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O pacote de Sergio Moro e os três curingas da restauração conservadora

O ministro age com absoluta autonomia com relação ao presidente - o que seria impensável num governo de FHC ou Lula.
Rodrigo Vianna
Belo Horizonte

Tradução:

Com Bolsonaro preso à cama do hospital, e numa condição de saúde aparentemente mais grave do que médicos e família admitem, o superministro Moro lança um “pacote” de medidas contra crime organizado e corrupção.

O ministro age com absoluta autonomia com relação ao presidente – o que seria impensável num governo de FHC ou Lula.

No aeroporto de BH, onde escrevo essas linhas, os televisores mostram um Moro com poder hipertrofiado na tela da GloboNews, diante da classe média que aguarda seus voos.

A simbologia de um superministro que segue agenda própria e “fatura” individualmente com o pacote, enquanto o presidente segue enfraquecido no hospital, diz muito sobre esse governo.

O ministro age com absoluta autonomia com relação ao presidente - o que seria impensável num governo de FHC ou Lula.

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Bolsonaro e os três filhos lideram a primeira linha de força programática

Bolsonaro é um agitador que preside um governo com 3 linhas de força programáticas:

– a pauta conservadora nos costumes e o anticomunismo doentio;

– o programa ultraliberal na economia (privatizações e Reforma da Previdência);

– pauta punitivista da Lava Jato, que serve tanto ao desmonte do mundo político como à perseguição contra líderes e movimentos de esquerda.

Bolsonaro e os três filhos lideram a primeira linha de força programática. A segunda segue o comando de Paulo Guedes. E a terceira está nas mãos de Moro. Os militares fazem a mediação e tentam dar alguma racionalidade ao governo.

A Globo é aliada para impor a segunda e a terceira partes da agenda. Mas se opõe à primeira linha de força (dos costumes). 

Tudo leva a crer que, tão logo se resolva a Reforma da Previdência, a Globo e os poderes invisíveis do chamado mercado partirão para a derrubada ou o enfraquecimento da família Bolsonaro.

A restauração conservadora poderá então entrar em nova fase. Para tocar a segunda e a terceira parte do tripé governista (neoliberalismo e lavajatismo), Bolsonaro pode ser não apenas desnecessário como um peso perigoso – por conta do telhado de vidro da familia com os milicianos do Rio.

Engana-se, no entanto, quem possa imaginar que a restauração conservadora terá fôlego curto por conta dessa contradição (já visível) entre os aloprados do terra planismo e a parte neoliberal/lavajatista do governo.

A desenvoltura de Moro (exposto hoje durante mais de 2 horas pela GloboNews, como herói da moralidade) mostra que o projeto da restauração guarda certa autonomia em relação ao bolsonarismo mais duro.

Os conservadores têm ao menos 3 coringas na manga para seguir no jogo se Bolsonaro se enfraquecer, por razoes medicas ou judiciais: Mourão, Moro e Doria.

O primeiro poderia dar seguimento ao projeto, livrando-se (como já sinalizou) da pauta mais atrasada nos costumes… Mourão significaria a volta de um projeto militar conservador, com uma guinada liberal que o regime de Geisel/Golbery não possuía.

Os outros dois são coringas fortíssimos que se preparam para 2022. O fracasso eventual de Bolsonaro não significa que a agenda do governo que ele comanda (mais como símbolo do que como líder de fato) sairá derrotada. Ao contrário: o pacote de Moro e as falas dos oportunistas (da direita à esquerda) na eleição da mesa do Senado (acenando para a “nova política”) mostram que a pauta de restauração, iniciada com o levante de 2013 e reforçada com o impeachment e a Lava Jato, tem fôlego para ao menos 8 anos.

O que pode mudar isso, a meu ver, são a conjuntura internacional (com a provável derrota da ultra direita de Trump na próxima eleição nos EUA) e a capacidade da esquerda brasileira se reorganizar – menos no Parlamento e mais nas ruas.

Para a direita se consolidar em 2022, será preciso não só manter Lula preso como avançar contra as organizações populares e os partidos de esquerda – e o pacote de Moro pode ter papel decisivo nessa operação.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
Rodrigo Vianna

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