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Ilhas do Pacífico apresentam índices alarmantes de violência contra a infância

Segundo a Unicef, nos países mais pobres da Ásia-Pacífico, 25% das desordens mentais podem ser atribuídas a maus tratos no primeiro período de vida
Amelia Duarte de la Rosa
Prensa Latina
Havana

Tradução:

Com uma população pequena e dispersa em atóis e ilhas quase paradisíacas, poucos poderiam imaginar que os 14 estados insulares do Pacífico concentram uma das maiores taxas de violência contra a infância do mundo.

Cerca de quatro milhões de crianças são vítimas de maus tratos em casa, segundo um relatório da Visão Mundial para o Pacífico, divulgado em agosto passado.

O relatório decompõe a magnitude das estatísticas: 71% dos menores em Fiji sofreu violência física e/ou psicológica em casa, enquanto 72% passaram por isso nas Ilhas Salomão, 78% em Vanuatu e 81% em Kiribati.

A pesquisa mostra que entre os fatores de risco nas práticas de crianças aparece o abuso, altos níveis de desigualdade de gênero, a aceitação social do castigo físico dos pequenos, assim como a pobreza e a desigualdade crescentes.

Informa, ainda, que um de cada três pais confirma ter batido em seus filhos “tão duro quanto puderam”, e sete de cada 10 adultos, incluindo professores, admitem bater nas crianças com quem convivem.

Em países como as Ilhas Cook, uma de cada quatro mulheres considera que “o homem deve mostrar que ele é o chefe”, e uma de cada três vítimas não conta nada a ninguém.

Segundo a Unicef, nos países mais pobres da Ásia-Pacífico, 25% das desordens mentais podem ser atribuídas a maus tratos no primeiro período de vida

Nações Unidas
Cerca de quatro milhões de crianças são vítimas de maus tratos em casa

Situação da infância no Pacífico

“As crianças estão aí para serem vistas, não para serem ouvidas”, diz um ditado nas Ilhas Salomão, que demonstra parte das idiossincrasias regionais do Pacífico, acrescidas da violência contra as mulheres, com uma alta incidência naquela parte do mundo.

Presenciar violência em casa pode ser tão danoso quanto sofrê-la, e ao crescer as vítimas têm mais probabilidades de assemelhar-se às pessoas que os maltratam e de agredir seus próprios filhos, perpetuando um ciclo de violência intergeracional, afirma Sheldon Yett, representante da Unicef no Pacífico.

Acresce – assegura Yett – que bater nos filhos faz parte do temperamento destes povos, pois se considera que disciplinar os pequenos utilizando a força ou agressões verbais é necessário para educá-los e para que assimilem seu lugar na base da hierarquia social.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) especifica que a violência contra as crianças inclui todas as formas de agressividade contra os menores de 18 anos, infligida por seus pais ou por outras pessoas que cuidem deles, seus companheiros, seus pares.

“A violência contra as crianças faz com que as sociedades sejam menos prósperas e exacerba os riscos para os sistemas de saúde e de justiça”, afirmou Carsten Bockemuehl, líder de campanhas de defesa da criança da Visão Mundial para o Pacífico, sobre as consequências deste flagelo social.

Por toda a vida

A violência, que, aliás pode ser evitada, afeta os pequenos ao longo de toda a vida, em sua saúde e bem-estar assim como suas famílias, comunidades e países.
Entre suas principais consequências – ao nível individual- aparecem transtornos do desenvolvimento do cérebro e do sistema nervoso.

Da mesma forma, a exposição à violência em tenra idade pode danificar partes dos sistemas endócrino, circulatório, osteomuscular, reprodutivo, respiratório e imunológico, com consequências que duram toda a vida, segundo a OMS.

No texto mencionado, os autores indicam a falta de ajuda estrangeira para programas destinados a pôr fim à violência contra os pequenos, assim como a pouca especificidade nos projetos da Nova Zelândia e da Austrália.

Apenas 0,1% de toda a ajuda exterior australiana para o Pacífico em 2017 destinou-se a programas especificamente focados no combate à violência contra as crianças, segundo a organização não governamental Save The Children.

Enquanto isso, um estudo recente do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) destaca que os maus tratos aos menores custam 209 bilhões de dólares anuais para o leste da Ásia e o Pacífico, o equivalente a 2% do Produto Interno Bruto.

Imperativo moral

“Acabar com a violência não é apenas um imperativo moral. Se não protegermos os menores, estaremos prejudicando o desenvolvimento econômico de nossos países e não alcançaremos os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável”, afirma Rachel Harvey, especialista em proteção à infância da Unicef na Ásia-Pacífico.

“Esta pesquisa revela que a inação frente à violência resulta em um alto custo econômico para os países e as comunidades”, afirmou em um comunicado de imprensa o diretor regional da Unicef, Daniel Toole.

“É difícil para as crianças que sofrem violência e abusos virem a ser membros produtivos da sociedade, e assim os países arriscam-se a perder os benefícios que poderiam proporcionar no futuro”, acrescentou.

Os sobreviventes são mais propensos a continuar recebendo “e propiciando” maus tratos pelo resto de sua vida e a padecer doenças cardíacas e diabetes.

Segundo calcula a Unicef, nos países mais pobres da Ásia-Pacífico, 25% das desordens mentais podem ser atribuídas a maus tratos na infância.

O especialista conclamou todos os governos da região, que são signatários da Convenção da ONU sobre os Direitos da Criança, o que os compromete a proteger os infantes da violência, do abuso e dos maus tratos, a tomar medidas urgentes para abordar os maus tratos infantis.

A única forma de acabar com a violência é mediante “um esforço coletivo”, afirmou o responsável da Unicef no Pacífico.

*Amélia Duarte de la Rosa, Jornalista da Redação Internacional de Prensa Latina

**Prensa Latina, especial para Diálogos do Sul — Direitos reservados.

***Tradução: Ana Corbisier

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
Amelia Duarte de la Rosa

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