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Após usar humanos como cobaias na pandemia, Prevent Senior apostou no esporte para limpar imagem

Homicídio doloso, homicídio por omissão, estelionato, falsidade e crimes contra a humanidade. A mesma empresa que deve enfrentar tais acusações no relatório final da CPI é a responsável pela saúde de boa parte dos atletas brasileiros
Lúcio de Castro
Agência Sportlight
Rio de Janeiro (RJ)

Tradução:

Homicídio doloso, homicídio por omissão, estelionato, falsidade e crimes contra a humanidade. A mesma empresa que deve enfrentar tais acusações no relatório final da CPI da Pandemia é a responsável pela saúde de boa parte dos atletas brasileiros.

Depois de realizar experiências com pacientes do plano de saúde utilizando remédios sem consentimento dos pacientes e sem comprovação científica de eficácia como a hidroxicloroquina e azitromicina associadas para tratar a Covid-19, a Prevent Senior iniciou um outro projeto: o desenvolvimento de protocolo de atendimentos para esportistas de alto rendimento através do patrocínio de confederações, clubes e modalidades.

Os estudos com pacientes estão no alvo de investigação da CPI da Pandemia, onde um dossiê produzido por ex-médicos da Prevent citou que 630 atendidos foram transformados em “cobaias humanas” entre março e abril de 2020, como está no relatório. Pedro Batista, diretor da Prevent, refutou a acusação de “cobaias humanas”, afirmando que não era feitos testes mas se “observava o ato médico”.  A empresa é investigada ainda por ter ocultado a morte de participantes.

Já o projeto de atendimento de atletas envolve cerca de 2.500 atletas, de distintas modalidades. De acordo com a empresa, não envolve pagamento e sim acordos de atendimentos médicos.

Sem ter um CNPJ próprio, um braço da empresa foi criado para desenvolver o projeto, a Prevent Senior Sports. O plano foi lançado em janeiro. A equipe de e-sports Black Dragons foi a primeira, no dia 15 e logo depois, no dia 29 veio a parceria com o São Paulo/Barueri.

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No dia 24 de março desse ano foi aberta a primeira investigação contra a empresa pelo Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP). No entanto, as possibilidades de sofrer uma investigação com danos a imagem da empresa eram plausíveis desde o início da pandemia:

Três inquéritos chegaram a ser instaurados no MPSP anteriormente mas arquivados por procuradores do órgão. Um deles, um ano antes, em março de 2020, ainda início da pandemia, após inspeção epidemiológica da secretaria municipal de saúde, que já citava a subnotificação por covid no Hospital Sancta Maggiore, pertencente ao plano da Prevent Senior. A solicitação da secretaria não foi acatada pelo promotor Cássio Roberto Conserino, o mesmo que ganhou breves holofotes ao formalizar pedido de prisão do ex-presidente Lula, negado pelo judiciário paulista.

Foi depois das primeiras denúncias que a expansão da Prevent Senior no esporte se intensificou. No dia 21 de abril, foi anunciada parceria com o Comitê Olímpico Brasileiro (COB). No dia seguinte, 22, com a Confederação Brasileira de Atletismo (CBAt) e dia 23, com a categoria de automobilismo Stock Car. Em 12 de maio, foi a vez da Confederação Brasileira de Ginástica (CBG) assinar acordo. No dia 2 de junho o Vôlei Guarulhos assinou e quinze dias depois, 17, o Vôlei Brasília. As duas confederações escolhidas são as mesmas patrocinadas também pela Caixa Econômica Federal.

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No dia 20 de agosto, a organização da fórmula um no Brasil anunciou que a Prevent Senior seria a responsável pelo atendimento médico no GP Brasil, dia 14 de novembro, em Interlagos (SP). O contrato envolve todo o atendimento médico dos pilotos e do staff envolvido na organização da prova. Em casos de acidentes, responde também pela remoção aérea de feridos, que serão atendidos no Sancta Maggiore Dubai, na zona sul de São Paulo.

Na fórmula um, o tiro da melhoria da imagem pelo esporte pode sair pela culatra. O acordo da categoria mais nobre do automobilismo com a Prevent Senior anuncia encontro marcado entre um dos personagens do esporte que mais tem se manifestado por direitos e por causas sociais e a operadora denunciada por descaso. O campeão Lewis Hamilton chegou inclusive a manifestar seu desconforto com os rumos da pandemia no Brasil no dia 13 de abril, ao expressar que estava “muito triste em saber que o Brasil está sendo atingido tão gravemente por esta pandemia. Meus pensamentos e orações estão com o povo brasileiro e seus familiares que estão sofrendo agora. Pensando em vocês hoje”.

A reportagem questionou a empresa sobre o investimento em esporte ser parte de uma estratégia de melhoria da imagem. O esporte, em larga escala ao redor do mundo, tem sido utilizado em duas possibilidades de lavagem: de dinheiro e de imagem. Diante das datas de anúncio de parcerias e cruzamento com eclosão dos escândalos, a reportagem perguntou sobre a segunda possibilidade, a de lavagem da imagem através do esporte, artifício conhecido ao redor do mundo como “sportswashing”. A empresa negou. “Não. Todos foram feitos antes de a Prevent ser citada na CPI. O programa surgiu no início do ano” (ver íntegra das respostas ao fim em “outro lado”). No entanto, antes da CPI já existiam investigações, como as do MPSP.

Homicídio doloso, homicídio por omissão, estelionato, falsidade e crimes contra a humanidade. A mesma empresa que deve enfrentar tais acusações no relatório final da CPI é a responsável pela saúde de boa parte dos atletas brasileiros

Divulgação
Seleção feminina de vôlei fez o teste de Covid-19 com a Prevent Sports.

Cronologia

26 de março de 2020 – Sem autorização do Conep (Comissão Nacional de Ética em Pesquisa), ligado ao Conselho Nacional de Saúde (CNS), a Prevent Senior inicia o estudo de “tratamento precoce” com o “kit covid”.

31 de março de 2020 – A Prevent Senior sofre seu 1º dano na imagem quando o ex-ministro da saúde, Luiz Henrique Mandetta, cita o hospital Sancta Maggiore como o de mais alto índice de óbitos

Março de 2020 – O MPSP recebe da secretaria de saúde de SP pedido de instauração de inquérito da Prevent Senior pela atuação na incipiente pandemia. Mais 3 inquéritos foram arquivados pelo MPSP em 2020.

15 de janeiro de 2021 – parceria com o Black Dragons (e-sports)

29 de janeiro de 2021 – parceria com o São Paulo/Barueri.

24 de março de 2021 – investigação é aberta no MPSP

21 de abril de 2021 – parceria com o COB

22 de abril de 2021– parceria com a CBAt

23 de abril de 2021– parceria com a Stock Car

12 de junho de 2021- parceria com a CBG

2 de junho de 2021- parceria com o Vôlei Guarulhos

17 de junho de 2021- parceria com o Vôlei Brasília

20 de agosto de 2021 – parceria com a Fórmula Um para atendimento no GP Brasil

28 de setembro de 2021- representando 12 médicos que trabalharam na Prevent Senior, a advogada Bruna Morato vai a CPI e afirma que a empresa se uniu a “gabinete paralelo e intimidou médicos a usar o kit covid”

Feito em abril, o acordo da Prevent Senior com o COB incluiu a testagem de todos os atletas brasileiros que foram para as olimpíadas de Tóquio. Com duração até 2024, passando por toda a preparação para os jogos de Paris e a competição. Na união entre uma instituição que teve recentemente seus dirigentes investigados e presos por corrupção e um plano de saúde denunciado por usar pacientes como cobaias humanas, os planos são altos e ambiciosos.

Nada menos do que “uma revolução no esporte brasileiro”. É o que foi dito na conversa transmitida pela internet entre uma representante do COB e o médico Álvaro Razuk, diretor executivo do “Instituto de Ensino e Pesquisa Prevent Senior”, diretor médico do hospital Sancta Maggiore e diretor e responsável pelo Prevent Senior Sports.

Apresentação da parceria com o COB é roteiro de “Sportwashing”: Valores morais da Prevent Senior foram exaltados

Assinado o acordo em 21 de abril, a parceira foi celebrada em live. Logo na apresentação, a representante do COB exaltou o médico:

“Nosso parceiro, como a gente gosta de dizer desde sempre, que vai revolucionar o movimento olímpico do Brasil.”

O executivo e médico não fez por menos.

“Muito contente em fazer parte de um projeto que, mudará a forma de cuidar da saude dos atletas brasileiros”

Em meio a tormenta que se abate sobre a empresa, a conversa girou sobre valores morais e olímpicos.

Luis Nassif | Prevent Senior: entenda o xadrez da guerra comercial dos planos de saúde

“O cuidado, a empatia, o respeito com as pessoas é muito grande. a gente quer sempre oferecer o melhor. nosso objetivo é dar o máximo de segurança e acolhimento com nossos pacientes”

“Como os valores olímpicos e os da Prevent Senior se conversam”?, quis saber o COB.

Resposta do médico da Prevent Senior:

“Você imagina que nós somos uma empresa de saúde. Então, como uma empresa de saúde, o cuidado, a empatia, o respeito com as pessoas é muito grande. A gente quer sempre oferecer o melhor. Nosso objetivo, é dar o máximo de segurança e acolhimento com nossos pacientes.”

As estratégias de melhoria da imagem vão além da utilização do esporte. No último dia 27 de agosto, de acordo com registros na junta comercial de São Paulo, uma assembleia da Prevent Senior Participações S.A., braço do plano de saúde para holdings de instituições não financeiras, modificou o nome para PJML Participações. Além das demais questões, a reportagem perguntou sobre tal fato mas esse item não foi respondido.

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Outro lado:

Prevent Senior:

1- Nos último meses, o braço esportivo da empresa fechou patrocínios e acordos significativos com entidades e instituições do esporte, como Black Dragons (e-sports), COB, CBAT, CBG, Volei Brasilia, Volei Guarulhos, Casa do Atleta, Stock Car, São Paulo F.C./Barueri e com o serviço médico do GP Brasil de F1. Qual é o investimento total do Prevent Senior Sports e razão por tal estratégia?

R- A Prevent Sports é um programa único no País em medicina e tecnologia do esporte. É uma iniciativa que inclui patrocínio a times e equipes sem o repasse direto de recursos, uma vez que a contrapartida é a atenção integral à saúde dos atletas. São cerca de 2.500 mil atletas atendidos nas mais diversas modalidades. A meta é desenvolver, para cada um deles, programas de saúde que focam no bem-estar, aumento do desempenho e envelhecimento saudável ao longo da carreira. E criar programas de atendimento que possam ser usados também pelos beneficiários não-atletas. A Prevent Senior não permitirá que denúncias infundadas afetem o programa, que tem como um dos principais objetivos atender atletas de base. Importante lembrar que o programa realizou os cerca de 3 mil testes de todos os 234 atletas e demais membros da delegação que foram a Tóquio, onde não houve caso algum de Covid. Em outros termos, o Time Brasil não levou um vírus ao Japão. Sobre os investimentos, não é uma conta exata, porque os investimentos dependem de uma série de fatores, como uso dos planos de saúde. Mas pode-se falar em R$ 250 milhões investidos até agora.

2- Em confederações como CBG e CBAT, foi divulgado que o acordo envolvia valores. Em todos os acordos tal patrocínio envolve pagamentos por parte da empresa ou em algum caso é somente apoio?

R- Sem valores. Somente estimativas calculadas com base nos possíveis atendimentos, como na resposta anterior.

3- Boa parte desses acertos foram feitos já após a eclosão do caso investigado na CPI da Pandemia. O patrocínio esportivo tem a ver com uma estratégia de melhora de imagem?

R- Não. Todos foram feitos antes de a Prevent ser citada na CPI. O programa surgiu no início do ano.

4- O Dr Álvaro Razuk, diretor-executivo da Prevent Senior e responsável pela Prevent Senior Sports, participou da formulação de estratégias de enfrentamento ao corona virus e da opção por receitar o chamado “atendimento precoce com o Kit Covid” da empresa?

R- Negativo, porque não houve uma estratégia da empresa neste sentido. Os médicos tiveram autonomia para prescrever ou não medicamentos que julgassem necessários. O dr. Álvaro não atuou diretamente na linha de frente da Covid. (Nota da reportagem: Na CPI, a advogada Bruna Morato exibiu mensagens da direção da empresa mostrando que a utilização do Kit Covid teria sido uma imposição).

COB:

A reportagem enviou questões ao COB sobre a parceria em meio a eclosão do escândalo envolvendo a patrocinadora Prevent Senior. Resposta do comitê:

R- “O COB acompanha com atenção e preocupação as apurações do Senado Federal e tem mantido conversas periódicas com representantes da empresa para garantir que os atletas do Time Brasil tenham o melhor atendimento médico disponível”.

Fórmula Um:

A reportagem enviou pedido de comentário para a assessoria da modalidade sobre o acordo com patrocinadora envolvida nas denúncias da CPI da Pandemia mas não houve resposta.

*Nota da reportagem: às 19h06 de 12/10, a “cronologia” foi corrigida e onde estava “médica Bruna Morato”, foi modificado para o correto, “advogada”, como estava corretamente na outra nota do autor, em “outro lado”.


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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Lúcio de Castro

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