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Em carta, jornalistas da Folha repudiam publicações racistas do veículo em busca de audiência

Profissionais apontam que prática não condiz com discurso de defesa da democracia do jornal e questionam falta de ética na busca por engajamento nas redes
Guilherme Ribeiro
Diálogos do Sul Global
Bauru (SP)

Tradução:

Um grupo de 186 jornalistas da Folha de São Paulo assinou uma carta aberta repudiando as recorrentes publicações racistas realizadas pelo veículo. 

A nota chega após a veiculação do artigo “Racismo de negros contra brancos ganha força com identitarismo” de Antônio Risério, que defende a absurda ideia de racismo reverso.

Profissionais apontam que prática não condiz com discurso de defesa da democracia do jornal e questionam falta de ética na busca por engajamento nas redes

Wikimedia Commons
"O racismo é um fato concreto da realidade brasileira, e a Folha contribui para a sua manutenção".

A carta, direcionada à direção da Folha, menciona outros jornalistas autores de textos polêmicos, como Leandro Narloch e Demétrio Magnoli, e questiona a busca por audiência e engajamento da população negra com base em controvérsias, prática que vai na contramão da defesa da democracia e do pluralismo exortada pelo jornal, bem como da liberdade de expressão:

“No entanto estes não se dissociam de outros valores que o jornalismo deve defender, como a verdade e o respeito à dignidade humana. A Folha não costuma publicar conteúdos que relativizam o Holocausto, nem dá voz a apologistas da ditadura, terraplanistas e representantes do movimento antivacina. Por que, então, a prática seria outra quando o tema é o racismo no Brasil?”, questionam na carta.

Essa não é a primeira vez que os próprios colaboradores da Folha agem contra sua conduta racista. Em outubro do ano passado, a filósofa e escritora Sueli Carneiro pediu desligamento do conselho editorial do veículo dias após a publicação do texto “Luxo e riqueza das ‘sinhás pretas’ precisam inspirar o movimento negro”, de Leandro Narloch. Nele, o “jornalista” relativiza a escravidão, o assassinato e o estupro de mulheres negras dizendo para que “olhem para o lado bom: meia dúzia de sinhás ascenderam socialmente dentro desse sistema”.

Leia a carta na íntegra:

Carta aberta de jornalistas da Folha à direção do jornal Caros membros da Secretaria de Redação e do Conselho Editorial da Folha, Nós, jornalistas da Folha aqui subscritos, vimos por meio desta carta expressar nossa preocupação com a publicação recorrente de conteúdos racistas nas páginas do jornal.

Sabemos ser incomum que jornalistas se manifestem sobre decisões editoriais da chefia, mas, se o fazemos neste momento, é por entender que o tema tenha repercussões importantes para funcionários e leitores do jornal e no intuito de contribuir para uma Folha mais plural.

O episódio a motivar esta carta foi a publicação de artigo de opinião intitulado “Racismo de negros contra brancos ganha força com identitarismo” (Ilustrada Ilustríssima, 16/1), em que Antonio Risério identifica supostos excessos das lutas identitárias, que estariam levando a racismo reverso.

Para além de reafirmarmos a obviedade de que racismo reverso não existe, não pretendemos aqui rebater o que afirma o autor —pessoas mais qualificadas do que nós no tema já o fizeram, dentro e fora do jornal.

No entanto, manifestamos nosso descontentamento com o padrão que vem se repetindo nos últimos meses.

Em mais de uma ocasião recente, a Folha publicou artigos de opinião ou colunas que, amparados em falácias e distorções, negam ou relativizam o caráter estrutural do racismo na sociedade brasileira. Esses textos incendeiam de imediato as redes sociais, entrando para a lista de mais lidos no site. A seguir, réplicas e tréplicas surgem, multiplicando a audiência. A controvérsia então se estanca e morre, até que um novo episódio semelhante surja.

Antes do artigo em questão, colunas de Leandro Narloch e Demétrio Magnoli cumpriram esse papel. Acreditamos que esse padrão seja nocivo. O racismo é um fato concreto da realidade brasileira, e a Folha contribui para a sua manutenção ao dar espaço e credibilidade a discursos que minimizam sua importância. Dessa forma, vai na contramão de esforços importantes para enfrentar o racismo institucional dentro do próprio jornal, como o programa de treinamento exclusivo para negros.

Reconhecemos o pluralismo que está na base dos princípios editoriais da Folha e a defesa que nela se faz da liberdade de expressão.

No entanto estes não se dissociam de outros valores que o jornalismo deve defender, como a verdade e o respeito à dignidade humana. A Folha não costuma publicar conteúdos que relativizam o Holocausto, nem dá voz a apologistas da ditadura, terraplanistas e representantes do movimento antivacina.

Por que, então, a prática seria outra quando o tema é o racismo no Brasil?

Se textos como o de Antonio Risério atraem audiência no curto prazo, sua consequência seguinte é minar a credibilidade, que é, e deve ser, o pilar máximo de um jornal como a Folha.

Por esses motivos, convidamos a uma reflexão e uma reavaliação sobre a forma como o racismo tem sido abordado na Folha. Acreditamos que buscar audiência às expensas da população negra seja incompatível com estar a serviço da democracia.

Assinam esta carta:

Adriana Mattos
Adriano Vizoni
Alfredo Henrique
Aline Mazzo
Amanda Lemos
Amon Borges
Ana Bottallo
Ana Luiza Albuquerque
Andre Marcondes
Andressa Motter
Anelise Gonçalves
Angela Boldrini
Angela Pinho
Anna Virginia Balloussier
Artur Rodrigues
Bárbara Blum
Beatriz Izumino
Bianka Vieira
Bruna Borges
Bruno B. Soraggi
Bruno Benevides
Bruno Molinero
Bruno Rodrigues
Camila Gambirasio
Carolina Daffara
Carolina Linhares
Carolina Moraes
Catarina Ferreira
Catarina Pignato
Clauber Larre
Clayton Castelani
Cristiane Gercina
Cristiano Martins
Cristina Camargo
Cristina Sano
Dani Avelar
Dani Braga
Daniel E. de Castro
Daniel Mariani
Daniel Mobilia
Daniela Arcanjo
Danielle Brant
Danilo Verpa
David Lucena
Débora Melo
Diana Yukari
Eduardo Marini
Eduardo Moura
Emannuel Gonçalves Gomes
Fábio Pupo
Fernanda Brigatti
Fernanda Giulietti
Fernanda Mena
Fernanda Perrin
Flávia Faria
Flávia Mantovani
Gabriel Cabral
Gabriela Bonin
Géssica Brandino
Giovanna Stael
Giuliana de Toledo
Giuliana Miranda
Guilherme Botacini
Guilherme Garcia
Guilherme Seto
Gustavo Fioratti
Gustavo Queirolo
Havolene Valinhos
Heloísa Lisboa
Henrique Santana
Irapuan Campos
Isabela Palhares
Isabella Menon
Jairo Malta
Jéssica Maes
João Gabriel
João Gabriel Telles
João Pedro Pitombo
João Perassolo
osé Marques
Julia Chaib
Karime Xavier
Karina Matias
Kleber Bonjoan
Laíssa Barros
Laura Lewer
Leonardo Diegues
Leonardo Sanchez
Lucas Alonso
Lucas Brêda
Luís Curro
Luiz Antonio Del Tedesco
Maicon Silva
Manoella Smith
Marcelo Azevedo
Marcelo Rocha
Marciana de Barros
Maria Ap. Alves da Silva
Mariana Agunzi
Mariana Arrudas
Mariana Goulart
Mariana Zylberkan
Marília Miragaia
Marina Consiglio
Marina Lourenço
Marlene Bergamo
Mateus Bandeira Vargas
Matheus Moreira
Matheus Rocha
Matheus Teixeira
Mathilde Missioneiro
Maurício Meireles
Mayara Paixão
Melina Cardoso
Mônica Bento
Naná DeLuca
Natália Cancian
Natália Silva
Nathalia Durval
Nicollas Witzel
Otavio Valle
Paola Ferreira Rosa
Patricia Pamplona
Paula Soprana
Paulo Batistella
Paulo Saldaña
Pedro Ladeira
Pedro Lovisi
Phillippe Watanabe
Priscila Camazano
Ranier Bragon
Raphael Hernandes
Raquel Lopes
Rebeca Oliveira
Regiane Soares
Renan Marra
Renata Galf
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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Guilherme Ribeiro Jornalista graduado pela Unesp, estudante de Banco de Dados pela Fatec e colaborador na Revista Diálogos do Sul Global. Mais conteúdos em guilhermeribeiroportfolio.com

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