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Muitas vezes as pessoas se sentem agredidas diante da realidade da violência quando reproduzida nos meios de comunicação e nas redes sociais. “É desnecessário – dizem – fazer-nos tragar toda essa tragédia que já conhecemos”. Mas não está certo, não se conhece porque se construiu todo um imaginário para ignorar os dramas alheios, fantasia de negação bastante útil para quando assassinam um ente por nos querido, nos extorquiam ou batem nas janelas de nossos carros com uma arma calibre 44 magnun adquirida no mercado negro só para nos roubar um celular.
Carolina Vásquez Araya*
Assim é como vamos nos adaptando a uma realidade paralela a nosso espaço pessoal, cada vez mais reduzido em termos de espaço, mas também de experiência. Já não socializamos, não conhecemos nossos vizinhos e somos incapazes de compreender toda a dimensão do absurdo cenário em que transcorre nossa vida.
No transcurso de uns poucos dias, assistimos o assassinato de um cidadão por não dar passagem a um desses energúmeno que utilizam o automóvel como arma de destruição em massa. Vimos como o corpo de uma jovem se espatifou contra o asfalto depois de ter sido selvagemente agredida por seu parceiro. Claro, não foi a única nem será a última apesar dos esforços de alguns para tornar visível o feminicídio, de algumas organizações para socorrer as vítimas potenciais e de alguns cidadãos para denunciar as agressões.
Mas isso é só uma parte da equação, a outra é a ausência de seguimento a esse tipo de crime pela incapacidade do sistema de administração de justiça para enfrentar essa debacle social, cujo impacto supera largamente as possibilidades de reação das instituições do Estado. Os processo se acumulam a cada maré de denuncias, provocando um sentimento de enorme frustração nas vítimas pela impossibilidade de se resguardar de possíveis represálias. E o sistema entra em colapso com um escandaloso porcentagem de casos não resolvidos enquanto lotam as instalações do sistema penitenciário com indivíduos com prisão preventiva.
A tudo isso, o conceito de democracia não tem sido objeto de um processo consciente, coletivo e de participação cidadã capaz de reformulá-lo. Isso provoca uma ilusão de estabilidade em alguns setores urbanos, cuja visão não ultrapassa as fronteiras dos bairros periféricos. Portanto, o que ocorre no resto do país: o conflito agrário, a destruição provocada pelas grandes empresas de extração mineral, a ausência de instituições do Estado e a miséria em que transcorre a vida de milhões de seres humanos carentes do mínimo para sobreviver, tudo isso lhe é alheio.
A isso há que agregar uma espécie de governo paralelo liderado pelos capos do tráfico de droga, do contrabando e tráfico de pessoas, que dominam grandes áreas do território e passeiam em seus carros blindados com a mais absoluta impunidade, conscientes de possuir uma força superior a de qualquer outra instância da segurança nacional. O terror gerado por esses grupos nas comunidades é algo desconhecido para os citadinos, que só tem ligeira noção dessa realidade.
Onde está, então, a democracia? A que definições responde um sistema incapaz de proporcionar a menos esperança de segurança e justiça para seus cidadãos? Os avanços na perseguição dos delitos de alto impacto, mesmo com a enorme relevância que tem para a consolidação do sistema de justiça, não são suficientes para garantir a paz na Guatemala.
*Colaboradora de Diálogos do Sul, de Guatemala.
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