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Privatizaram e vão aumentar conta de luz; quais os direitos necessários para se viver?

Serviços essenciais aos direitos fundamentais para manter a vida não podem ser privatizados e subordinados aos interesses de baqueiros, fiscalistas e rentistas
Paulo Cannabrava Filho
Diálogos do Sul
São Paulo (SP)

Tradução:

O primeiro direito creio que é o direito à vida, uma vida digna entre os humanos e a natureza. O que é fundamental para manutenção da vida? Você pode manter a vida com trabalho, terra, água e luz, ou seja, o sol. Agora, se você vive numa aglomeração humana concentrada numa cidade, como é que fica?

Tudo aquilo a que já nos referimos continua sendo essencial, mas se acrescem muitas outras necessidades. A civilização impõe outros direitos para uma vida digna e o reforço daqueles que consideraremos como primários: teto, terra, água, luz, saneamento básico, segurança alimentar; seguem os que são exigências da civilização, do progresso, do desenvolvimento: direito à saúde, educação, ao transporte, acesso à informação, à cultura, ao esporte, ao lazer.

Os jornais de hoje informam que as empresas de fornecimento de energia elétrica (a luz que ilumina as residências, as ruas e move as fábricas), por diminuição da demanda por conta da quarentena exigida para enfrentar a Covid 19, estão ao borde da quebra. E mais, querem um aumento de 12%, nas tarifas de luz. Lembremos que desde que essas empresas foram privatizadas já tivemos aumentos brutais nas contas de luz.

Serviços essenciais aos direitos fundamentais para manter a vida não podem ser privatizados e subordinados aos interesses de baqueiros, fiscalistas e rentistas

Cut.org
É um absurdo privar a população das coisas essenciais à vida.

Gente! Luz é um direito. Concorda?

Para produzir essa energia, essa luz que chega a sua casa, foram muitas décadas de estudo, pesquisa, investimento em obras, que foram custeados pelo Estado, ou seja, investimento público, de toda a sociedade. 

Aí chegam os neoliberais, com os financistas a tiracolo, e dizem que tudo isso precisa ser privatizado…

Ai chega uma empresa estrangeira e, sem ter investido um centavo naquelas décadas de esforço comum da sociedade, compra esses bens de produção a preço de banana e ainda com financiamento do próprio Estado. A empresa estrangeira compra para ter lucro e remunerar os financistas. 

Com a diminuição da demanda a empresa não aceita ter prejuízo, mesmo sem ter investido um centavo para assumir a propriedade. A responsabilidade pelas perdas da empresa não pode ser atribuída ao Estado e muito menos aos consumidores. Se ela é incapaz de enfrentar uma crise, não é hora de tomar de volta essas empresas? Sim, tomar de volta porque eram empresas públicas.

Mas fiquem tranquilos… para quê está um Paulo Guedes na gestão da economia desse governo de ocupação? Fiquem tranquilos que em vez de socorrer a população, o governo já separou entre 10 e 12 bilhões de reais para socorrer as empresas elétricas.

Tem cabimento?

E tem mais! De onde virá o dinheiro? Adivinhe se não será você, eu, a Vanessa, o Pimentel os que pagarão a conta? 

O governo, do ponto de vista dos fiscalistas, está quebrado, não tem mais dinheiro e a arrecadação não alcança para pagar os gastos correntes mais os juros e o principal, a dívida pública.  Diante disso, a ordem é reduzir custos, cortar os gastos essenciais como saúde, educação, segurança, ´pastas cujos orçamentos caíram em quase um terço. Para socorrer as elétricas, vão acabar com a farmácia popular. Pode? Claro que pode. Já não liberaram um trilhão para garantir liquidez aos bancos?

Serviços essenciais, que atendem os direitos fundamentais para manter a vida, como água potável, esgoto tratado, coleta de lixo, luz, gás, transporte urbano, habitação, saúde, educação e segurança, não podem ser objeto de lucro. Se é direito, é obrigação do Estado. O Estado só pode ser mínimo se atende aos direitos fundamentais da pessoa humana.

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É um absurdo privatizar as coisas que são essenciais à vida. Alguns países, a Inglaterra entre eles, passada a febre das privatizações da senhora Margaret Thatcher, está retornando para as mãos do Estado serviços essenciais. Na Bolívia, privatizaram a água a população não aguentou pagar os aumentos extorsivos e fez uma Revolução no país.

É um absurdo privar a população das coisas essenciais à vida.

Salários

Para tungar os trabalhadores o governo alega que não tem dinheiro. Para diminuir os gastos, a Câmara dos Deputados aprovou o congelamento dos salários dos servidores públicos por 18 meses. Mas os servidores querem aumento. Eles já tiveram um aumento recentemente e os militares foram os mais privilegiados. Contudo, o congelamento ainda não foi sancionado pelo Executivo, o aumento de 12% poderá ser concedido antes que entre em vigor a lei.

Este nosso Brasil é mesmo o país do absurdo. Estamos em plena evolução da pandemia, os índices de contaminação e morte ainda não alcançaram o pico, os porta-vozes do deus mercado estão mais preocupados com a provável saída do Guedes da gestão da economia do que as mortes pela pandemia.

Gente… esses caras merecem ir pros quintos dos infernos!

E a Covid

A ciência está preocupada com a inevitável segunda onda da Covid-19, buscando como enfrentá-la e, os banqueiros, financistas e rentistas estão preocupados “com o desastre maior” que seria a saída do Guedes.

O que seria o desastre maior para o nosso povo? Duas frentes de confronto: de um lado, a população tem que enfrentar a pandemia e, de outro, a insanidade de um governo ilegítimo.

Veja como fica claro que esse governo de ocupação é um desdobramento da ditadura do capital financeiro: os militares ocuparam o governo, como disse em documento o general Hamilton Mourão, para assegurar a ditadura do capital. E nem pensem em contestar. Até o “jus esperniandi” está sob ameaça.

Bom, nem tudo está perdido. Enquanto Donald Trump injeta a Cloroquina na veia pra sustentar os laboratórios estadunidenses, o governo chinês anuncia que liberou dois bilhões de dólares para o desenvolvimento da vacina anti-covid e que ela (a vacina) será produzida para o bem da humanidade. Ou seja, será distribuída gratuitamente para os povos do Terceiro Mundo. 

O Brasil estará fora disso, claro, porque os que ocuparam o governo se acham do primeiro mundo, ignoram que somos mera colônia a produzir matéria prima e mercado para o imperialismo.

Duas personalidades em confronto

Dois mandatários e duas personalidades completamente diferentes, em cultura, em comportamento, em visão de mundo e em humanidade: Trump e Xi Jinping.

Trump já conseguiu, em parte, difundir em seu povo um ódio à China. Ele atribui à China a origem do coronavírus. É uma velha tática de guerra, botar a culpa no outro pela sua irresponsabilidade. Ele precisa de um culpado para as mais de 100 mil mortes que pesará na sua história de incompetente. Se não, como vencer as eleições? como manter-se no poder?

À agressão de Trump, Xi responde com tranquilidade confuciana, Vamos dialogar e juntar forças para combater juntos a pandemia!  Juntos teremos muito mais força!

Mesmo que tenha tido início lá a pandemia, a China já superou, está voltando ao trabalho e está preparada para um possível retorno. Além disso, está ajudando a muitos países a enfrentarem a crise sanitária, pois adquiriu experiências que são valiosas para toda a humanidade.

É certo que China e Estados Unidos dependem um do outro mais do que quaisquer outros países. Mas se a China retaliar, só haverá um perdedor. O que diz a imprensa chinesa? 

Pra começar, eles podem retirar os investimentos que eles têm nos estados que são os mais agressivos na aversão aos chineses. Podem também retirar os investimento nas áreas mais sensíveis, como a do Vale do Silício, meca da alta tecnologia da informática, onde os chineses têm vultosos recursos aplicados. Pode também desfazer-se dos títulos da dívida pública dos EUA e jogar o dólar no lixo.

Mas não creio que passe isso pela cabeça do presidente chinês. É um grande pensador e guia. Sua preocupação maior não são as diatribes do Trump por questões eleitorais. Está nem aí para Trump. A preocupação maior de Xi Jinping é seu projeto de Nova Rota da Seda; a integração euro-asiática, garantir um mundo que consuma sua produção e forneça os insumos necessários. Tudo isso sem guerra, com investimentos em infra-estrutura e ajuda aos menos desenvolvidos. 

É o império que se impõe neste novo século… oxalá seja sem guerra, sem a vil exploração dos trabalhadores.

O que está em jogo é o direito à saúde

O que está por trás disso, na realidade, é uma corrida no mundo do capital, pela produção e registro de patentes de vacinas e medicamentos. Os laboratórios privados são transnacionais e obtêm lucros absurdos, cobrando royalties de medicamentos, são as indústrias da morte… necro-indústrias.

Essas drogas consideradas especiais custam o olho da cara. Devia estar servindo agora o exemplo do que ocorreu com a Aids, ou Cida, nos anos 1990. Os laboratórios faturaram horrores com um coquetel de três drogas que custava US$ 10 mil por paciente. Quem é que pode pagar isso? Nem mesmo um estado em desenvolvimento podia pagar isso para deter aquela pandemia que matou milhões de pessoas, principalmente na África.

A África do Sul chegou a processar 40 empresas para ter um preço decente do produto. Foi uma gritaria geral em todo o mundo. Houve até reuniões internacionais para tratar do assunto. A Índia colocou sua indústria farmacêutica de genéricos e começou a produzir o coquetel dos três medicamentos por US$ 350 por paciente/ano. Foram organizadas cooperativas de produtores e, em 2011, o produto chegou, na África, a custar US$ 100 por paciente/ano. Veja… de 10 mil pra 100 dólares. Com isso conseguiu-se reduzir ao mínimo a morte pela doença. 

O New York Times de hoje manifesta precisamente essa preocupação. Dado o terrível “preço do vírus”, ou seja, as perdas econômicas causadas, como fazer com que uma vacina chegue a bilhões de pessoas?

É uma questão política, como foi política a solução encontrada para a questão da Aids. O Brasil tem uma longa tradição de produção de vacinas pelos laboratórios públicos. Com isso, erradicou a poliomielite, tifo, sarampo, malária. Algumas não totalmente erradicadas porque as pessoas se negam a tomar vacina. 

O New York Times se preocupa também com o tempo necessário para testar a eficácia de uma vacina, e os riscos de possíveis efeitos colaterais. Lembra que a indústria farmacêutica francesa Sanofi, produziu uma vacina contra a dengue e quando as crianças foram vacinadas nas Filipinas, contraíram uma dengue mais severa que a comum. 

O que se impõe, vale reiterar, é a cooperação entre os Estados, só possível num ambiente de paz, sem hegemonias imperiais, sem guerras de agressão ou conquista. Oxalá essa pandemia, depois de tanto sofrimento, faça com que a humanidade entenda que o capitalismo mata, é preciso outro modelo em que se valorize a vida, não o lucro, se valorize a natureza, não o capital. Em suma, começar tudo de novo. 

O Papa Francisco lançou um desafio planetário por “uma outra economia”. Como diz o professor Ladislau Dowbor, consultor da ONU, do grupo fundador e colaborador de Diálogos de Sul:

“É fundamental entender que a economia que ensinamos, e muitas das análises econômicas que fazemos estão atoladas em simplificações metodológicas e interpretações interessadas, profundamente ideológicas, que exigem não mais alguns acertos, mas um deslocamento sistêmico, um ‘reset’ geral que nos permita evoluir de uma pretensa ‘ciência’ econômica para a mais modesta e produtiva economia política, ancorada na história e nas outras ciências sociais”. 

Paulo Cannabrava Filho, jornalista e editor da Diálogos do Sul

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
Paulo Cannabrava Filho Iniciou a carreira como repórter no jornal O Tempo, em 1967. Quatro anos depois, integrou a primeira equipe de correspondentes da Agência Prensa Latina. Hoje dirige a revista eletrônica Diálogos do Sul, inspirada no projeto Cadernos do Terceiro Mundo.

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