Um grupo de colombianos que trabalhavam no Brasil deveria embarcar neste sábado, véspera de Dia das Mães, desde o Aeroporto Internacional de Guarulhos rumo a Bogotá, mas está abandonado em meio ao avanço da pandemia de coronavírus.
Cerca de 15 homens, mulheres e crianças se encontravam no Terminal 2 do aeroporto há pelo menos dez dias e foram descartados sem qualquer diálogo ou negociação pela Embaixada e pelo Consulado da Colômbia em São Paulo.
Após muita pressão, o voo foi articulado junto ao governo de Ivan Duque para garantir uma viagem estável, mesmo em meio ao período turbulento.
O que estas pessoas simples não sabiam é que o tal “voo humanitário” só valia para os empresários, a um custo elevado de cerca de R$ 2.700. E mais, que o colombiano que subisse na aeronave ainda teria de pagar o equivalente a outros R$ 3.000 (três mil reais!) para cumprir o período de 15 dias de quarentena em Bogotá. Simples assim.
O problema é que, vindos dos mais diferentes estados do Brasil, eles gastaram todas as suas economias para chegar em Guarulhos. E agora, diante da insensibilidade do governo colombiano, dormindo no chão, passaram a depender exclusivamente da solidariedade de funcionários do aeroporto e de algum passageiro, até mesmo para enganar a fome.
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Grupo de colombianos está há dez dias no Aeroporto Internacional de Guarulhos aguardando o "voo humanitário!
Neste sábado, caía a tarde quando estavam repartindo um “almoço”, comemorado por Juan Camilo Izquierdo como um gol. “Volante de contención”, o meio campista Izquierdo está há uma semana no aeroporto junto do irmão Jhon James, enfrentando as mesmas agruras.
Esportista, treinava no clube de futebol CSA, de Maceió-Alagoas com a esperança de subir na vida para ajudar a família que ficou em Cali. “O fato é que este voo de humanitário não tem nada. É um governo que nos trata de forma desumana, não se importando se somos compatriotas. Mais do que preferência, dão exclusividade aos que têm dinheiro. Muito dinheiro”, relatou Juan Camilo.
“Quando chegamos ao consulado nos disseram de forma curta e grossa: tem dinheiro viaja, se não tem fica. E ficar é dormir no chão, tentar conseguir a comida, lutar por tudo. Lembrando que quando chegar lá tem que pagar mais R$ 3 mil pela quarentena. É um governo que só quer ‘plata, plata e plata’. Dinheiro, dinheiro e dinheiro”, protestou o jovem esportista.
Há mais de dez dias no aeroporto, Maria Victória Carvajal vê sua desesperança aumentar a cada hora que passa. Com a mãe internada numa Unidade de Terapia Intensiva (UTI) da clínica Colômbia, em Cali, ela luta para retornar ao país e ajudar de alguma forma.
Dona de casa, Carvajal e o marido Yeiner Andrés, vendedor de roupa e de tênis, precisaram sair da quitinete onde moravam há dois anos e seis meses em Recife por deverem dois meses de aluguel. Os dois já tinham esgotado as parcas economias. Consultaram o consulado que disse que “com ou sem pandemia”, o problema não era seu.
“O tal voo humanitário saiu rumo a Bogotá cheio de empresários, mas nos disseram que só embarcaríamos com permissão do funcionário, que falou do valor exorbitante. Havia três crianças que conseguimos que fossem abrigadas numa casa. Comovidos, os funcionários do aeroporto nos dão alguma coisa. Hoje um senhor da Espanha se sensibilizou e estamos almoçando agorinha, às 18 horas e 21 minutos. Cozinhamos na intempérie”, descreve Carvajal.
Enquanto colombianos humildes lutam no epicentro da pandemia para conseguir voltar para casa, o consulado está fechado. “Estamos abandonados e enfrentando a gravidade do coronavírus sem ter nem mesmo um teto”, conta a dona de casa.
Luis Afonso Aragón Flores estava há mais de um ano na capital pernambucana vendendo relógio, para conseguir enviar “uns trezentos ou quatrocentos reais” para a mulher e as filhas. A menor delas tem poucos meses e ele só a conhece por foto, que traz bem junto a si. A família é o que lhe anima, lhe enche de energia e confiança, diz, “porque não dá pra desanimar”.
Foi assim que saiu de Arcoverde, há três horas de Recife, rumo à capital paulista e a Guarulhos. “Para chegar até aqui tomei ônibus, mas sobretudo tive de caminhar, foram quatro dias a pé. Ao longo do caminho contei com muita solidariedade, as pessoas se comoviam e davam ajuda para o café, para o pão, para a água nos postos de gasolina. Porque é bom lembrar que estamos no meio do caos com este coronavírus”.
Olha para a foto da família e conta o quanto é difícil ter de se superar. “Na verdade, não estava preparado para esta guerra, mas reúno forças com este grupo que conheci aqui no aeroporto. Estamos juntos há cinco dias que parecem uma eternidade”.
Membro do Coletivo Roda à Palavra Paz, a colombiana Jenny Fonseca está há sete anos no Brasil, terminando nos próximos meses o doutorado em artes visuais na USP, tendo como tema o conflito armado no seu país.
Na sua avaliação, “a falta de diálogo e de informação de parte das autoridades colombianas, somados ao cinismo e à indolência para tratar de qualquer auxílio emergencial, deixa estas pessoas totalmente abandonadas, à deriva”.
“Infelizmente, pelo que pudemos ver, a Polícia Federal brasileira teve um comportamento muito mais respeitoso do que o representante do consulado colombiano, que não teve qualquer empatia. Para ele, infelizmente, estas são pessoas descartáveis, completamente invisíveis”, concluiu Jenny.
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