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ToggleResultados do Censo divulgado nesses dias pelo IBGE mostram que a população diminuiu em relação às estimativas dos estatísticos. Frustrando uma previsão de 214 milhões de pessoas, foram registradas 203 milhões, um crescimento de 0,52%, pela primeira vez abaixo de 1%, a menor taxa nos 150 anos de história do órgão.
O Censo mostra um povo envelhecendo, com a população economicamente ativa diminuindo por falta de reposição pelos mais jovens. Em outras palavras, faltam jovens e falta vontade de constituir família, o que é muito grave para as pretensões de retomada do desenvolvimento.
Outro fato que se observa é que os velhos estão servindo de arrimo de família. A aposentadoria e pensão dos idosos garante a sobrevivência. Filhos que viviam sozinhos e mesmo os já constituídos em matrimônio estão voltando a viver com seus pais, maneira de dividir os gastos nessa época de crise sistêmica.
Isso decorre da natureza injusta do capitalismo selvagem resultante do pensamento único imposto pelo capital financeiro, a dominar a mídia e inclusive as universidades. Retomar o pensamento crítico é fundamental para a necessária retomada do desenvolvimento.
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Desenvolvimento requer gente e gente qualificada. Este é o grande desafio. Recuperar o atraso a que foi relegado o sistema de educação vitimando a juventude, ou seja, o futuro da nação.
Isso se vê com a quantidade de jovens perfilando as filas dos Nem Nem: 49 milhões na faixa etária de 15 a 29 anos, 20% da população jovem, nem estuda, nem trabalha. Grande parte deixou de estudar por estar desempregada.
A má educação reflete na má qualidade de vida. A juventude está ficando obesa, devido a má alimentação e maus hábitos. Como não temos escolas de tempo integral, as crianças se alimentam mal, e induzidas pela propaganda e falta de dinheiro, comem porcarias industrializadas e não fazem atividade física. O índice de jovens obesos saltou de 9% para 17,1%, aumento de 90%.
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A má educação reflete também na produtividade do trabalho. Entre 64 países pesquisados, o Brasil está na 61º posição, entre os piores do mundo.
A escola idealizada pelos nossos mestres, como Anísio Teixeira, Darcy Ribeiro e Paulo Freire, é de tempo integral, oferece três ou quatro refeições diárias, assistência médica e dentária, esporte, artes, lazer e acompanhamento no estudo das diversas disciplinas.
O que estão fazendo com nossa juventude é nada menos que um verdadeiro genocídio, pois os Nem Nem, analfabetos funcionais em grau máximo, estão socialmente mortos. 9 milhões com mais de 15 anos são totalmente analfabetos, dos quais o número de negros é o dobro em relação aos brancos.
O Censo Escolar de Educação Básica de 2022 aponta que 1,04 milhão de estudantes dos 4 aos 17 anos estavam fora da escola. Os maiores níveis se concentram entre crianças dessa faixa etária, com expressiva evasão na adolescência.
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4 anos: 399.290
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de 5 a 6 anos: 151.985
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de 14 a 16 anos: 250.497
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17 anos: 241.641
Segundo Gabriel Salgado, coordenador de Educação do Instituto Alana, o problema da evasão escolar mostra uma fragilidade do Estado na tarefa de garantir vaga à população, sobretudo às parcelas mais vulneráveis. Além disso, destaca que da população de 4 e 5 anos fora da escola, a maior taxa se encontra nas regiões Norte e Centro-Oeste, proporcionalmente, e nas áreas rurais. (Carta Capital 9/3/23, reportagem de Ana Luiza Basilio: https://www.cartacapital.com.br/educacao/os-desafios-para-reinserir-um-milhao-de-criancas-e-adolescentes-nas-escolas)
Para além da falta de vagas, um dos principais obstáculos é a pobreza. Dados da pesquisa da Unicef “As Múltiplas Dimensões da Pobreza na Infância e na Adolescência no Brasil”, divulgada em fevereiro, mostram que em 2019 ao menos 32 milhões de meninos e meninas (63% do total) viviam na pobreza em suas múltiplas dimensões, a englobar renda, educação, trabalho infantil, moradia, água, saneamento e informação. No caso específico da educação, o quadro piorou com a pandemia e a desigualdade de acesso pelos estudantes às atividades escolares, ministradas à distância. Em 2022, o índice de crianças privadas do direito à alfabetização subiu em relação a 2020, passando de 1,9% para 3,8%. A privação da alfabetização afetou principalmente crianças e adolescentes negros e indígenas, das regiões Norte e Nordeste.
Efeitos da pandemia a partir de 2020 foram desastrosos. Pesquisa do Ipec para a Unicef, em agosto de 2022, revela que 2 milhões de meninas e meninos de 11 a 19 anos que não haviam terminado a educação básica deixaram a escola. Eles representam 11% do total da amostra pesquisada.
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A pesquisa ouviu crianças de todas as regiões do país, e mostra que a exclusão afeta principalmente os mais vulneráveis. No total, 11% dos entrevistados não estavam frequentando a escola, sendo que na classe AB o percentual é de 4%, enquanto na DE chega a 17%. A maioria (48%) deixou de estudar “porque tinha que trabalhar”; ou porque “não conseguiram acompanhar as explicações ou atividades” (30%); desistiram porque “a escola não tinha retornado atividades presenciais” (29%); porque “tinham que cuidar de familiares (28%); por “falta de transporte (18%); “gravidez” (14%); “deficiência” não compreendida (9%); por “racismo” (6%); entre outros. (https://www.unicef.org/brazil/comunicados-de-imprensa/dois-milhoes-de-criancas-e-adolescentes-de-11-a-19-anos-nao-estao-frequentando-a-escola-no-brasil)
Foto: Valter Campanato/Agência Brasil
7 crianças e adolescentes foram assassinados a cada dia em 2021, 2.555 casos (83%) crianças negras
Delinquência infantil e juvenil
Esse panorama mostra que o que já era ruim antes da pandemia ficou pior, e que fica difícil distinguir o que fez mais dano a nossa juventude, se a pandemia ou os seis anos de desgoverno, com desmontagem do Estado a partir do golpe parlamentar que depôs a presidenta Dilma Rousseff em 2016.
O jovem “Nem Nem” é quase sempre sem família ou de família desagregada, seja por alguém estar preso, seja por abandono ou separação. É frequentemente aliciado pelo crime organizado. Olheiros e passadores prestam serviço desde a mais tenra idade.
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A constituição de 88 privilegia a criança e o adolescente e foi regulamentada com o Estatuto da Criança e do Adolescente. Mas no Brasil a lei é só para privilegiados. O jovem delinquente é tratado pela polícia como são tratados os infratores independentemente de idade, mas relacionado com classe social e cor da pele. Sofre abusos, maus tratos, tortura nas mãos da polícia, e pior quando da polícia militar.
Para o jovem, julgado e mesmo sem ser julgado, a pena é o internamento nas unidades socioeducativas, a maioria verdadeiras escolas para o crime organizado.
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Houve aumento da delinquência a partir dos anos 1980-1990, anos de neoliberalismo, governos de desmontagem das políticas públicas de alcance social, com abandono de setores cruciais como educação e emprego.
Em 2002 havia 9.555 adolescentes internos nas unidades socioeducativas; em 2006 já eram 14.974; em 2018, 25.084; em 2021, 13.884, segundo aponta o Anuário Brasileiro de Segurança Pública. Houve uma redução de 45,5% para meninos e de 44,7% para meninas.
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Essa redução se deve, certamente, mais às políticas de isolamento e resguardo, por conta da proteção à pandemia da Covid 19, que às políticas públicas inclusivas que deixaram de existir após o golpe de 2014 e a farsa eleitoral de 2018. Em contraste, 7 crianças e adolescentes foram assassinados a cada dia em 2021, 2.555 casos (83%) crianças negras.
Problema dos mais graves não resolvido que só se resolve com boa educação. Não desaparece totalmente porque é da índole humana, mas se reduz a índices civilizados.
O desafio é enorme. Mas as soluções estão dadas na teoria e na prática dos nossos grandes mestres da educação. Nada a inventar. Basta seguir os ensinamentos teóricos e as práticas realizadas.
Paulo Cannabrava Filho, jornalista editor da Diálogos do Sul e escritor.
É autor de uma vintena de livros em vários idiomas, destacamos as seguintes produções:
• A Nova Roma – Como os Estados Unidos se transformam numa Washington Imperial através da exploração da fé religiosa – Appris Editora
• Resistência e Anistia – A História contada por seus protagonistas – Alameda Editorial
• Governabilidade Impossível – Reflexões sobre a partidocracia brasileira – Alameda Editora
• No Olho do Furacão, América Latina nos anos 1960-70 – Cortez Editora
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