Episódios de nossos dias mostram outra vez o rosto da Máfia. Como antes, defensores das causas mais insólitas assomam atrás de grandes palavras. Como em outras ocasiões, a “democracia” encobre obscuros propósitos.
Isso ocorre quando Dina Boluarte recebe dois altos funcionários dos EUA: a Generala Laura Richardson, chefe do Comando Sul dos Estados Unidos, que vem “dialogar” sobre temas de Defesa e Cooperação; e Christopher J. Dodd, Assessor de Joe Biden para as Américas.
Ambas personalidades abordam temas já tratados antes e que hoje se encontram – como dizem os especialistas – “em desenvolvimento” .
Neste marco, a ofensiva da Máfia adquire um tom elevado. A campanha contra a Junta Nacional de Justiça não é jurídica, mas sim política. Esconde-se atrás de um dispositivo constitucional que permite ao Legislativo fiscalizar a JNJ embora assinala taxativamente que este se limita a faltas graves, que configuram delitos.
O presunto “delito” cometido pelos Magistrados foi pretender investigar à procuradora-geral, Patricia Benavides, dadas as graves denúncias formuladas contra ela, e nunca desmentidas nem esclarecidas.
A titular do Ministério Público, levianamente tem buscado desmarcar-se do tema, apontando que não tem que ver com o caso. É falsa. Se assim fosse, como se explicaria que ela mesma recorresse ao TC e ao Próprio Poder Judicial em busca de amparo pelas indagações contra ela? Com essa atitude a Titular do Roma admite duas coisas: que não quer ser investigada e que não aceitará denúncias contra ela.
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Sabe que não pode mostrar a sua tese de graduação, o que a levou ao sítio que ocupa; e não está em possibilidade de explicar para que destituiu a promotora que investigava sua irmã, presumida cúmplice dos “Colarinhos Brancos”. Em torno do tema, prefere fazer o que os antigos romanos chamavam de “Mutis no foro”.
Os acusadores da Junta Nacional de Justiça, não ficam no pequeno. Agora disparam fogo contra o funcionário que representa o Escritório das Nações Unidas em nosso país. O acusam de haver expressado preocupação pelo descalabro constitucional, que cairá como catarata, se forem cumpridos os desígnios em marcha.
Andina
A ofensiva da Máfia não se detém em casos específicos; amplia-se em um cenário mais extenso
Os inquisidores escondidos no Legislativo, hoje se sentem fortes. E por isso não se sentem menores e questionam ao mais alto organismo mundial que aglutina as nações.
Uma medida ruim, aliás, se tomarmos em conta que Dina Boluarte pretende falar na Assembleia Geral da ONU, exibindo seus encantos ante um espaçoso auditório que parecerá vazio, já que os mandatários assistentes, ou seus embaixadores, optarão por não se somar à vaia que acompanhará a expositora.
Em torno do tema, cabe perguntar-se o que dirá a dona nessa circunstância. Improvisará uma alocução, ou lhe farão o discurso polido? Bem mirada a coisa há que recordar aos espanhóis do Século de Ouro: “o que Natura não dá, Salamanca não empresta”.
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E pouco mais adiante, na mesma situação vai estar o Jurado Nacional de Eleições e seus órgãos afins. Por enquanto, seus titulares estão já como réus com liberdade restringida ante as “comissões fiscalizadoras” do Legislativo. Um rito que preludia uma pronta execução.
Como se fosse pouco, o precário governo modificou parcialmente sua composição. Introduziu seis mudanças, duas das quais foram rotações. A modificação do Gabinete serviu só para pôr boa cara ao fujimorismo.
A nova titular de Educação foi a “eminência gris” de Keiko no marco das comissões de 2021. E o Titular da Justiça andou no mesmo, em outras áreas. Para ambos, tais “méritos” foram mais que suficientes.
Como em casos anteriores, neste as designações receberam objeções. Uma e outra foram assinaladas como responsáveis de ingratas ações. Não obstante, os dois foram “blindados” pela precária inquilina do palácio, que cumpriu seu papel: fecham filas pelas seus quais fossem as acusações contra eles. Enquanto não fizerem nada que prejudique a “trupe” permanecerão em seus postos.
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A ofensiva da Máfia não se detém em casos específicos. Amplia-se em um cenário mais extenso. Recentemente a Grande Imprensa deu por justificar o golpe fascista consumado no Chile em 1973, argumentando que havia “salvado a democracia e a economia”. Idêntico argumento se usa aqui para justificar o golpe de 92 e seus derivados.
O mesmo ocorre com Javier Milei, ao qual criticam por “excessos”, e apontam “intenções referentes à economia e ao manejo da democracia, supostamente ameaçada por um discurso “socializante”. Elogiar a Bolsonaro, à ultradireita mexicana, aos inimigos de Petro e aos fascistas da Bolívia, reflete uma linha contínua. Jogam ao mesmo aqui quando buscam “ideologizar” sua mensagem para usá-la como ferramenta destinada a esmagar os povos.
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Finalmente, há que assinalar que nem sempre os sortilégios se cumprem positivamente. Também gera males. Uma equipe de futebol pode perder uma partida quando diante de um adversário melhor, ou pelos menos pelas decisões de um árbitro, ou seus próprios desacertos; mas esse não foi o caso.
O Peru jogou bem, esteve à altura de seu rival, não se prejudicou por decisões arbitrárias nem registrou erros fatais. Perdeu no minuto final por má sorte. Não é difícil descobrir a origem dela. Recebeu um malefício horas antes da partida, e não pôde repor-se.
A equipe jogou “enfeitiçada”. Sua derrota, era inevitável.
Os 12 planos de Boluarte
Finalmente foi possível achar o texto do “Plano Boluarte, elaborado para assegurar “a governabilidade, a ordem e a paz” entre os peruanos, e que hoje o governo pode apresentar como alternativa ao Plano Bukele. As suas normas são:
1 – Conseguir todo o apoio do governo dos Estados Unidos. Para esse efeito, enviar a Washington a Chanceler, o Primeiro-Ministro e o Ministro da Defesa, assim de que nos primeiro seis meses de gestão se ponham totalmente ao serviço da Casa Branca e organizem tudo como ela pedir.
2 – Constituir um bloco político de apoio ao governo unindo a Fuerza Popular, Renovación, Avanza País e Alianza para el Progreso em uma só Frente que sirva de respaldo ao Executivo. Para efeito, fazer todas as concessões que eles peçam.
3 – Construir uma aliança política entre o Executivo e o Congresso na base do apoio mútuo. Nós defendemos o Congresso como o “Primeiro Poder do Estado” e eles nos ajudam “a governar” aceitando tudo que nós peçamos.
4 – Institucionalizar um “Pacto” entre Congressistas, Ministros e altos funcionários, de apoio mútuo e cumplicidade total. A regra é não fazer caso a nenhuma demanda de renúncia nem a nenhuma acusação de qualquer natureza, assegurando que todos os que desempenham essas funções são “defensores da democracia” e, portanto, devem ser protegidos. Só trocar aqueles que infrinjam esta norma.
5 – Fazer um acordo com os empresários para ditar normas de governo que os protejam, eliminando qualquer disposição ou normas que beneficie os trabalhadores e os Sindicatos.
6 – Seguir escrupulosamente todas as pautas e diretrizes que o Fundo Monetário Internacional dite, aplicar rigorosamente os ditados do Neoliberalismo e desestimar qualquer ação que prejudique os grandes empresários e as corporações às quais representam.
7 – Assegurar apoio irrestrito à cúpula militar atual, garantindo-lhe total independência no manejo econômico, financeiro e administrativo de suas instituições, incrementando seus orçamentos e benefícios e assegurando absoluta impunidade para suas ações, garantindo que ninguém afete o desempenho de suas estratégias de “ordem e pacificação”.
8 – Apoiar a Promotora da Nação, apoiar-se nela na base de acordo de colaboração e cooperação mútua, assim como de total impunidade. Igualmente para as relações com a cúpula dirigente do Poder Judicial, assegurando a autonomia total de suas ações e o apoio do governo às suas iniciativas.
9 – Mudar a composição dos órgãos do Conselho Nacional da Magistratura e da Junta Nacional de Justiça, assim como do Jurado Nacional de Eleições, a ONPE e o Reniec, para garantir o controle absoluto das novas “eleições” que se produzam no país.
10 – Assegurar respaldo total à Grande Imprensa, à imprensa escrita, o rádio e a TV, combatendo, enfrentando a atividade informativa das “redes sociais” e da “imprensa informal”, adotando medidas para enfrentar e combater a “imprensa independente” e seus porta-vozes, desqualificando suas versões e atribuindo-as a “desvios terroristas” e “expressões do senderismo”.
11 – Brindar todo o apoio aos Congressistas da República sem aceitar acusações contra nenhum deles, blindando completamente suas ações. E,
12 – Durar a qualquer custo o governo até 2026 descartando completamente qualquer possibilidade de adiantamento de eleições, vacância presidencial ou fechamento do Congresso como exige a oposição. E garantir, nessa linha, que em 2026 seja eleito um governo que assegure impunidade absoluta e total em benefício dos integrantes deste governo para que nenhum termine julgado ou na prisão.
Gustavo Espinoza M. | Colaborador da Diálogos do Sul em Lima, Peru.
Tradução: Beatriz Cannabrava
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