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Gustavo Gindre*
Entre 2008 e 2012, o Fundo Setorial do Audiovisual, gerido pela Ancine, recebeu R$ 407 milhões para o fomento à produção audiovisual independente. Nesse período, foram selecionados 221 projetos aptos a captar R$ 200 milhões. Desses, 153 projetos efetivamente assinaram contratos de R$ 118 milhões. Ao final, 133 projetos levaram R$ 85 milhões
Agências reguladoras são autarquias especiais que gozam de autonomia política e financeira. Foi pensando nisso que a Medida Provisória 2228-1/2001 criou a Agência Nacional do Cinema (Ancine) e também a Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica (Condecine). A Condecine tinha entre suas atribuições custear as atividades da Ancine.
Em 2006, porém, a Lei 11.437 alterou a destinação da Condecine, que passou a integrar uma “categoria de programação específica” do Fundo Nacional de Cultura (FNC), denominada Fundo Setorial do Audiovisual (FSA).
As diretrizes e o plano anual do FSA são estabelecidos por um comitê gestor, composto por representantes do Ministério da Cultura, da própria Ancine e do “setor audiovisual”.
A Ancine funciona como secretária-executiva do FSA e possui uma superintendência (de Desenvolvimento Econômico) apenas para cuidar do fundo. Há, também, um agente financeiro responsável pelo repasse dos recursos ao mercado audiovisual. Essa função é exercida pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
O BNDES, por sua vez, contrata o Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE) como agente financeiro responsável por quatro linhas do FSA: produção de obras cinematográficas (Linha A), produção independente para TV (Linha B), aquisição de direitos de distribuição (Linha C) e comercialização (Linha D).
Essas quatro linhas integram o Programa de Apoio ao Desenvolvimento do Audiovisual (Prodav) e o Programa de Apoio ao Desenvolvimento do Cinema (Prodecine) e serão o principal objeto desse texto. Para os projetos anteriores à contratação do BRDE, em março de 2012, o agente financeiro responsável pelo Prodav e Prodecine eram a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep).
Já o BNDES se mantém como o agente financeiro do Programa Cinema Perto de Você, que integra o Programa de Apoio ao Desenvolvimento da Infra-Estrutura do Cinema e do Audiovisual (Proinfra) e que não será analisado aqui.
Até 2011, a Condecine possuía basicamente duas origens: pagamento quando da emissão do Certificado de Registro de Título (CRT), que permite a exploração comercial de uma obra audiovisual em um dado segmento de mercado, e pagamento quando efetivada uma remessa de lucros ao estrangeiro.
Com a aprovação da Lei 12.485/2011, todas as empresas de telecomunicações que exploram meios que potencialmente transmitam audiovisual passaram também a estar obrigadas a pagar a Condecine. No senso comum, essas três origens de recursos da Condecine são chamadas, respectivamente, de Condecine Título, Condecine Remessa e Condecine Telecom.
Aporte de recursos no Prodav e no Prodecine
Segundo o Relatório Anual de Gestão do Fundo Setorial do Audiovisual – Exercício 2012, confeccionado pela Ancine, o Prodecine e o Prodav receberam, entre 2008 e 2011, R$ 202.514.522,00. Apenas no ano de 2012, com a chegada da Condecine Telecom, Prodecine e Prodav receberam mais R$ 205 milhões, totalizando R$ 407.514.522,00 de recursos disponíveis.
Desse total, a Linha A recebeu cerca de R$ 172 milhões; a Linha B, R$ 100 milhões; a Linha C, outros R$ 107 milhões; e a Linha D ficou com R$ 27,5 milhões.
Projetos selecionados para receber recursos
Ainda segundo o relatório da Ancine, entre 2008 e 2011 foram selecionados 214 projetos, aptos a receber R$ 190.664.602,00 do montante de R$ 202.514.522,00 disponíveis até então no FSA. No ano de 2012, no entanto, foram selecionadas apenas nove outras obras audiovisuais, que podem receber R$ 9.816.214,56.
Assim, embora o montante disponível no FSA tenha aumentado, em 2012, de R$ 202.514.522,00 para R$ 407.514.522,00, o total aprovado para ser investido cresceu de R$ 190.664.602 para R$ 200.480.816,56, passando de 214 obras audiovisuais selecionadas até 2011 para 221.
Ou seja, R$ 207.033.705,44 (cerca de 51%) dos recursos disponíveis não foram alocados em nenhum projeto.
Projetos efetivamente contratados
Criado por lei em 2006, regulamentado pelo Decreto Presidencial 6.299 de dezembro de 2007, o FSA recebeu seus recursos iniciais em 2008 e começou a assinar seus primeiros contratos de fomento em 2009. Desde então, foram assinados 153 contratos, das 221 obras audiovisuais selecionadas no FSA.
Como visto acima, esses 221 projetos escolhidos estavam aptos a receber R$ 200.480.816,56. Já os 153 projetos efetivamente contratados poderiam receber R$ 117.986.716,80. Ou seja, um montante de R$ 82.494.099,76, embora disponíveis para projetos já selecionados, não foi objeto de contrato de fomento assinado com recursos do FSA.
Total do desembolso realizado
Dos R$ 117.986.716,80 efetivamente contratados em 153 obras audiovisuais, o FSA, entre 2009 e 2012, desembolsou R$ 85.586,682,10 para 133 obras de cinema e TV. Ou seja, cerca de 27,5% dos recursos em projetos contratados pela Ancine (equivalentes a R$ 32.400.034,07) não foram desembolsados nesse período de quatro anos.
Retorno financeiro
Parte dos projetos apoiadas pelo FSA tem obrigação de retornar o investimento feito pelo fundo. Como vimos acima, 133 projetos de fomento receberam recursos do FSA entre 2009 e 2012. O relatório da Ancine de 2012 afirma que 48 filmes para cinema que receberam recursos do FSA foram lançados comercialmente nesse período de quatro anos. Não há informações sobre as séries para TV que igualmente receberam recursos do FSA.
Até o final de 2012, a Ancine teve acesso a 21 relatórios de comercialização. Destes, somente 14 tinham obrigações de retorno do investimento para a Ancine. De um total de R$ 20.920.871,80 investidos nessas 14 obras, o FSA teve um retorno de R$ 7.192.184,41. Ou seja, para cada R$ 100 investidos pelo FSA em tais obras, retornaram ao cofre do fundo cerca de R$ 34,00.
Gustavo Gindre é jornalista formado pela UFF, pós-graduado em Teoria e Práxis do Meio Ambiente (ISER) e mestre em Comunicação e Cultura (UFRJ). Foi membro eleito do Comitê Gestor da Internet (CGI.br) por dois mandatos (2004-2007 e 2007-2010). Integrante do Coletivo Intervozes. Fellow da Ashoka Society. É servidor público concursado, especialista em regulação da atividade cinematográfica e audiovisual. Budista e socialista. Colaborador da Diálogos do Sul.