Com seu governo enrascado em uma crescente luta com a oposição direitista, que ao ser maioria parlamentar bloqueia substantivas reformas que prometeu impulsionar, o presidente chileno Gabriel Boric assegurou na última quinta-feira (10) que “não vou dar meu braço o torcer para cumprir os anseios e o programa que o povo nos encarregou”.
De surpresa e audazmente, o governante saiu do Palácio de la Moneda (sede do governo) para caminhar até um comício de moradores que a uma centena de metros reclamavam por moradia.
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Misturando-se entre eles, megafone em mão e com escassa escolta policial, o presidente discursou aos manifestantes: “Eu lhes agradeço e valorizo muito a sua organização e lhes digo que é importante que o povo esteja organizado exigindo seus direitos. E isto não são só palavras, nós viemos dos movimentos sociais e não podemos nos esquecer disso”, disse.
“Contem comigo como presidente para seguir conversando sempre, para seguir trabalhando em conjunto e enfrentando juntos as dificuldades que temos, porque este trabalho não é fácil, vocês viram, mas não vou dar meu braço a torcer para cumprir os anseios e o programa que o povo nos encarregou”, agregou.
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Boric: "Há certos setores da política chilena que farão todo o possível para interferir e impedir que o Governo avance com suas reformas"
Déficit habitacional e reformas
No Chile se estima que há um déficit de pelo menos 700 mil moradias e Boric se comprometeu a entregar 260 mil durante os quatro anos de sua presidência e também a aumentar a Pensão Garantida Universal, diminuir as listas de espera nos hospitais públicos e uma substantiva reforma ao sistema de aposentadorias, passando do regime de capitalização individual a um de solidariedade inter geracional.
Para tudo isso se necessitam em torno de 10 bilhões de dólares que teoricamente viriam de uma reforma tributária rechaçada unanimemente pela direita. O governo está insistindo nela agora, reduzindo suas expectativas de arrecadação, mas a direita já antecipou sua negativa.
E enquanto as reformas permanecem estancadas, o clima político se deteriorou substantivamente e a pressão social está latente.
O mais recente desafio de Boric consiste na exigência de que, para qualquer negociação sobre reformas, se desfaça do ministro do Desenvolvimento Social, Giorgio Jackson, seu amigo e camarada de lutas estudantis e políticas, o qual consideram responsável político por uma sequência de corrupções por correligionários de seu partido Revolução Democrática.
Anteontem, o ultradireitista Partido Republicano anunciou que acusará constitucionalmente Jackson para destituí-lo forçosamente e inabilitá-lo politicamente por cinco anos, ao que a direita tradicional anunciou de imediato seu respaldo.
A esse respeito, Boric afirmou que “seria mais transparente dizer que há certos setores da política chilena que farão todo o possível para interferir e impedir que o Governo avance com suas reformas”, desafiando-os “a dizê-lo publicamente, porque convidamos para falar meses atrás e por várias desculpas eles não vêm à mesa, ou quando a reunião está para ser realizada eles simplesmente dizem que não comparecerão 'até que você destitua tal e tal ministro'. Enquanto, isso as pensões ainda estão esperando”.
Aldo Anfosi | La Jornada, especial para Diálogos do Sul – Direitos reservados.
Tradução: Beatriz Cannabrava
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