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Comunidade internacional alerta para ameaças à internet no Brasil

Revista Diálogos do Sul

Tradução:

Manifesto assinado por entidades de 21 países alerta para os riscos de iniciativas governamentais de desmonte do Marco Civil da Internet e do CGI.br

IGF2016Entidades nacionais que atuam no campo da democratização do acesso à internet e na proteção dos direitos dos usuários articularam importante apoio internacional contra os retrocessos que ameaçam o setor no país durante o 11º Fórum de Governança da Internet (IGF): o “Manifesto de Guadalajara pelos Direitos e Governança da Internet no Brasil”. O documento, assinado por mais de 40 entidades internacionais, critica propostas do governo que alteram o Marco Civil da Internet (MCI) e o Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), alentando que “a Internet aberta como a conhecemos está agora em risco”
Organizado pela ONU no início deste mês, no México, o evento reuniu 83 países. O público participante do IGF é formado por representantes da sociedade civil, governo, empresas, setor técnico e academia. Bia Barbosa, secretária-geral do FNDC e integrante do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social, explica que a preocupação da comunidade internacional é um indicativo da gravidade das iniciativas em curso no legislativo brasileiro. “Limitação do acesso à internet, projetos de lei que tentam promover vigilância em massa, que violam a privacidade dos usuários e a liberdade de expressão e iniciativas de modificação do Marco Civil da Internet e do Comitê Gestor da Internet preocupam a comunidade internacional porque o Brasil se tornou referência internacional na agenda de governança da internet, principalmente após a aprovação do Marco Civil e com as experiências de funcionamento bem-sucedidas do CGI.br”, ressalta.
Especificamente com relação ao CGI.br, o manifesto critica a possibilidade de revisão da representatividade e participação da sociedade no espaço. Criado em 1995, o CGI.br tem entre suas atribuições regular atividades na internet, estabelecer diretrizes para o desenvolvimento da rede e registrar todos os sites brasileiros. O comitê é formado por 21 membros, dos quais nove são indicados pelo governo. O restante das vagas é igualmente ocupado por associações da sociedade civil, comunidade científica e representantes de empresas ligadas à internet. As telas têm apenas um representante no comitê, mas têm investido numa maior participação, com aceno positivo de representantes do governo.
Bia, que participou do IGF junto com a coordenadora geral do FNDC, Renata Mielli, também afirma que as ameaças em curso no Brasil não são exclusivamente nacionais. “Infelizmente, o Brasil não está isolado ao promover alterações legais que autorizam vigilância em massa na rede e que deixam nas mãos do mercado o acesso à internet para a população. Propostas que restringem a liberdade de expressão e a construção de mecanismos que violam a liberdade nas redes são desafios que outros países enfrentam também. Por isso foi importante levarmos essa denúncia ao IGF, compartilhando nossa experiência e fortalecendo os laços de solidariedade internacional”, acredita.

Leia o manifesto na íntegra.

Manifesto de Guadalajara pelos Direitos e Governança da Internet no Brasil

Nós, representantes de organizações da sociedade civil de todo o mundo presentes no 11º Fórum de Governança da Internet em Guadalajara, México, nos unimos para expressar nossa preocupação com as mudanças de políticas relacionadas ao acesso, governança e uso da Internet que têm ocorrido no Brasil este ano.
Desde a primeira Cúpula Mundial sobre a Sociedade da Informação (CMSI/WSIS), em 2003, os defensores dos direitos digitais brasileiros têm participado ativamente do debate sobre governança da Internet, pressionando por mais participação e proteção dos direitos humanos no ambiente digital. O Brasil é o único país que acolheu duas edições do IGF (2007 e 2015), mostrando seu apoio à discussão aberta e multissetorial. É lamentável que, no IGF de 2016, a participação do governo brasileiro seja bastante restrita. O país que tem sido um exemplo está agora em risco de enfraquecer suas mais valiosas instituições dedicadas à governança da Internet: o Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) e a lei inovadora aprovada em 2014, o Marco Civil da Internet, ou MCI.
O MCI foi resultado de um longo e democrático processo participativo que teve como objetivo a criação de direitos fundamentais para o uso da Internet. A lei centrou-se na democratização do acesso à Internet, neutralidade da rede, liberdade de expressão, proteção dos dados pessoais e da privacidade. Baseou-se nos 10 Princípios para a Governança e Uso da Internet, promulgados pelo CGI.br em 2009, em um contexto de governança multissetorial.
Devido às recentes mudanças políticas no país, a Internet aberta como a conhecemos está agora em risco. O atual governo, em uma transição de poder questionável, tem sido refratário ao debate democrático, apoiando um corpo conservador de representantes do Congresso que procura agir contra o que o MCI garante em termos de proteção dos direitos fundamentais na Internet. Agora o Congresso está prestes a aprovar uma lei que representará um sério revés nas políticas de telecomunicações e resultará na perda da soberania do Estado sobre as redes de telecomunicações, comprometendo o propósito estabelecido pelo MCI de acesso universal e inclusão digital.
Além disso, o governo federal anunciou que não desenvolverá políticas de acesso à Internet de banda larga e que “o mercado deve promover a expansão por conta própria”. Esse novo paradigma de governança vai contra o atual quadro legal e regulatório do país, que reconhece o papel fundamental do Estado na universalização e democratização do acesso e do conhecimento.
Neste contexto, o governo, em conjunto com a Agência Nacional de Telecomunicações, tem sido permissivo em relação a práticas comerciais discriminatórias, como permitir novos planos com limites de dados, bem como acordos anticoncorrenciais entre grandes provedores de acesso e grandes plataformas de serviços online.
Desde 2015, foram apresentadas mais de duzentas propostas de alterações ao MCI. Muitas delas enfraquecem princípios e direitos fundamentais como a neutralidade da rede, a não responsabilização dos intermediários no provimento de serviços de rede, a proteção de dados pessoais, a privacidade e a liberdade de expressão. Empurrando estas emendas propostas à lei são lobistas de forças políticas conservadoras e autoritárias assim como indústrias cujos interesses privados conflitam com o interesse público.
Agora, em 2016, assistimos a ações políticas do Poder Executivo que ameaçam a governança multissetorial da Internet, mais especificamente o CGI.br. Os representantes do governo declararam abertamente que pretendem rever a representatividade e participação da sociedade civil na comissão.
Vimos também decisões judiciais que determinam a remoção de aplicativos como o WhatsApp, quando a empresa é incapaz de fornecer dados e conteúdo sobre as pessoas investigadas pela polícia ou autoridades de investigação devido ao uso de criptografia. Várias ações judiciais relacionadas a tais derrubadas estão agora pendentes perante o Supremo Tribunal Federal.
Estamos cientes de que a premiada coalizão brasileira chamada “Direitos na Rede” está lutando contra todas essas políticas, legais e regulatórias, e as mudanças que ameaçam os direitos civis. Desejamos conscientizar o mundo sobre estes retrocessos e declarar nosso apoio à Coalizão Direitos na Rede.
Também solicitamos ao governo brasileiro que tome medidas imediatas contra essas tentativas de limitar os direitos e princípios da Internet. Exortamos o governo brasileiro a promover, em vez disso, um ecossistema de Internet vibrante, onde a inclusão digital, os direitos humanos e a governabilidade democrática estejam entre suas mais altas prioridades.

Guadalajara, 5 de dezembro de 2016.

  1. Public Knowledge
  2. Access Now
  3. Electronic Frontier Foundation (International)
  4. Article 19
  5. Association for Progressive Communications (APC)
  6. Asuntos Del Sur
  7. Asociación por los Derechos Civiles (ADC) – Argentina
  8. Center for International Media Assistant (CIMA) – EUA
  9. Tunisian Forum for Economic and Social Rights
  10. Alternatives Forum in Morocco (FMAS)
  11. Solidarius – Itália
  12. IPANDETEC – Panamá
  13. Datos Protegidos – Chile
  14. Fantsuam Foundation – Nigéria
  15. Media reseauforum.org – Québec, Canadá
  16. Women’s Net – África do Sul
  17. R3D – Red en Defensa de los Derechos Digitales – México
  18. EngageMedia – Austrália
  19. Centre for Internet and Society (CIS) – Índia
  20. Alternative Informatics – Turquia (Alternatif Bilisim)
  21. Altercarto – Les Mondes de la Terre – França
  22. Cartographie Citoyenne – Tunísia
  23. epicenter.works – Áustria
  24. GreenNet – Reino Unido
  25. Panoptykon Foundation – Polônia
  26. IT for Change – Índia
  27. Just Net Coalition
  28. SonTusDatos (Artículo 12, A.C.) – México
  29. ALAI – Agencia Latinoamericana de Información
  30. Asociación Centro Civitas – Guatemala
  31. Fundacion Karisma – Colômbia
  32. E-joussour, portal for civil society of Maghreb/Machrek
  33. Alternatives – Québec, Canadá
  34. One World Platform – Bósnia e Herzegovina
  35. Turkey Blocks
  36. Socialtic – México
  37. Ritimo – França
  38. Centro de Estudios Históricos Arturo Jauretche (CEHAJ) – Argentina
  39. Australian Privacy Foundation – Austrália
  40. Derechos Digitales – Chile
  41. TEDIC – Paraguai


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

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