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Benedito Tadeu César*
Em uma disputa marcada pelo inusitado, como a que está em curso, é cedo, ainda, para avaliar as chances eleitorais dos principais candidatos à Presidência da República.
Faltando apenas 15 dias para a votação em primeiro turno, o vira e revira de posições, iniciado com a morte trágica de Eduardo Campos, pode não ter se encerrado. Dilma Rousseff, que chegou a ser ultrapassada por Marina Silva, recuperou a dianteira. Marina Silva perdeu impulso e começa a ter a segunda colocação ameaçada por Aécio Neves, que parecia sem condições de reagir.
Amainada a comoção causada pela morte de Eduardo Campos, seu companheiro de chapa, Marina Silva viu-se exposta ao fogo cruzado dos candidatos que polarizavam a disputa no início da campanha. Obrigada a fazer concessões programáticas para garantir apoios, ao alterar pontos cruciais de seu programa de governo, Marina Silva abriu o flanco a seus adversários e forneceu farto material para que eles a atacassem.
Apoiado, provavelmente, em pesquisas qualitativas, Aécio Neves adotou o discurso da razão contra o da emoção para combater Marina Silva (é hora da virada da razão, disse ele). Aproveitando-se da falta de estrutura partidária e da pouca experiência administrativa de Marina Silva, que a fizeram acenar com a possibilidade de oferecer cargos a integrantes do PSDB e até do PT em seu eventual governo e, ainda, incorporar ao seu programa de governo bandeiras históricas e dificilmente conciliáveis daqueles dois partidos, Aécio Neves procurou mostrar que o melhor seria votar no “original”, que tem experiência, e não na “cópia”, inexperiente e com posições dúbias. Ao mesmo tempo, Aécio Neves centrou fogo contra o PT e Dilma Rousseff, ampliando as denúncias sobre possível corrupção na Petrobras.
Dilma Rousseff, valendo-se principalmente do passado petista de Marina Silva e da aproximação programática que ela aparenta realizar hoje com o PSDB, explorou as possíveis incongruências de sua postura e de suas propostas de governo. Não há “novidade” e não há nenhuma “terceira via” sendo gestada pelo projeto de Marina Silva, procurou demonstrar Dilma Rousseff. Caso Marina Silva vença as eleições, afirmou Dilma Rousseff, será a volta do projeto e do governo “dos tucanos”. A estratégia de campanha foi clara: reestabelecer, agora pela via de Marina Silva, a antiga polaridade PT X PSDB, mostrando que, novamente, são os mesmos dois projetos que se enfrentam.
Marina Silva, com forte presença da emoção, afirmou estar sendo injustamente atacada. Relembrou sua infância de fome e miséria, ao que contrapôs sua trajetória de luta e vitórias, apresentando-as como garantia de suas convicções. Reafirmou seu compromisso com os pobres e com diferentes tipos de excluídos, ao mesmo tempo em que tentou atrair apoios do setor financeiro, do agronegócio, dos religiosos e de todos os descontentes com os governos petistas, estejam eles posicionados na direita ou na extrema esquerda do espectro ideológico. Remendou e refez seu programa de governo, com o que, por um lado, amealhou apoios políticos, mas por outro deu margem aos ataques de seus adversários.
O distanciamento temporal da morte de Eduardo Campos, aliado às táticas de ataque de Dilma Rousseff e de Aécio Neves parecem ter tido efeito sobre as intenções de voto em Marina Silva, que veio perdendo pontos em todas as pesquisas realizadas nas últimas semanas. A pesquisa do Ibope, divulgada na terça-feira (16), revelou, no entanto, uma tendência que, se confirmada, implicará na possibilidade de uma nova reviravolta na disputa eleitoral. Ainda que todas as variações tenham ocorrido dentro da margem de erro, Dilma Rousseff caiu três pontos percentuais, passando de 39% para 36% das intenções de voto; Marina Silva perdeu um ponto, oscilando de 31% para 30%, enquanto Aécio Neves avançou, recuperando quatro pontos percentuais, indo de 15% para 19%.
A distância de onze pontos percentuais que separa as intenções de voto em Marina Silva e Aécio Neves, segundo a pesquisa do Ibope acima referida, pode não se constituir em barreira tão difícil de ser superada. Aécio Neves tem estrutura partidária bem mais sólida do que a de Marina Silva, tem um projeto de governo bem melhor estruturado, tem mais experiência de governo e maior número de políticos consagrados que o apoiam. Além disso, Aécio Neves e seu partido têm considerável know-how em denúncias e, sobretudo, contam com maior simpatia de parcela bem mais significativa da grande mídia do que Marina Silva e o PSB/Rede têm ou podem vir a possuir.
Inflada pela morte de Eduardo Campos e pelo apoio da grande mídia, a candidatura de Marina Silva corre o risco de ser desinflada rapidamente. Caso a estratégia de Aécio Neves, de se apresentar como mais confiável do que Marina Silva, e os ataques de Dilma Rousseff funcionem, produzindo novas quedas nas intenções de voto de Marina Silva, a grande mídia poderá trocar, mais uma vez, seu apoio, abandonando Marina Silva e voltando a privilegiar Aécio Neves.
Adotar este procedimento exigirá poucas alterações de postura. Bastará que a grande mídia pare de tratar Marina Silva como vítima indefesa e injustiçada pelos ataques do PT e de Dilma Rousseff, deixando-a sangrar sozinha. Nada mais precisará ser alterado, desde que sejam mantidos os ataques à política econômica em curso, com a pregação diária da iminência do desemprego, da estagnação econômica e do crescimento da inflação, e que as denúncias de corrupção sejam amplificadas na mesma proporção que elas ocorreram na reta final das campanhas eleitorais dos últimos anos.
A antiga polaridade PT x PSDB e o enfrentamento de seus respectivos projetos, buscado pela campanha de Dilma Rousseff, estará restabelecida. Pouco importa que os adversários nominais de Dilma Rousseff e do PT sejam Aécio Neves e o PSDB ou que eles sejam substituídos por Marina Silva e o PSB/Rede.
O entendimento da campanha petista, ao que parece, é o de que esta situação recolocaria Dilma Rousseff na posição de vantagem em que se encontrava no início da disputa eleitoral, quando tinha chance real de vencer ainda no primeiro turno. Resta saber se o desgaste a que têm sido submetidos Dilma Rousseff e o PT será suficiente para derrotá-los ou se Dilma Rousseff e o PT terão a força necessária para reconquistar o apoio eleitoral que detinham anteriormente.
*Cientista político e colaborador da Diálogos Do Sul.
Original publicado no Sul21