida é controversa porque pela lei do país, nenhum funcionário público pode ganhar mais do que o presidente do país. Além disso, anunciou que os altos empregados do Estado já não terão mais plano de saúde privado.

Além disso, o avião presidencial e toda a frota de helicópteros e naves menores serão vendidas e o gasto com publicidade do governo terá corte de 50%.

Finalmente, a Casa de los Pinos, até agora residência oficial da Presidência, será transformada em um museu “um dos maiores espaços do mundo para a arte e a cultura”.

Forças Armadas

Obrador elogiou longamente o Exército mexicano que, segundo afirmou, nunca participou de nenhuma ação de golpe de Estado, tal como ocorreu em diversos países latino-americanos — o Brasil, inclusive — e anunciou que vai criar uma guarda nacional para combater o crime no país. De acordo com o líder mexicano, a ausência de ganância pelo poder se deve ao fato de o Exército mexicano ser popular, não elitista.

“Solicito aprovação reforma constitucional p criar integração política militar, naval e das Forças Armadas para cuidar do povo com respeito aos direitos humanos”, disse. “É um tema polêmico”, admitiu, “mas tenho obrigação de dizer minha opinião”.

López Obrador encerrou seu discurso de maneira emotiva lembrando de um ciclista que o parou e disse: “você não tem o direito de falhar”, ao que o presidente completou: “eu não tenho o direito de falhar. E esse é o compromisso que tenho com o povo. Nada material me interessa. Nem me importa”.  


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
Vanessa Martina-Silva Trabalha há mais de dez anos com produção diária de conteúdo, sendo sete para portais na internet e um em comunicação corporativa, além de frilas para revistas. Vem construindo carreira em veículos independentes, por acreditar na função social do jornalismo e no seu papel transformador, em contraposição à notícia-mercadoria. Fez coberturas internacionais, incluindo: Primárias na Argentina (2011), pós-golpe no Paraguai (2012), Eleições na Venezuela (com Hugo Chávez (2012) e Nicolás Maduro (2013)); implementação da Lei de Meios na Argentina (2012); eleições argentinas no primeiro e segundo turnos (2015).

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