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Avós da Praça de Maio: Uma vitória de cabelos brancos

Revista Diálogos do Sul

Tradução:

Maria José Silveira*

Estela e Guido Carlotto. Estela e Guido Carlotto.

Esta é uma história que merece ser contada.

A história de Estela de Carlotto, uma das centenas de Avós da Praça de Maio que agora, com a idade de 83 anos, depois de 36 anos de procura, descobre seu neto. Ele, que recebeu de sua família adotiva o nome de Ignácio Hurbán, é um dos cerca de 500 bebês, filhos de prisioneiras políticas, que foram sequestrados pela ditadura militar que ensanguentou a Argentina entre 1976 e 1983.

Laura, sua mãe, com 23 anos foi presa quando estava grávida de dois meses, e viu o pai de seu bebê morrer torturado na sua frente. Seu parto foi feito, com ela algemada à cama, na maternidade clandestina do Hospital Militar.  Cinco horas depois que nasceu, seu filho foi levado pelos militares e, dois meses depois, Laura foi fuzilada e abandonada perto de uma rodovia. Seu rosto estava desfigurado por golpes com a culatra do fuzil e seu ventre perfurado com balas. Anos depois, o ex-general Guilhermo Suáres Mason foi condenado por seu assassinato.

O bebê, com poucas semanas de vida, foi entregue a uma família de agricultores que nada sabiam de sua ligação com a repressão, e com eles cresceu. Hoje, ele é músico, um pianista, que, suspeitando de sua origem, fez voluntariamente o exame do DNA no Banco de Dados Genéticos onde, por iniciativa das Avós da Praça de Maio, estão depositadas amostras das famílias de bebês desaparecidos.

Para os generais argentinos que assassinaram cerca de 30 mil pessoas e arquitetaram esse inominável sequestro de crianças, a subversão era coisa hereditária e, sendo assim, os filhos dos opositores deveriam ser criados por sólidas famílias cristãs. Temiam também uma possível vingança por parte desses bebês, quando adultos, caso fossem criados pela família biológica.

Estela de Carlotto, a neste momento feliz avó do jovem pianista, é uma das líderes e fundadoras da organização em defesa dos direitos humanos, mundialmente conhecido como as Avós da Praça de Maio. O movimento recebeu esse nome porque foi nessa praça de Buenos Aires, situada em frente à Casa Rosada, sede do governo argentino, que elas passaram a se reunir, ainda em plena ditadura militar, para começar a luta pela procura dos filhos de seus filhos presos, torturados e desaparecidos.

Várias vezes indicada ao Prêmio Nobel da Paz, a organização das Avós da Praça de Maio, com imbatível tenacidade, já conseguiu encontrar 114 dos seus netos. Como diz Estela, as crianças encontradas pelas famílias biológicas são por fim “libertadas, pois recuperam sua verdadeira identidade”.

Mas ainda faltam quase 400 deles, e a campanha na Argentina continua. Javier Mascherano, por exemplo, jogador da seleção argentina, foi uma das várias pessoas que já participaram em campanhas na TV pela recuperação dos desaparecidos. Como um resultado dessas campanhas, o jovem Ignácio Hurbán começou a desconfiar que poderia ser um desses netos.

Hoje, aos 36 anos, ele por fim sabe quem de fato é, como nasceu, de quem é filho, e pode ser abraçado, e por sua vez beijar os cabelos brancos de sua avó.

*Do núcleo de colaboradores de Diálogos do Sul

 


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
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