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Conheça 10 filmes disponíveis online para se compreender a ditadura brasileira

Confira as produções que abordam a consolidação do golpe em curtas e longas-metragens filmados durante e depois do regime
Pamela Oliveira
Brasil de Fato
São Paulo

Tradução:

Há 55 anos um golpe militar interrompia o mandato presidencial e democrático de João Goulart. A ditadura instaurada no dia 31 de março de 1964 durou 21 anos e, apesar de guiada pelas Forças Armadas, só se tornou possível pelo apoio de grande parte do empresariado brasileiro, de latifundiários e também devido ao encorajamento do governo dos Estados Unidos. 

O golpe de Estado veio para atender aos interesses das elites econômicas, que se opunham às reformas de Base propostas pelo então presidente Jango, explicitando um complexo quadro civil-militar para a construção e legitimação do novo regime. De 1964 a 1988, segundo o relatório da Comissão Nacional da Verdade (CNV), somam 434 vítimas fatais da ditadura

Para conhecer melhor essa parte da história do país, o  Brasil de Fato separou 10 filmes sobre o tema para reavivar a memória sobre o período. A seleção de documentários contempla produções que abordam a consolidação do golpe, a resistência, a violência, a censura, os exílios forçados e a estrutura política e econômica do período, em curtas e longas-metragens filmados durante e depois do regime.

Confira as produções que abordam a consolidação do golpe em curtas e longas-metragens filmados durante e depois do regime

Foto: Evandro Teixeira
A ditadura instaurada no dia 31 de março de 1964 durou 21 anos e foi responsável pela morte de ao menos 434 pessoas.

1. Vala Comum (1994) – João Godoy – 33 min

Uma das ações mais comuns realizada pelos órgãos de repressão do governo era a de ocultação de cadáveres. Para isso, cemitérios periféricos de grandes centros urbanos recebiam os corpos das vítimas, que eram enterradas em valas comuns como indigentes.

“Vala Comum” vai documentar justamente a remoção de mais de mil ossadas encontradas em uma vala clandestina no Cemitério Dom Bosco, em Perus, na zona norte da cidade de São Paulo (SP). A princípio, supunha-se que seis desaparecidos durante o período estariam enterrados nesta vala. Porém, a exumação apontou indícios de outros presos políticos.

João Godoy apresenta o depoimento de familiares de vítimas de desaparecimento forçado e recupera arquivos e imagens do regime ditatorial. O filme foi premiado diversas vezes, tendo recebido o prêmio de Melhor Filme em 16mm no Festival de Brasília (1994) e Melhor Documentário no Festival de Bilbao (1995), na Espanha.

2. Você também pode dar um presunto legal (1974) – Sérgio Muniz – 39 min

Uma das ações extra-oficiais da polícia militar era por meio dos chamados “esquadrões da morte”. Instrumentos de “controle do crime”, formados por policiais de distintas patentes, que agiam majoritariamente em periferias de centros urbanos, exterminando arruaceiros, ladrões, estupradores e outras pessoas consideradas “um problema” para a sociedade.

Em São Paulo, o esquadrão ficava sob o comando do delegado Sérgio Paranhos Fleury, conhecido como o responsável por levar o método de extermínio para as ações de combate aos grupos de resistência.

Sérgio Muniz, em meio à ditadura, produz um documentário que denuncia a ação desses grupos de extermínio, que assassinavam majoritariamente homens pobres e negros. Na época, o filme não foi exibido no Brasil por receio de perseguições. A versão disponível é uma reedição de 2006.

3. Eunice, Clarice, Tereza (1979) – Jonatan Vilela Berbel – 16 min

Também produzido durante o período ditatorial, filmado sob ameaças de censura e perseguição política, “Eunice, Clarice, Tereza” é um documentário com três mulheres que relatam a prisão e a morte de seus respectivos maridos por agentes do DOI-CODI, centro de torturas do regime.

Eunice Paiva comenta a prisão do ex-deputado Rubem Paiva, cuja morte foi confirmada apenas 40 anos depois pela CNV. Clarice Herzog descreve como se deu o caso do jornalista Vladimir Herzog, o Vlado, cuja morte foi encoberta por uma falsa versão de suicídio. E, por fim, o depoimento de Tereza Fiel, viúva do metalúrgico Manuel Fiel Filho, preso por ser acusado de receber clandestinamente exemplares do jornal a Voz do Operário.

Na época, o documentário foi exibido em sindicatos, cineclubes e entre movimentos populares, e utilizado como instrumento de mobilização contra o regime.

4. Cidadão Boiselen (2009) – Chaim Lotewski – 93 min

Os anos de chumbo foram amplamente apoiados e patrocinados pelo empresariado brasileiro. Neste filme, Lotewski apresenta as ligações de Henning Albert Boilesen, presidente do grupo Ultra (Ultragaz, Ipiranga e Extrafarma), com o regime militar.

Boiselen foi um civil que teve participação na Operação Bandeirante (Oban), financiando o método “sequestro-tortura-execução” como formas cruéis para combater a “subversão”. Além do levantamento de fundos, o empresário teria assistido voluntariamente sessões de tortura, acompanhando seu amigo pessoal Sérgio Paranhos Fleury.

O documentário traça seu perfil e sua atuação ativa na defesa da repressão violenta à resistência, até seu assassinato em 1971, por uma operação da Ação Libertadora Nacional (ALN).

5. Os dias com ele (2014) – Maria Clara Escobar – 107 min

Com extenso material de arquivo e conversas entre pai e filha, Maria Clara Escobar constrói a história de seu pai, Carlos Henrique Escobar. A perspectiva do filme busca demarcar a ausência do militante no período em que esteve exilado.

Assim como Carlos Henrique Escobar, um intelectual provocativo que foi torturado pelo regime, estima-se que de 5 mil a 10 mil pessoas foram perseguidas e forçadas a deixar o país, entre estudantes, sindicalistas, artistas, militantes, cientistas e militares opositores ao regime.

O sensível documentário trabalha o pessoal e o político, assumindo a postura de preencher lacunas deste período histórico a partir das memórias do pai de Maria Clara.  

6. Memórias femininas na luta contra a Ditadura Militar (2015) – Maria Paula Araújo – 51 min

Fruto do Laboratório de Estudos do Tempo Presente, do departamento de História da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), este documentário recupera vozes femininas que construíram a resistência ao regime militar.

O vídeo, fruto da pesquisa de diferentes mulheres, foi realizado em parceria com a Comissão de Anistia do Ministério da Justiça. A perspectiva de gênero demonstra como o regime impactou a vida das mulheres de uma forma específica em diferentes níveis, com violências de caráter sexual e que atingiam também o corpo e a condição de maternidade.

Além da função de memória, o filme pretende compartilhar com a sociedade as emoções e sentimentos subjetivos que remontam este período histórico violento.

7. Marighella (2012) – Isa Grinspum Ferraz – 100 min

Referência de resistência no Brasil, o negro baiano Carlos Augusto Marighella tem sua história contada neste sensível documentário de Isa Grinspum Ferraz, sobrinha do guerrilheiro fundador da Ação Libertadora Nacional (ALN).

Com espírito transformador, Marighella iniciou sua luta ainda durante o regime autoritário de Getúlio Vargas (1937-1945) e chegou a ser considerado o inimigo número um da ditadura militar.

O longa-metragem é resultado de uma extensa investigação da documentarista, que inicia o filme a partir de sua própria memória quando ainda era criança sobre o assassinato de Marighella em 1969, o “tio querido e proibido, que viveu quase 40 anos clandestino”.

8. O dia que durou 21 anos (2013) – Camilo Tavares – 78 min

Os Estados Unidos (EUA) tiveram papel fundamental na consolidação do golpe de 1964. A ação das Forças Armadas brasileiras foi apoiada pela Casa Branca e também pela agência de inteligência estadunidense, a CIA.

Neste filme, são apresentados documentos históricos e gravações originais que foram mantidos em sigilo e que comprovam o envolvimento norte-americano, com a participação dos presidentes John Kennedy e Lyndon Johnson, na deposição de João Goulart.

O roteirista Camilo Tavares é filho de Flávio Tavares, jornalista guerrilheiro que participou do sequestro do embaixador Charles Elbrick, utilizado como moeda de troca para liberação de presos políticos.

9. O canto da terra (1991) – Paulo Rufino – 44 min

A questão fundiária sofreu fortemente os efeitos do regime. A repressão ditatorial também incluiu a militarização da política indigenista, o que aumentou as mortes por conflitos, as remoções forçadas, as crises de abastecimento, e até epidemias inoculadas propositalmente nas aldeias.

Muitos trabalhadores rurais, em luta pela Reforma Agrária, foram assassinados ou presos. “O canto da terra” é um documentário que recupera o desenvolvimento da concentração econômica e fundiária no Brasil, como heranças da colonização, até a repressão aos movimentos camponeses ativos na ditadura, como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e as Ligas Camponesas.

10. Simonal – Ninguém sabe o duro que dei (2009) – Cláudio Manuel, Micael Langer e Calvito Leal – 84 min

Premiado como Melhor longa-metragem documentário em 2010 pelo Grande Prêmio do Cinema Brasileiro, este filme narra a trajetória de vida de Wilson Simonal.

O ex-cabo do exército se tornou um cantor paulistano de sucesso nos anos 1960, tendo chegado a dividir palco com Sarah Vaughan e ser reconhecido internacionalmente, mas foi condenado ao ostracismo após a acusação de colaborar com o regime militar.

O filme é estruturado por depoimentos de amigos, como Chico Anysio e Nelson Motta, familiares e produtores musicais que acompanharam a carreira de Simonal.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Pamela Oliveira

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