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Paulo Cannabrava | Militares estão se preparando para continuar no poder com ou sem Bolsonaro

A CPI é vital. Mostra um governo genocida que mesmo durante as investigações do Senado mantém as práticas de necropolítica e tenta se manter na ativa
Paulo Cannabrava Filho
Diálogos do Sul
São Paulo (SP)

Tradução:

Já se percebe que há desgoverno. Não dá mais para esconder. 

Depois do manifesto firmado por representantes dos maiores bancos e financeiras os jornalões e as emissoras de rádio e televisão tiveram que adaptar-se à nova situação e passaram a mostrar a realidade. Realidade de um governo militar fracassado e de uma política econômica tão mortal ou mais que o vírus da pandemia.

Desacostumados com o pensamento divergente, é interessante ver os jornais se contraditando de uma página para outra, ou os vetustos comentaristas falarem coisas que eles mesmos jamais pensaram que poderiam falar. É o poder do dinheiro. O dinheiro dos bancos e financeiras falando mais alto que o dinheiro da Secom. Ademais, o dinheiro dos bancos é eterno o da Secom já está minguando. 

Tem um fato novo. A direita perdeu o monopólio das ruas. Aquelas pífias manifestações de uns poucos gatos frente ao chiqueirinho do Alvorada; grupos de fanáticos desfilando por ruas e ocupando praças; comícios feitos pelo agronegócio; motociatas de grã-finos; transformados em um nada diante da avalanche de juventude que ocupou as ruas nas principais cidades do país. 

E sábado, dia 19 vai ter mais. Acabou-se o sossego para os negacionistas. Onde quer que se manifestem têm logo respostas. O episódio ocorrido no avião em aeroporto do Espírito Santo é emblemático. Genocida… Assassino, fora Bolsonaro. Novo grito de guerra que ecoa por toda a parte. É o povo cansado e indignado que se manifesta.

Pesquisa da XP/Ipesp já mostra que 60% dos entrevistados desaprovam o governo militar.

De novo se apresenta uma conjuntura de tempestade perfeito. A pergunta que ninguém quer responder: Por que não se aproveita? 

Há na CPI do Senado sobre a Covid mais que evidências que justifiquem o impedimento do presidente da República. Balela dizer que o processo é traumático, que já tivemos dois impeachments nessa ainda incipiente nova república nascida do Pacto Constitucional de 1988. Traumático é não responsabilizar todo esse governo pelas 500 mil mortes. Existe algo mais traumático que meio milhão de cadáveres?

O impeachment não é a melhor solução. Não creio que se consiga através do impeachment derrubar todo o governo. Pois essa é a questão. Não podemos deixar que as forças armadas que ocupam o governo, presidam o processo sucessório, as eleições de 2022, cuja campanha já está nas ruas.

A CPI é vital. Definitiva. Mostra um governo genocida que mesmo durante as investigações do Senado mantém as práticas de necropolítica. Práticas de um governo que, além do mais, é ilegítimo, é produto de fraude. Fraude que denunciamos ainda em 2018 e que a cada dia se torna mais evidente, mais fatos se juntam para corroborar com a ilegalidade do pleito.

Dia 4 de maio, pouco mais de um mês, o Tribunal Superior Eleitoral mandou para o Supremo Tribunal Federal, atendendo pedido do ministro Alexandre de Moraes, a documentação que comprova a fraude, através das ilegalidades cometidas durante a campanha, que vai da manipulação das redes com disseminação de mentiras e abuso do poder econômico, gastos ilícitos.

É por aí que se pode pegar o governo. A fraude justifica a cassação da chapa da dupla Bolsonaro/Mourão, apresentada pelo PSL, que, diga-se de passagem e com muita indignação: – nunca deveriam ter tomado posse. 

Derrubada a chapa, ou seja, anulada a eleição, toma posse o presidente da Câmara de Deputados. Este pode, no dia seguinte, atendendo recomendação dos cientistas, formar uma Junta de Salvação Nacional para conduzir o país nesse momento crucial de crise sanitária e econômica, e preparar o país para as eleições.

Essa é uma realidade possível. 

A realidade concreta é que os militares que ocuparam o governo por meio de uma Operação de Inteligência e fraude, o fizeram para ficar. Segundo eles próprios reiteradamente afirmaram, precisam de no mínimo 30 anos para consertar o país. Stroessner e Pinochet são os exemplos de ditadores que eles seguem. O país não tem condições de suportar esse desgoverno nem por mais um ano. 

Mas parece que os dirigentes políticos resolveram disputar a eleição de 2022. Está errado. Com Bolsonaro ou sem Bolsonaro os militares estão se preparando para continuar no poder. Deixa-los que presidam as eleições é um erro que pode ser fatal. 

Disputar as eleições presididas por uma Junta de Salvação Nacional é outra coisa. Estaremos todos em igualdade de condições, militares e civis, a ver quem tem mais voto.

Os generais de duplo salário e recebendo acima do teto são os que realmente governam o país. Bolsonaro faz sua parte, faz o diversionismo. Estão em todos os órgãos da Administração e vão utilizar essa máquina para se reelegerem. O Ministério da Defesa, por exemplo, criado para ser ocupado por civis, só tem generais, nenhum brigadeiro, nenhum almirante e manejam um orçamento de R$ 103 bilhões.

Um governo de Salvação Nacional tem que começar com desmilitarizar o Estado. Mandar os sete mil, ou nove mil, seja lá quantos forem de volta para os quarteis, devolver o Ministério da Defesa para os Civis. Não é tarefa fácil. Mas é a transição que tem que ser feita antes das eleições.

Nas lides políticas, direita e centro continuam a procurar um tercius, um político com condições de fazer frente à bipolarização Lula/Bolsonaro, na realidade, um governo civil ou um governo militar. Essa é a questão. 

Como não entendem a natureza real do dilema, estão como que perdidos. De fato, que alternativas poderá haver para um PSD e mesmo o MDB? Estão encrencados demais por terem se comprometido com o governo da necropolítica econômica.

PSDB Igualmente não se acha, se bem que o FHC está apontando para o bom caminho de formar com a frente democrática para tirar os militares. Tem poucos votos, mas é ainda muito importante, principalmente como formadores de opinião.

O Centrão destituído de visão estratégica, não se preocupa com o país, mas se preocupa com a eleição e os militares, com seus comparsas legisladores, conseguiram fazer mágica com o Orçamento da União e colocar mais de R$ 40 bilhões para gastarem em seus currais eleitorais.

À esquerda está a acontecer movimentos interessantes. Nossa torcida é para que ela deixe de ser uma esquerda neoliberal. Os movimentos tendem a reforçar a frente democrática. 

O deputado federal Marcelo Freixo se desfiliou do Psol para ir para o PSB e o governador do Maranhão Flávio Dino trocou o PCdoB também pelo PSB. É um movimento que tende a fundir esses três partidos em uma nova sigla socialista. Esperamos que seja socialista como alternativa de modelos de gestão econômica e de democracia. Democracia Socialista é participativa diferente da democracia representativa que é excludente.

Por outro lado, o PT ganha elementos novos que poderá vir a ser muito importante na definição ideológica do partido. Me refiro a filiação recente de Vivaldo Barbosa, Leonel Brizola Neto e João Vicente Goulart e outros trabalhistas brizolistas ao PT. 

O PT nasceu com pretensão de ser um partido socialista mas foi dominado pela neoliberalismo dando-lhe feição progressista. Brizola e os pedetistas autênticos concebiam o trabalhismo como via de construção do socialismo. Tal como o concebeu Getúlio Vargas.

É preciso ter uma noção de pátria soberana e uma estratégia de desenvolvimento integral. Sem planejamento não tiraremos o país do buraco em que nos meteram em 40 anos de depressão e retrocesso.

Paulo Cannabrava Filho é jornalista e editor da revista Diálogos do Sul.


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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.
Paulo Cannabrava Filho Iniciou a carreira como repórter no jornal O Tempo, em 1967. Quatro anos depois, integrou a primeira equipe de correspondentes da Agência Prensa Latina. Hoje dirige a revista eletrônica Diálogos do Sul, inspirada no projeto Cadernos do Terceiro Mundo.

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