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Cannabrava | “O Brasil é um só povo”

Atual confronto vai além das disputas eleitorais: é sobre modelos, uma questão de recuperar a soberania nacional
Paulo Cannabrava Filho
Diálogos do Sul Global
São Paulo (SP)

Tradução:

A campanha “O Brasil é um só povo”, lançada em rede nacional dia 10 de dezembro, tem como objetivo a pacificação nacional, reduzir os efeitos da polarização forçada pelo bolsonarismo e os fanáticos neopentecostais.

A campanha deveria mostrar a verdade por trás do confronto, que vai além das disputas eleitorais, pois é um confronto entre modelos. O presidente Lula quer se livrar da ditadura do pensamento único imposto pelo capital financeiro para poder desenvolver o país, reindustrializar, o que o governo chama de neoindustrialização.

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Não obstante, essa ditadura do pensamento único é corroborada pela ditadura da maioria nas duas casas do Legislativo, maior na Câmara dos Deputados – conduzida por Arthur Lira, que controla o Centrão – que no Senado. Só aprovam medidas que favoreçam interesses pessoais dos deputados, pouco importando as necessidades do povo, a soberania nacional violentada. Para aprovar algo de interesse nacional, cobram. Uma verdadeira chantagem por dinheiro.

A campanha de Lula deveria forçar na questão da soberania nacional. A população tem que ter noção sobre as questões relacionadas com a soberania, como a soberania alimentar, por exemplo, que não é só o combate à fome, mas sim a produção de comida saudável para toda a população.

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Está na hora de convocar uma Confecom 2, uma segunda Conferência Nacional de Comunicação, para que a sociedade em todos os níveis, começando do distrital, entenda a questão básica da comunicação como fator de soberania nacional. Entender que a comunicação está servindo de instrumento de alienação e dominação, entender que a comunicação deve conduzir a estratégia de desenvolvimento.

A estratégia de comunicação deve ser transversal a todos os setores da Administração Pública, pois cada ministério tem seu departamento de comunicação e jornalismo, e todos devem estar afinados com a estratégia de comunicação e esta com a estratégia de desenvolvimento.

E o PT tem que entender que a luta de classe só faz sentido se focada numa estratégia de libertação nacional.

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Não se trata de destruir o capitalismo, mas sim de reverter esse capitalismo hegemonizado pelo capital financeiro, capitalismo de especulação, pelo capitalismo de capital produtivo.

Capitalismo produtivo se faz com Estado forte e Projeto Nacional de Desenvolvimento.

Leia também: Cannabrava | O que é melhor para o desenvolvimento do Brasil: Europa ou Brics?

Temos o exemplo do que foi a belle époque do capitalismo europeu que gerou o Estado de Bem-estar Social gerido pela social-democracia. O paraíso durou até que, a partir dos anos 1970, começou a reverter para a hegemonia do capital financeiro, e o que é mais grave, sujeição total ao imperialismo dos Estados Unidos.

A social-democracia precisa voltar às suas origens, mas para isso a Europa precisa de um projeto de libertação nacional que a livre da tutela dos Estados Unidos. Europa está hoje em frangalhos, inclusive as antigas potências coloniais estão no estado de colônia dos Estados Unidos.

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Atual confronto vai além das disputas eleitorais: é sobre modelos, uma questão de recuperar a soberania nacional

Foto: Ricardo Stuckert / PR
É preciso seguir a corrente desenvolvimentista do trabalhismo de Vargas, Goulart, Darcy Ribeiro e Brizola

Tanto lá como aqui, é uma questão de recuperar a soberania nacional.

Temos o exemplo do projeto nacional de Getúlio Vargas, que propunha o trabalhismo como via para o socialismo e deixou um projeto de nação que ainda está à espera para ser executado. Seguir a corrente desenvolvimentista do trabalhismo de Vargas, Goulart, Darcy Ribeiro e Brizola, Desenvolvimento com soberania nacional.

Ditadura da maioria

A Frente Parlamentar da Agropecuária é a mais numerosa do Congresso, com nada menos que 300 deputados, e sempre arrasta consigo outras bancadas conservadoras. Sozinha derrubaria o veto do Executivo à Lei do Marco Temporal. O presidente Lula tinha imposto 47 vetos, os deputados anularam 41 e mantiveram seis. Foi derrubado por 321 contra 137, com votos inclusive de ministro do governo Lula, o titular da Agricultura, Carlos Fávaro (PSD/MT).

Lembremos que em setembro o Supremo Tribunal Federal considerou inconstitucional o Marco Temporal, com o placar de 7 a 2. Para os povos indígenas, o Marco nega a história de extermínio iniciada em 1500. O Conflito entre o Judiciário e o Legislativo está armado e ainda não terminou, o que provoca insegurança jurídica.

Leia também: Cannabrava | Extermínio indígena e destruição da Amazônia têm digital dos militares no Brasil

O essencial da tese dos ruralistas é fazer valer a interpretação de que as demarcações de terra só podem ocorrer em áreas ocupadas na data da promulgação da Constituição, 5 de outubro de 1988.

Essa semana foi aziaga. O Congresso derrubou também o veto do presidente contra a desoneração de 17 setores com capacidade de gerar emprego. Ocorre que nem todas as empresas beneficiadas são qualificadas e, além disso, fere o princípio da isonomia, em que são todos iguais perante a lei.

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O Senado aprovou uma PEC que limita as decisões monocráticas dos supremos ministros e defende a tese de mandado com prazo fixo para os ministros que são vitalícios, ficam no cargo até se aposentar aos 75 anos. Alguém que entra com 50 anos fica 25 anos no cargo.

O conflito entre os poderes está bem claro, notadamente no caso do Marco Temporal. A direta tem maioria, mais da metade dos deputados, correlação de forças que só pode ser enfrentada, segundo Lula, com mobilização de massa, organização e eleição de deputados afinados com o projeto nacional.

Leia também: Cannabrava | Ditadura da maioria trava atuação do Executivo

Parece que agora vai. O Ministério Público do Paraná recomenda a cassação da chapa de Sérgio Moro e seu suplente Luís Felipe Cunha, eleito para o Senado. Argumenta abuso do poder econômico, pede a cassação do mandato e inelegibilidade por oito anos.

O caso terá de ser julgado pelo Tribunal Regional Eleitoral e em última instância pelo Tribunal Superior Eleitoral. Caso sejam punidos o senador e o suplente, terão de ser convocadas novas eleições.

Paulo Cannabrava Filho, jornalista editor da Diálogos do Sul e escritor.
É autor de uma vintena de livros em vários idiomas, destacamos as seguintes produções:
• A Nova Roma – Como os Estados Unidos se transformam numa Washington Imperial através da exploração da fé religiosa – Appris Editora
Resistência e Anistia – A História contada por seus protagonistas – Alameda Editorial
• Governabilidade Impossível – Reflexões sobre a partidocracia brasileira – Alameda Editora
No Olho do Furacão, América Latina nos anos 1960-70 – Cortez Editora

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Paulo Cannabrava Filho Iniciou a carreira como repórter no jornal O Tempo, em 1957. Quatro anos depois, integrou a primeira equipe de correspondentes da Agência Prensa Latina. Hoje dirige a revista eletrônica Diálogos do Sul, inspirada no projeto Cadernos do Terceiro Mundo.

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