O recalcitrante rechaço do presidente Sebastián Piñera a uma terceira retirada de 10% das economias previdenciárias, reinstalou na oposição chilena a acusação constitucional para destituí-lo, ao mesmo tempo que se quebra ainda mais o respaldo do oficialismo ao governante, que vai ficando isolado politicamente e repudiado socialmente.
Uma mostra disso se deu novamente hoje, quando 26 deputados direitistas deram seu voto a favor de um imposto ao “super ricos”, aprovado por 105 deputados, cuja arrecadação seria destinada a uma renda básica de emergência.
Se chegar a concretizar-se, atingirá os patrimônios a partir de 22 milhões de dólares, provavelmente em 2%. O governo o rechaça, embora diga que está disposto a discutir opções tributárias.
Na terça-feira, mal concretizou Piñera sua ameaça de ir ao Tribunal Constitucional (TC) para bloquear a terceira retirada – que tudo indica que será aprovada no dia 22 no Senado com votos oficialistas – a esquerdista Frente Ampla acordou promover a acusação constitucional, à qual se somou o Partido Socialista.
Não é fácil conseguir aprová-la, pois requer 78 votos dos 155 deputados em exercício e de dois terços (29 votos) no Senado, onde o oficialismo tem 15 das 43 cadeiras.
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Mas a obstinação presidencial caldeia os ânimos, e o clima social se deteriora. A Central Unitária de Trabalhadores (CUT) convocou uma greve geral para 30 de abril e a União Portuária do Chile anunciou que avançará para uma “paralisação progressiva” dos terminais.
Os estivadores citaram dados da revista Forbes dando conta do enriquecimento dos milionários chilenos durante a pandemia, entre eles o de Piñera cuja fortuna passou de 2 bilhões e 60 milhões de dólares para 2 bilhões e 900 milhões de dólares, o que “demonstra como a crise só prejudicou os mais pobres, situação que a este governo não só não incomoda, mas a reforça e insiste com decisões como a de acudir ao TC”.
Wikimedia Commons
O presidente Sebastián Piñera
A Federação de Trabalhadores do Cobre chamou seus filiados “a manter-se vigilantes e permanecer preparados para mobilizar-nos em apoio às justas e necessárias demandas da cidadania, pelo total ausência do governo que se nega a outorgar proteção a milhões de compatriotas, em meio da pior crise econômica do presente século”.
A noite de terça-feira foi uma jornada de panelaços massivos em múltiplas cidades, municípios e bairros do país, acompanhado de bloqueio de ruas, barricadas incendiárias e ataques a delegacias.
Alguns dirigentes advertem que se o bloqueio à terceira retirada se concretizar, será a mecha de uma nova explosão social, em alusão à revolta de outubro de 2019 e que a peste da Covid conseguiu soterrar.
Luis Messina, porta-voz da Coordenadora de Trabalhadores “No+AFP” (acrônimo de Administradoras de Fundos de Pensões), publicou um vídeo afirmando que “é necessário, preciso e urgente que o Congresso em uso de suas faculdades destitua Piñera, não podemos seguir sob a tutela de um sujeito que está absolutamente enfocado em levar adiante suas políticas contrárias à grande maioria”.
Mas o maior abandono a Piñera vem pelo lado de seus parlamentares, que apoiam a terceira retirada e lhe advertem que os bônus e ajudas focalizadas, com requisitos de difícil cumprimento e com montante abaixo da linha da pobreza, são insuficientes.
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Quando na semana passada foi aprovada a terceira retirada com 120 votos favoráveis na Câmara de Deputados, 42 votos eram de parlamentares opositores, apenas 19 votaram contra. No Senado são requeridos 26 votos (3/5) dos 43 senadores, que se superam com os cinco direitistas que comprometeram seu respaldo.
Mario Desbordes, candidato presidencial da Renovação Nacional e ex-ministro da Defesa do mandatário, dizia claramente ontem: “Creio que meu governo comete um erro, creio que se um TC resolver bloquear esse projeto, o derrotado não vai ser a deputada, o deputado, o candidato ou a candidata. São as pessoas da classe média que não estão recebendo ajudas do Estado ou não lhes chegam em quantidade suficiente”.
Aldo Anfossi, especial para La Jornada desde Santiago do Chile
La Jornada, especial para Diálogos do Sul — Direitos reservados.
Tradução: Beatriz Cannabrava
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