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Conheça os seis pilares de sustentação do governo de ocupação e captura do poder

Problema não é Bolsonaro. Enquanto as forças democráticas exercem o jus esperneandi, militares simplesmente se consolidaram no poder
Paulo Cannabrava Filho
Diálogos do Sul
São Paulo (SP)

Tradução:

Tem uma máxima que diz: “se você perde o trem da história, você fica a ver navios”. Eu não sei se é mineira ou grega, mas podia ser mineira porque embute a sabedoria dos nossos caipiras, dos caiçaras, dos nossos caboclos. 

A falta de percepção sobre a realidade está levando as lideranças do que ainda resta dessa nossa débil democracia a “ficar a ver navios” enquanto as coisas acontecem.

A realidade a que me refiro é o governo militar, governo de ocupação que muitos chamam de governo Bolsonaro, abstraindo o fato de que tem sua origem no planejamento de longo prazo para captura do poder pelas Forças Armadas. Uma estratégia de guerra que culminou com a captura do Planalto através da farsa eleitoral de outubro de 2018.

Agora, assustadas, no seio dessas lideranças estão surgindo várias propostas sobre como formar uma aliança para enfrentar o governo nas próximas eleições. Este é o primeiro erro de avaliação sobre a natureza do governo.

Outros setores, na chamada esquerda, acordaram para o impeachment. Três anos de atraso. 

A situação era de tempestade perfeita para que esse governo não tomasse posse. Negligenciaram. 

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O povo cooptado. Principalmente aquele povo que foi abandonado, esquecido, marginalizado, foi arregimentado. Hoje está tudo dominado. Quase tudo, melhor dizendo, pois, ainda há espaço para que se construa uma aliança com os setores populares.

A solução não virá com o impeachment de Bolsonaro simplesmente porque o problema não é Bolsonaro. Enquanto as forças democráticas exerciam o jus esperneandi, eles simplesmente se consolidaram no poder. Tiveram três anos para isso sem o menor impedimento.

Problema não é Bolsonaro. Enquanto as forças democráticas exercem o jus esperneandi, militares simplesmente se consolidaram no poder

Wikimedia Commons
Ainda há espaço para que se construa uma aliança com os setores populares.

Vejamos os pilares em que hoje se sustenta esse governo de ocupação:

  1. O Governo
    O governo — todo o aparato da administração pública — funciona como uma máquina. É também um conglomerado de gente acostumada a agir em obediência cívica, sem questionar. Imagine, questionar a quem? Ao patrão?

    São 21 ministérios, todos nas mãos dos militares, da ativa e da reserva. As pastas que têm um ministro civil, como os de Educação ou dos Direitos Humanos, ao lado do civil tem 20, 25, cargos de decisão mais importantes nas mãos de militares.

  2. Forças Armadas
    Outro pilar importante são as Forças Armadas. Por mais que os chefes militares digam que são neutros, que não querem fazer política, que não há perigo algum de que ocorra um golpe, não escondem o fato concreto de que temos um governo de ocupação. Claro que não vai haver golpe. Para quê? Já estão no poder.
    Me engana que eu gosto. Quem é que manda?
    Sobre o golpe, em 2016 e 2017 eles juravam de pés junto que não haveria golpe, que haveriam eleições. O general Villas Boas comandou a campanha sem esconder de ninguém que se tratava de capturar o poder sem chance de derrota. Congresso, Judiciário, meios de comunicação, todo mundo assistindo e aplaudindo.
    Militar no governo está ganhando em dobro, fora as mordomias. Os civis que compartilham com eles os postos de governo são cúmplices, são a pior escória do Centrão, são oportunistas que só pensam em tirar proveito para si e seus assemelhados e familiares.

  3. Polícias Militares 
    As PMs estão constituídas em todos os estados como força militar auxiliar das Forças Armadas. Estão, como cada um vê diariamente, equipadas e treinadas para manter a ordem pública, o que significa reprimir qualquer manifestação que ameace desestabilizar o governo. Parte da oficialidade das PMs participam de um governo que acreditam ser o governo deles, para eles.


  4. Doutrina e Projeto
    É uma questão subjetiva transversal aos três fatores mencionados. Governo, Forças Armadas e polícias militares estão unidos em torno de um projeto (captura do poder) e uma doutrina (corrupção, anticomunismo, antipetismo).
    Há a terceira e quarta questões subjetivas a unir o governo de ocupação: a fé e a seita.
    A fé na religião (só Cristo salva). Assim como as várias denominações evangélicas, oriundas dos Estados Unidos (pentecostais e neopentecostais) ocuparam os espaços populares antes ocupados pela Igreja de Roma e pelas organizações populares, ocuparam também os espaços nos quartéis. E isso desde as mais altas hierarquias até a tropa.
    A maçonaria é a seita. A alta hierarquia das Forças Armadas e das polícias militares se vinculam através das lojas maçônicas. O que os une é o projeto de poder fundado num anticomunismo sem lastro histórico. A maçonaria funciona também como um elo entre o poder militar e profissionais liberais e formadores de opinião da sociedade civil.

  5. Fiesp/Ciesp
    As Federações de Indústria existem em cada um dos estados e, no âmbito nacional, temos as Confederações, inclusive a Confederação Nacional Agrária. Essas organizações jogaram um papel fundamental em estimular a desobediência civil (campanha do pato), na mobilização pelo impeachment e na campanha eleitoral. Estão perfeitamente articuladas com o projeto de governo de ocupação.

  6. A Família
    O clã Bolsonaro com máfias, milícias e o crime organizado, ao que tudo indica, estão unidos em um projeto de poder a qualquer custo. 

Cheguei a essas conclusões após assistir alguns vídeos reveladores de alguns dos principais personagens importantes na execução desse projeto de captura do poder que agora está na fase de consolidação. 

Um deles, uma fala do general Braga Neto para sua turma. Este me provocou náuseas. Confirma o que estamos dizendo desde 2018. É projeto de captura e manutenção do poder. 

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
Paulo Cannabrava Filho Iniciou a carreira como repórter no jornal O Tempo, em 1967. Quatro anos depois, integrou a primeira equipe de correspondentes da Agência Prensa Latina. Hoje dirige a revista eletrônica Diálogos do Sul, inspirada no projeto Cadernos do Terceiro Mundo.

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