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Direita peruana se opõe a ratificação de acordo ambiental e direito à consulta popular

Acordo de Escazú propõe compromissos ambientais e consagra o direito dos habitantes a ser informados e consultados sobre decisões que possam afetar o seu entorno
Manuel Robles Sosa
Prensa Latina
Lima

Tradução:

No Peru, está nas mãos do Parlamento a ratificação do Acordo de Escazú, que propõe compromissos ambientais e consagra o direito dos habitantes a ser informados e consultados sobre decisões que possam afetar o seu entorno, entre outras medidas.

Sobre esse tema, Prensa Latina entrevistou o especialista Hugo Cabieses, ex-vice-ministro de Desenvolvimento Estratégico dos Recursos Naturais, do Ministério do Ambiente de seu país.

Acordo de Escazú propõe compromissos ambientais e consagra o direito dos habitantes a ser informados e consultados sobre decisões que possam afetar o seu entorno

Prensa Latina
Hugo Cabieses, ex-vice-ministro de Desenvolvimento Estratégico dos Recursos Naturais do Peru

Confira a entrevista

Prensa Latina: Uma campanha de meios de comunicação, políticos e economistas neoliberais pressiona o Congresso da República para que rechace a ratificação do Acordo de Escazú e para isso alegam que o Peru perderá sua soberania sobre os recursos da Amazônia, para cedê-la a um controle internacional. O que opina a respeito disso? 

Hugo Cabieses: Esta afirmação dos setores populistas de direita, contrários à globalização dos direitos dos cidadãos, e dos povos indígenas em particular, não se sustenta. Trata-se de setores políticos como o fujimorismo (Força Popular, de Keiko Fujimori) e do alanismo (Partido Aprista, do suicidado Alan García), e empresariais, da Confederação de Empresários (Confiep).

Também das sociedades empresariais de Mineração e Petróleo e outros, aliadas com alguns militares antipatriotas aos quais a única coisa que lhes interessa são os negócios acima da vida e do ambiente, ou dos direitos da população a estar informada. 

Não é um paradoxo que aqueles que combatem a ratificação do acordo e se dizem defensores da soberania, sejam ao mesmo tempo defensores de outorgar cada vez mais vantagens e concessões às empresas transnacionais, sobretudo para operações extrativas que afetam o meio ambiente? 

Assim é. É parte substancial de seu pensamento e atuação antidemocrática e de manutenção de seus privilégios de sempre e, além disso, propõem “voltar à normalidade”, ou seja, ao que foi o problema: O neoliberalismo extrativista inimigo do país e das pessoas. 

A Sociedade Peruana de Direito Internacional pediu um amplo debate público sobre o Convênio e sustenta que os princípios e normas sobre a transparência na utilização de recursos naturais contidos no Acordo de Escazú são similares às normas que já regem no Peru. Qual sua opinião sobre isso? 

Apoio o pronunciamento no sentido de abrir um debate que foi encerrado por interesses empresariais, mas discrepo da afirmação de que o Acordo de Escazú contém normas similares às que o Peru já tem. 

O que temos são normas e barreiras ambientais na maioria dos casos menores que as que têm outros países, sobretudo os mais desenvolvidos e, além disso, muitas delas não são vinculantes, obrigatórias. 

É a caso do Zoneamento Ecológico Econômico (ZEE) e do Ordenamento Territorial (OT) que não são obrigatórios para investimentos extrativistas mineiros, petroleiros, em bosques ou marítimos. 

Outro é o caso da consulta previa, livre e informada que no Peru não é vinculante, mas “recomendada”. O Acordo de Escazú permitiria que seja corrigida essa anomalia da democracia e da economia sustentável. 

Qual é sua visão sobre as opiniões sobre a ratificação do Acordo de Escazú do Ministério do Ambiente, cuja titular pede a ratificação, e da Chancelaria peruana que só sugere seu debate? 

A ministra Fabiola Muñoz firmou o Acordo em 2018 e participou nas negociações de seu conteúdo, em coordenação com a Chancelaria e o presidente Martín Vizcarra. E mais, o Ministério de Relações Exteriores teve um representante nas negociações de Escazú.

Nenhum ministro pode firmar qualquer acordo sem que estejam informados o Chanceler e o Presidente da República, o qual, em última instância, conduz a política exterior do país. 

A carta do chanceler Gustavo Meza Cuadra, de 15 de junho de 2020, dirigida ao presidente da Comissão de Relações Exteriores do Congresso da República tem uma linguagem ambígua e confusa que poucos podem entender. Mas deixa a impressão de que quer dizer nas entrelinhas que “não estou de acordo com a ratificação”. 

No entanto, como diríamos no Peru, trata-se de um “pleito de brancos” enquanto a crise do regime político continua em modo pandêmico e os índios, os de “cor modesta” estão a favor da firma do Acordo. 

Uma das conquistas da luta dos povos indígenas amazônicos é a Lei de Consulta Prévia sobre atividades econômicas em seus territórios. A lei está sendo aplicada efetivamente? 

A Lei de Consulta Prévia está sendo aplicada, mas de maneira limitada, não inclui temas como consultar antes de outorgar uma concessão e, como eu disse antes, não é vinculante. 

Ademais, as empresas costumam “comprar” uma parte das comunidades para enfrentá-las com os que se opõem à presença da empresa, enquanto o Estado quase sempre se põe do lado da empresa, contra as comunidades. 

O Estado não cumpre um papel mediador, mas sim cúmplice, e assume que primeiro está o investimento, acima da vida e do ambiente. Por isso é que há tantos conflito socioambientais.

Manuel Robles Sosa, Correspondente de Prensa Latina no Peru.

Prensa Latina, especial para Diálogos do Sul — Direitos reservados.

Tradução: Beatriz Cannabrava


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.
Manuel Robles Sosa

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