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Contestam acordo petroleiro com a Chevron na Argentina

Revista Diálogos do Sul

Tradução:

arte-al-ataque-ypf-chevron-e1374607861379Se é mau o gringo que nos compra, pior é o nativo que nos vende

Arturo Jauretche

 O acordo YPF-Chevron avança contra os direitos populares sobre os bens comuns e aprofunda a integração dependente do país. Hidrocarbonetos por “fracking”, o combustível do neo-desenvolvimentismo.

O recente acordo do Estado Nacional com a transnacional petroleira de base estadunidense Chevron, para associar-se com a YPF-SA na pesquisa e exploração do petróleo nas jazidas de Vaca Muerta, Neuquén, avaliza a estratégia energética do projeto neodesenvolvimentista. Nesse sentido, o projeto passa a criar as precondições para transformar o território nacional em plataforma de exploração do petróleo  e  converter a Argentina em nação petroleira.

O acordo – cujo conteúdo definido e completo ainda é segredo – vai na contramão dos discursos de soberania nacional agitados pelo governo quando expropriou Repsol do controle da empresa YPF. Através deste acordo parece por de lado a avanço popular que significou a expropriação de YPF em mãos da espanhola Repsol.

Até a saída de Repsol, a estratégia governamental tinha sido manter o esquema de concessões petroleiras ao capital privado criado nos anos 1990. Erroneamente se esperou (por quase dez anos) que essas empresas investissem em ampliar a base de reservas. Ao mesmo tempo o governo decidia manter baixos os preços dos combustíveis ENERSA. O resultado foi o esgotamento das reservas, a multiplicação das importações de combustível e a criação de matriz de geração de energia elétrica (e padrão de consumo) que se apoia cada vez mais no uso de combustíveis fósseis.

Em 2012, com a reestatização parcial da YPF, o kirchenerismo deu um inesperado golpe de direção. A partir dai, a empresa seria a base de uma nova estratégia: converter a Argentina em país exportador líquido de combustíveis a partir da exploração do chamado “gás/petróleo de xisto” com as técnicas da fratura  hidráulica ou “fracking” (1). Esta metodologia extrativa foi proibida em vários países da Europa e projetos desse tipo estão sendo freados nos Estados Unidos e Canadá, por seu elevado custo socioambiental.

Ignorando a realidade das denúncias de organizações socioambientais e a decisão dos povos que votaram contra o uso do fracking (2) o governo avança com esta primeira aliança estratégica. Chevron entra no negócio não só reclamando direito a busca e exploração como também conseguiu um acordo que lhe permite fazer em condições excepcionais, com isenções fiscais multimilionárias, livre utilização de 20% da produção no curto prazo (depois do quinto ano do acordo) e possibilidade de remessa ao exterior de todos os ganhos obtidos. Para cúmulo, o acordo contido no decreto 929/2013, habilita a todas as empresas que já operam no país a avançar nos projetos de pesquisa e exploração com estas técnicas.

Além do neodesenvolvimentismo. Uma política energética para o bom viver

A partir do acordo com Chevron, o projeto aprofunda um padrão periférico de inserção internacional da economia argentina. À “sojasização” e a mineração, agora se agregariam os hidrocarbonetos ao eixo extrativista e de produção para exportação. Uma forma de exploração que não questiona os custos sociais e ambientais. A nação organizada como plataforma de exportação de produtos primário ou manufaturas básicas para benefício das transnacionais e nossos “sócios” comerciais (os velhos, Europa e Estados Unidos, e os novos, Brasil e China).

Diante de tal “destino” que é apresentado como  inexorável mas providencial, é indispensável começar a trilhar um novo caminho que reposicione o país como nação em um projeto popular na Pátria Grande.

Há outras apostas possíveis. Primeiro, a política de hidrocarbonetos deve ser reformulada, avançando na nacionalização das reservas, deslocando progressivamente o capital privado, transnacional e nacional. Isto supõe suspender qualquer nova concessão de prospecção ou produção, ao mesmo tempo que se anulam as existentes, com YPF recuperando o controle destes bens comuns.

Depois, a política energética deve ser reencaminhada em seu conjunto orientando recursos hoje desperdiçados, para uma pesquisa e desenvolvimento local de tecnologias de produção de energia renovável de baixo impacto social e ambiental. Isto supõe estabelecer um caminho para a superação a médio prazo da dependência dos hidrocarbonetos, a energia elétrica e nuclear. Essa reorientação geral da produção de energia pode ser levada por uma nova YPF (transformada em sociedade de gestão popular, no lugar de sociedade anônima) convertida em empresa de produção de energias sustentáveis em articulação com a rede de instituições de Ciência e Tecnologia do Estado.

Terceiro, a mudança na matriz de geração de energia deve ser acompanhada por uma estratégia sustentável de redução do consumo suntuário de energia, voltado a alterar os padrões de consumo e as tecnologias de produção nas empresas. Isto requererá revisar também, entre outras, a política de transporte (para orientá-la definitivamente a favor do transporte público com tecnologias ecologicamente responsáveis) como a política habitacional e infraestrutura urbana com vistas a construir novas formas de vida urbana que respeitem a natureza e promovam o uso racional de energia e dos bens comuns.

Esta estratégia para uma soberania energética e produtiva, só pode ser pensada em um marco de integração continental, com as petroleiras públicas dos países da Alba, pensando em função do bloco regional com os processos de mudanças que estão em marcha  e marcam o caminho em Nossa América.

Definitivamente, diante do acordo de Chevron-YPF, que não é mais que a mais recente expressão da política de neodesenvolvimentismo na periferia, a alternativa é avançar em uma direção que privilegie o bom viver.

(1) Para mais informação sobre a técnica de fratura hidráulica, pode-se consultar o artigo: http://www.opsur.org.ar/blog/2013/07/15/a-proposito-del-acuerdo-ypf-chevron-que-es-el-fracking/

(2)  Segundo o Observatório Petroleiro Sul, em 15 de março o Conselho Municipal de Cinco Saltos ratificou decreto que declara o município de Cinco Saltos (Rio Negro) como livre de fracking. No 26 de abril, o Conselho Deliberativo de Concepción del Uruguay (Entre Ríos) aprovou decreto que declara a localidade “livre de toda prospecção e/ou exploração não convencional de petróleo através de técnica de fratura hidráulica ou fracking”. Outros municípios se declararam livros do fracking, como San Carlos, Tunuyaá, Tupungato e General Alvear (vetadas nos dois últimos) na província de Mendoza; San Jaime de la Frontera, La Paz, Colón, Diamante, Colonia Avellaneda, Rosario de Tala e Villaguay em Entre Ríos. Também existem projetos de decretos para proibir o fracking em Godoy Cruz e Maipú, na província de Mendoza; Los Conquistadores e Concordiaa em Entre Ríos e Viedma na província de Rio Negro.

*Original do Centro de Estudos para Mudança Social (Cecso) do FDS

 


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

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