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“Campanha Trump está produzindo programa de televisão surrealista”, diz líder democrata

Legislativos democratas criticaram Trump e sua convenção por tentar oferecer uma realidade alternativa sobre manejo da pandemia que matou quase 180 mil estadunidenses
David Brooks
La Jornada
Nova York

Tradução:

Na penúltima noite da Convenção Nacional Republicana, o roteiro de adulação ao líder por um partido subjugado por ele – os dissidentes de seita não estão presentes nem foram convidados – continuou com outro desfile de políticos e cidadãos sicofantas culminando com o sempre cauteloso e ultraconservador cristão vice-presidente Mike Pence e sua esposa e tudo, dizem, está abençoado por Deus.

Donald Trump e seus aliados conseguiram não apenas se impor sobre seu partido, mas também rompendo normas e muito possivelmente a lei, ao subjugar o poder executivo aos seus próprios interesses eleitorais nesta convenção em grande medida virtual, tudo pago pelo público. Não só violaram normas, mas estão impulsionando uma falsa versão da “realidade” – sobretudo em torno do manejo da pandemia.  

“A ninguém verdadeiramente lhe importa a Lei Hatch” fora de Washington, respondeu hoje o chefe de gabinete de Trump, Mike Meadows, em referência à lei federal que proíbe que funcionários federais usem seus poderes oficiais para fins eleitorais de um candidato presidencial.

Legislativos democratas criticaram Trump e sua convenção por tentar oferecer uma realidade alternativa sobre manejo da pandemia que matou quase 180 mil estadunidenses

Twitter | Reprodução
Sempre cauteloso e ultraconservador cristão vice-presidente Mike Pence afirmou que "Tudo está abençoado por Deus"

Mais um episódio do “reality” trumpista

Esta noite o show continuou com diversos políticos republicanos e “pessoas comuns” elogiando o líder por sua “defesa da liberdade” contra a “esquerda radical” democrata que deseja destruir os Estados Unidos. 

Com isso, de novo foram abordados os distúrbios em “cidades democratas” pelo tema racial, e se contrapôs o lema de “Blues Lives Matter”, em referência às polícias, ao do movimento de protesto “Black Lives Matter”.  

Isso enquanto em Kenosha, Wisconsin, onde milícias brancas convidaram a um contraprotesto na terça-feira diante de manifestantes que repudiavam outro caso de policiais disparando contra um afro-estadunidense desarmado, Jacob Blake Junior, no domingo passado (o qual agora se encontra gravemente ferido), um jovem branco – que se identifica como membro de uma milícia em suas contas nas redes sociais e um fanático de Trump – chegou com um rifle semiautomático e abriu fogo matando dois e ferindo um. Ontem foi preso homicídio.

Apoio e incitamento aos supremacistas brancos 

Os agrupamentos de supremacistas brancos têm se apresentado armados em vários atos no país durante os últimos meses, e têm sido elogiados por Trump. Na convenção, o casal que saiu armado para “defender” sua casa contra uma inexistente ameaça de uma marcha pacífica da Black Lives Matter — posteriormente foram acusados por promotores em St. Louis por ameaçar pessoas com armas – esteve entre os oradores do primeiro dia desta convenção. 

O presidente e sua equipe já estão usando os protestos, como fizeram com os de Portland e outras cidades, como parte de sua propaganda eleitoral, e hoje anunciou o envio de forças de segurança federais para “restaurar a Lei e a Ordem”, um de seus temas de campanha. 

“Fatos alternativos”, personalidades surreais e a retórica “trumpista”

Muita coisa da retórica oficial nos três dias da convenção projeta a ideia de uma ameaça existencial ao país por parte da “esquerda radical”, “anarquistas” e “socialistas”, e se reitera a sugestão de que há que se preparar, inclusive com armas, para enfrentar não só as hordas de esquerda nas ruas, mas também os “estrangeiros ilegais” que desejam invadir o país.

Vários observadores temem que incidentes como o do jovem armado em Wisconsin esta semana poderiam se multiplicar cada vez mais nesta conjuntura, nutridos pela retórica de Trump e suas hostes que já têm questionado desde agora a legitimidade desta eleição. 

Os oradores da noite, cujo lema foi “Terra de heróis”, incluíram mais familiares – a nora do presidente, casada com seu filho Eric, Lara Trump, sua porta-voz Kayleigh McEnany, e sua conselheira Kellyanne Conway — que acaba de anunciar que vai se retirar para atender assuntos familiares (mais que nada de uma filha adolescente que se tornou famosa denunciando o presidente, e um esposo que foi líder de um agrupamento republicano anti-Trump e que tem sido abertamente odiado pelo mandatário); Conway esteve entre as artistas da falsidade, distorceu e enganou dentro deste governo famoso por ser um dos mais mentirosos da história do país, inventora da famosa frase de “fatos alternativos” para responder a acusações de mentiras do presidente. 

O desfile de oradores incluiu legisladores federais (embora apenas um dos senadores que enfrentam reeleições competitivas), governadores, o presidente da Associação Nacional de Organizações de Policiais, vítimas de crimes, veteranos de guerra, um ativista chinês que escapou para os Estados Unidos, um “ativista de direitos civis” que afirmou que a Trump “verdadeiramente lhe importam as vidas negras” e até uma monja que se retirou do exército com o posto de coronel.

Democratas criticam o “reality show trumpista”

Os líderes legislativos democratas criticaram Trump e sua convenção por tentar oferecer uma realidade alternativa sobre seu manejo da pandemia que matou mais de 175 mil estadunidenses. Nancy Pelosi, a presidente da câmara baixa comentou a alguns meios que o presidente “trata de caos, nós de ciência”.

O líder da bancada democrata no Senado, Charles Schumer afirmou que Trump se tornou famoso com seu reality show na televisão, mas agora “a campanha Trump está produzindo um programa de televisão surrealista”.

De acordo com o roteiro pré estabelecido, a nova e breve temporada do “O Aprendiz” (oficialmente denominada como Convenção Nacional do Partido Republicano) culminará com mais um dos muitos “discursos” do Chefe Supremo, recheados pelos habituais autoelogios e dezenas de frases de efeito meramente publicitário, obedecendo impor ao país uma narrativa fantasiosa e, ao mesmo tempo, preparando o terreno para a já quase reação contestatória (e violenta?) caso Trump seja derrotado pelas urnas.

Mais uma vez, a participação do atual presidente se dará ao vivo e em cores desde a Casa Branca, solenemente ignorando todas as leis e a centenária tradição democrática dos EUA, afinal, fora de Washington: “A ninguém verdadeiramente lhe importa a Lei Hatch”…

 

David Brooks, correspondente de La Jornada em Nova York.

La Jornada, especial para Diálogos do Sul — Direitos reservados.

Tradução: Beatriz Cannabrava


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
David Brooks Correspondente do La Jornada nos EUA desde 1992, é autor de vários trabalhos acadêmicos e em 1988 fundou o Programa Diálogos México-EUA, que promoveu um intercâmbio bilateral entre setores sociais nacionais desses países sobre integração econômica. Foi também pesquisador sênior e membro fundador do Centro Latino-americano de Estudos Estratégicos (CLEE), na Cidade do México.

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