A que ponto chega o lawfare na Argentina com o arbítrio parcial do Tribunal Oral 2, na causa “Vialidade” (designação e construção de obras públicas em Santa Cruz), acusando a vice-presidenta Cristina Kirchner de associação ilícita, sem delitos, nem provas, nem testemunhas? Nesta segunda-feira (22), o promotor Diego Luciani faz um pedido de condenação à Cristina Kirchner de 12 anos de prisão e inabilitação perpétua para exercer cargos públicos.
Cristina pediu para pronunciar-se no Tribunal com alegações de defesa. Frente à negativa, manifestou-se: “Estamos diante de um pelotão de fuzilamento midiático-judicial”. Assim, a vice-presidenta (duas vezes presidenta) e senadora (FdT), decidiu dar publicamente seu agregado ao processo, um contundente depoimento jurídico e político, via redes sociais, rádios e uns cinco canais de TV (TV Pública, C5N e outros que romperam o cerco midiático), nesta terça-feira (23), no seu escritório no Senado.
Cristina Kirshner: “Não estão atrás de mim, mas dos direitos dos trabalhadores e aposentados”
O poder fático concentrado, acionado desde os EUA e que desengaveta o processo “Vialidade” (sem fundamentos, nem provas) contra governantes do kirchnerismo, no pior estilo da Lava Jato brasileira, sofreu, dias antes, um contra-ataque pouco divulgado pela mídia hegemônica: reveladoras imagens comprometem o promotor parcial e “ator midiático”, Diego Luciani e outros juristas acusadores da dita causa, com o ex-presidente Macri, participando de amistosos jogos de futebol na sua chamada “Quinta de los Abrojos”. Um nítido retrato da “independência” entre os poderes Judicial e o Executivo na gestão macrista.
O pronunciamento de Cristina teve duplo efeito: por um lado, desmontou judicialmente a acusação, girando o boomerang contra os acusadores macristas. Por outro, um gol político: reativou a força do peronismo do qual é, sem dúvidas, a principal líder de massas nesta etapa.
As provas apresentadas por Cristina Kirchner foram contundentes. Não puderam entrar no Tribunal, mas saíram pelas portas e janelas do Congresso rumo às praças e casas do povo argentino. Cristina desnudou conversações telefônicas entre José Lopez (ex-secretário das Obras Públicas, que se serviu em 2016 ao escândalo da bolsa de 9 milhões de dólares desviado e lançado num convento de freiras) e Nicky Caputo (empresário, considerado irmão de vida de Macri), que demonstram que a acusação oculta os verdadeiros atores do crime contra o Estado.
Veja a íntegra da intervenção de Cristina realizada no seu escritório no Senado. A jornalista de questões judiciais, Irina Hauser, resume alguns pontos sobre as revelações de Cristina Kirchner, que foram ocultadas no processo, comprometendo o Partido Judicial-Midiático que, tudo indica, se oficializou com este bárbaro pré-anúncio de condenação no TOF2.
O segundo gol contra a oposição e os armadores políticos desta farsa judicial, não previsto, foi a decisão e capacidade de Cristina Kirchner de fazer o alegado pela verdade, publicamente, defendendo-se, como advogada de formação, e mais uma vez demonstrando sua liderança política que energiza a juventude militante peronista, cidadãos comuns, idosos, empregadas domésticas, e intelectuais, mobilizados em massa para apoiá-la, desde a porta da sua casa à entrada do Congresso. O Partido Judicial-Midiático que se consagra com esta causa acaba de acionar um verdadeiro bumerangue. O acusador termina sendo o acusado.
As palavras finais da alegação de Cristina, carregada de emoção, foram um brilhante resumo do seu pensamento político, da sua moral e da sua decisão de luta. Ao dizer que esse não é um julgamento à Cristina, mas ao peronismo, comoveu e moveu multidões:
“O Lawfare tem um degrau mais alto – nós argentinos sempre fomos um pouco mais longe. A tragédia da ditadura genocida que vivemos foi a mais sangrenta de todas”. E prosseguiu: “Nesta farsa de hoje que é o lawfare na América Latina, ao não se tratar mais de partidos militares, há um partido judiciário; eles vão um passo além. Aqui não se trata de estigmatizar ou confundir governos populares com associações ilícitas. Agora protegem quem realmente rouba no país”.
O pedido do promotor Luciani, de condenar Cristina Kirchner a 12 anos de prisão, correspondente aos anos de governo kirchnerista e soa mais político que judicial. Recebeu uma resposta contundente:
“Foram doze anos, os doze anos do melhor governo que a Argentina teve nas últimas décadas: o de Néstor Kirchner e meus dois mandatos”.
“Por que eles nos pedem doze anos? Eu digo isso com números. Um pela memória, outro pela verdade, outro pela justiça, outro pelo Fundo, outro pela AFJP, outro pela YPF e Vaca Muerta, outro pelo não endividamento, outro pelo salário dos trabalhadores” (enumerou com os dedos).
“Quando saí, os trabalhadores ficaram com 51,8% do PIB e o resto foi para os empresários. Agora, sem mencionar como estamos. Por isso vão me estigmatizar, por isso vão me condenar. E quero dizer uma coisa: se eu nascesse mais 20 vezes, eu faria novamente 20 vezes” – CFK, veja.
Reprodução – Twitter
Prepara-se uma multitudinária manifestação nacional unitária, dirigida pelas organizações políticas, nos próximos dias
A oposição busca aproveitar-se, já e agora, de uma situação de reordenamento das forças internas do governo, após a retirada de Guzmán e a nomeação de Massa, tratando de dividi-lo rumo à direita, e apoderar a oligarquia agrícola-financeira e desconcentrar o governo da Frente de Todos diante das emergências econômicas, inflacionárias e salariais (reivindicadas nas ruas pelos sindicatos e movimentos sociais como no dia 17), com últimas chances de avançar com mais Estado e controle social.
O Partido Judicial-Midiático tem consciência da crise sistêmica global do capitalismo e que o projeto de Cristina Kirchner, interrompido em 2016, é o que está na ordem do dia do setor mais combativo da Frente de Todos em conexão com a cidadania para sair deste impasse.
A intenção da direita é promover o show midiático em sintonia com as ameaças judiciais contra a “ladra” Cristina Kirchner para distrair e desestabilizar; ao mesmo tempo, se funcionar, proscrevê-la e impedir sua candidatura em 2023.
A movida é essencialmente política, porque judicialmente o ataque à Cristina deixa vazar água por todos lados. O procurador Luciani disse que “possuía 3 toneladas de papéis de provas contra Cristina”, mas como o povo já comenta: “tudo é fumo!”.
Cristina Kirchner denuncia lawfare na Argentina comandado a partir dos EUA
Além do pronunciamento oficial de Alberto Fernandez contra o ataque à vice-presidenta, a Frente de Todos se uniu totalmente, recolhendo o apoio dos movimentos da esquerda mais crítica ao governo (FIT-PTS).
Documentos de vários intelectuais, centrais sindicais (CTA dos Trabalhadores, CTA Autônoma, CGT), governadores e prefeitos, conselhos diretivos de várias faculdades (Direito, Letras, Filosofia) da UBA, organismos pelos direitos humanos e movimentos sociais (Pátria Grande, Bairros de pé, etc..), do PJ, circulam pelas redes, enquanto em todo o país proliferam protestos massivos de rua, assembleias, na defesa de Cristina Kirchner, contra a judicialização da política, e a ameaça ao processo democrático.
A solidariedade internacional contra o lawfare e a perseguição a Cristina Kirchner é enorme, sobretudo na América Latina. Pronunciaram-se presidentes como Díaz-Canel e Xiomara Castro e assinaram um documento comum Evo Morales, López Obrador, Gustavo Petro e Alberto Fernández. Evo deu entrevista à TV C5N:
“Expressamos nosso apoio a Cristina. A irmã Cristina é valente, não se renderá. Cristina levava alimentos e ajuda à Bolívia, enquanto Macri enviava armamentos. Os Estados Unidos estão preocupados com o lítio. O império não permite que possamos viver melhor. É uma luta permanente pela liberdade dos povos. EUA quis nos prescrever, a história se repete. Preferimos estar com nosso povo. É uma batalha dura, mas vamos vencer! Temos que libertar-nos do intervencionismo. É possível retomar a UNASUL. Agora chegará Lula. Há que potenciar a CELAC.”
Enfim, ninguém se esquece que Cristina é vítima do lawfare que continua vivo, como no Peru, e já causou muitos danos na América Latina contra Lula e Dilma, Rafael Correa, Evo Morales e Fernando Lugo.
Como dizem os cânticos dos manifestantes: “Eh gorila! Se tocan en Cristina, que quilombo (rebelião) se vai armar!”. Desta vez, tocaram no coração e na memória do povo argentino. Militantes e cidadãos voluntários deixam o trabalho, correm e se aglutinam, dia e noite, na porta da casa de Cristina, para a vigilância e defesa de Cristina na porta da sua casa.
Caso Corriere della Sera vs Cristina revela misoginia, colonialismo e perseguição política
Prepara-se uma multitudinária manifestação nacional unitária, dirigida pelas organizações políticas, nos próximos dias, confirmada após uma contundente declaração do Partido Justicialista.
O peronismo se encontra em estado de alerta e mobilização. O povo já entendeu que, junto à integridade de sua vice-presidenta e líder Cristina, estão em risco a democracia, o direito de expressão e organização de cada cidadão, a integridade da mulher, dos aposentados, dos estudantes, dos trabalhadores e excluídos, enfim, um governo, um projeto econômico-popular e de nação bem vividos com Perón, Evita, Néstor e Cristina.
Helena Iono, colaboradora da Diálogos do Sul, direto de Buenos Aires.
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