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Apoiadora da ditadura, Volkswagen se recusa a criar espaço de memória sobre o período

Abaixo-assinado com mais de 90 apoiadores cobra da montadora a construção de um lugar de memória
Cristiane Sampaio
Brasil de Fato
São Paulo (SP)

Tradução:

Personalidades, juristas e entidades relacionadas à luta pelos direitos humanos lançaram, na sexta-feira (28), um abaixo-assinado com mais de 90 apoiadores para cobrar da montadora Volkswagen a construção de um lugar de memória para lembrar a luta dos trabalhadores da empresa que combateram a ditadura militar no Brasil.

Alvo de um inquérito civil público que apura sua participação em violações de direitos humanos no período, a empresa tem se recusado a criar o espaço.

Segundo os signatários, a reivindicação pela inauguração de um espaço dessa natureza no Brasil vinha sendo colocada no âmbito das tratativas extrajudiciais que envolvem o caso da Volks, mas a montadora, nos últimos meses, teria voltado atrás.

Abaixo-assinado com mais de 90 apoiadores cobra da montadora a construção de um lugar de memória

Montagem: Diálogos do Sul
O caso Volkswagen é apontado como o primeiro que trata da responsabilização de uma empresa por grandes violações de direitos humanos

“Nós nunca nos reunimos com a Volkswagen. Ela se reúne com o Ministério Público, que se reúne com a gente, então, vai e volta, vai e volta pra fazer um acordo sobre isso. De repente, a Volks parou de tocar na historia do memorial. Ela não quer dar dinheiro pra isso”, conta o coordenador da entidade de Intercâmbio, Informações, Estudos e Pesquisas (IIEP), Sebastião Neto.

O caso da Volkswagen é apontado como o primeiro que trata da responsabilização de uma empresa por grandes violações de direitos humanos nos chamados “anos de chumbo”, que compreendem o período entre 1964 e 1988.

“A Volks se tornou um símbolo porque ela conseguiu ligar a questão da exploração violenta dos seus trabalhadores, operários, assalariados com uma repressão histórica, que era o nazismo. Então, fazia essa ligação infeliz”, sublinha o historiador e presidente do Instituto Astrojildo Pereira, José Luis Del Roio, articulador do abaixo-assinado.

Lugares de memória

Espécies de memoriais, os “lugares de memória” são construções onde se tenta resgatar e manter viva a história de pessoas que tiveram seus direitos humanos violados por regimes autoritários. Esse tipo de local é comum em países como Argentina, Chile, África do Sul e Alemanha, sendo esse último o berço do nazismo no mundo.   

O inquérito que trata do caso conta com a participação do Ministério Público Federal (MPF), do Ministério Público do Estado de São Paulo e do Ministério Público do Trabalho (MPT). Os signatários do abaixo-assinado afirmam que irão protocolar formalmente o documento no MPF.

A denúncia inicial foi apresentada pelo Fórum de Trabalhadores por Verdade, Justiça e Reparação, em setembro de 2015, e o trabalho envolve também entidades como o IIEP, além de ter apoio das diferentes centrais sindicais, de juristas e outros atores.  

Durante os trabalhos da Comissão Nacional da Verdade (2012-2014), o caso passou por análise do Grupo de Trabalho Ditadura e Repressão aos Trabalhadores, às Trabalhadores e ao Movimento Sindical (GT-13), que foi secretariado pelo IIEP e reuniu vasta documentação relacionada às denúncias. Segundo a comissão, os relatos dão conta de uma parceria da Volskwagen com o aparelho repressivo do Estado na ditadura.  

Relatório

Em um relatório produzido pela própria empresa em 2017, a montadora reconheceu que apoiou o regime militar e que houve repressão a trabalhadores seus na fábrica de São Bernardo do Campo, no ABC Paulista. O trabalho de investigação interna foi conduzido pelo historiador Christopher Kopper, da Universidade de Bielefeld, na Alemanha.

O que diz a empresa

A reportagem do Brasil de Fato procurou a Volkswagen para tratar do abaixo-assinado. Em nota enviada à redação, a empresa respondeu que tem dado sequência às tratativas junto ao MPF, ao MP de São Paulo e ao MPT.

A montadora disse ainda que tem “compromisso de longo prazo com o Brasil”, em alinhamento com o que chama de “visão de transparência”, e que mantém “diálogo ativo, desde 2015, com todos os envolvidos neste processo”.

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.
Cristiane Sampaio

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