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Entenda papel de Moro na investigação de milicianos ligados à família presidencial

Investigações que envolvem Adriano da Nóbrega e Fabrício Queiroz não avançaram enquanto o ex Juiz ocupou cargo de ministro da Justiça
Redação Brasil de Fato
Brasil de Fato
São Paulo (SP)

Tradução:

Documentos revelados pelo site The Intercept Brasil neste sábado (25), trazem novos elementos sobre a ligação entre o senador Flávio Bolsonaro e a milícia do Rio de Janeiro chefiada por Adriano da Nóbrega, assassinado em fevereiro deste ano.

Segundo as informações de documentos sigilosos e dados levantados pelo Ministério Público do Rio de Janeiro, Flávio Bolsonaro financiou e lucrou com a construção ilegal de prédios pela milícia usando dinheiro público.

O investimento para as edificações construídas por três construtoras foi feito com dinheiro da “rachadinha”, coletado no antigo gabinete de Flávio Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio, segundo afirmaram ao Intercept promotores e investigadores sob a condição de anonimato.

Os investigadores dizem que chegaram à conclusão com o cruzamento de informações bancárias de 86 pessoas suspeitas de envolvimento no esquema ilegal, que serviu para irrigar o braço imobiliário da milícia. Os dados comprovariam que o hoje senador Flávio Bolsonaro receberia parte do lucro realizado através da venda dos prédios, através de repasses feitos pelo ex-capitão do Bope Adriano da Nóbrega  e pelo ex-assessor Fabrício Queiroz.

O andamento das investigações que fecham o cerco contra o filho do presidente é apontado como um dos motivos das pressões feitas pelo chefe do governo de ocupação sobre o ex-ministro visando a troca do comando da Polícia Federal no Rio de Janeiro e em Brasília. 

Investigações que envolvem Adriano da Nóbrega e Fabrício Queiroz não avançaram enquanto o ex Juiz ocupou cargo de ministro da Justiça

Palácio do Planalto
Fundamento das normas jurídicas adotadas pelo ex juiz da 13 Vara Federal de Curitiba

Moro também cometeu crimes

Em entrevista ao Brasil de Fato, a advogada Izadora Gama Brito, aponta que o ex juiz teve motivações políticas para deixar o ministério e considera também ele deve ser investigado por omissão em investigações enquanto ocupou o cargo, entre elas a do miliciano Adriano da Nóbrega. 

Adriano Magalhães de Nóbrega, ex-capitão do Bope, foi assassinado em Esplanada, na Bahia, após uma operação policial que deveria apenas prendê-lo, mas que teria terminado em uma troca de tiros, de acordo com a Secretaria de Segurança Pública da Bahia (SSP-BA). Na ocasião do assassinato, o jornal Folha de S. Paulo apontou que o então ministro sabia da operação e cogitou a possibilidade de enviar um helicóptero para dar suporte à polícia baiana, responsável pela atividade.

Acusado de comandar milícias em Rio das Ostras, no Rio de Janeiro, Nóbrega era procurado pela Justiça brasileira desde janeiro de 2019, mas ficou de fora da lista dos criminosos mais procurados do país, divulgada pelo Ministério da Justiça no dia 30 de janeiro. No dia seguinte à divulgação da referida lista, a ausência do miliciano levou o PSOL a anunciar que convocaria Moro para que ele prestasse esclarecimentos sobre o fato ao Congresso.

Ilustração: tt Catalão

Até mesmo Dallagnol suspeitava de Moro

Troca de mensagens revelada pelo Intercept em julho passado, mostra que o coordenador da Operação Lava Jato, Deltan Dallagnol temia que o então minstro da Justiça estivesse protegendo Flávio Bolsonaro para não desagradar ao presidente e, desta forma, não colocar em risco sua indicação ao Supremo Tribunal Federal (STF), como tinha antecipado o chefe do governo de ocupação em maio deste ano.

“Moro deve aguardar a apuração e ver quem será implicado. Filho certamente. O problema é: o pai [Bolsonaro] vai deixar? Ou pior, e se o pai estiver implicado?”, questionou o procurador na conversa com colegas.

As mensagens indicam que Dallagnol concordava com o posicionamento de outros colegas do Ministério Público Federal sobre a investigação de um esquema de corrupção no gabinete de Flávio Bolsonaro, conhecido como caso Queiroz, durante o mandato do filho do presidente como deputado estadual do estado do Rio de Janeiro pelo Partido Social Liberal (PSL).

“É óbvio o q aconteceu… E agora, José?”, disse o procurador em um dos chats secretos ao qual o portal teve acesso.

Adepto a declarações midiáticas, o procurador da Lava Jato expressou estar vacilante em fazer uma condenação mais severa de Flávio Bolsonaro aos meios de comunicação e teria evitado um convite para participar do programa Fantástico (rede Globo), em janeiro deste ano, como forma de evitar perguntas sobre o caso.

Ilustração: Aroeira

Adriano da Nóbrega, Fabrício Queiroz e Flávio

No momento em que foi executado, o ex-policial militar estava escondido na fazenda de Gilsinho da Dedé, vereador do PSL em Esplanada (BA). O partido é peça-chave para entender o caso que culminou em um mandado de prisão expedido contra Nóbrega em janeiro de 2019.

Até novembro de 2018 quando ainda era filiado ao PSL – partido do qual se desligou em outubro de 2019 – o senador Flávio Bolsonaro (PR), empregava a mãe e a esposa de Adriano de Nóbrega em seu gabinete na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), pois era deputado estadual.

O Ministério Público Estadual do Rio de Janeiro (MPE-RJ) aponta Nóbrega como um dos responsáveis pelo chamado “Escritório do crime”, de onde teria sido emitida a ordem para assassinar a vereadora Marielle Franco (PSOL/Rj).

Homenageado por Flávio Bolsonaro na Alerj em 2003, oportunidade em que recebeu a medalha Tiradentes, mais alta honraria fluminense, Nóbrega era amigo de Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador, acusado de recolher parte dos salários dos funcionários do gabinete do político, prática conhecida como “rachadinha.” Os dois trabalharam juntos no 18 Batalhão da Polícia Militar do Rio de Janeiro.

Ainda de acordo com a investigação, as contas de Nóbrega teriam sido utilizadas por Queiroz para fazer depósitos das rachadinhas.

Como funcionava a “Rachadinha”

Flávio pagava os salários de seus funcionários com a verba do seu gabinete na Alerj. Segundo apuração do Intercept, a partir daí, Queiroz – apontado no inquérito como articulador do esquema – confiscava em média 40% dos vencimentos dos servidores e repassava parte do dinheiro ao ex-capitão do Bope, Adriano da Nóbrega, apontado como chefe do Escritório do Crime, milícia especializada em assassinatos por encomenda.

A organização criminosa também atua nas cobranças de “taxas de segurança”, ágio na venda de botijões de gás, garrafões de água, exploração de sinal clandestino de TV, grilagem de terras e na construção civil em Rio das Pedras e Muzema.

As duas favelas, onde vivem mais de 80 mil pessoas, ficam em Jacarepaguá, na zona oeste da cidade do Rio de Janeiro, e assistiram a um boom de construções de prédios irregulares nos últimos anos. Em abril do ano passado, dois desses prédios desabaram, deixando um saldo de 24 mortos e dez feridos. O lucro com a construção e venda dos prédios seria dividido, também, com Flávio Bolsonaro, segundo as investigações, por ser o financiador do esquema usando dinheiro público.

O Ministério Público utilizou informações do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) para registrar que Fabrício Queiroz, enquanto era assessor no gabinete de Flávio Bolsonaro, teria recebido R$ 2 milhões em sua conta, divididos em 483 depósitos.

No gabinete de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), trabalharam também a ex-esposa e a mãe de Nóbrega, Danielle Mendonça da Costa e Raimunda Veras Magalhães, respectivamente. Elas receberam um total de R$ 1.029.042,48 em salários e repassaram R$ 203 mil para Fabrício Queiroz, respeitando o esquema estabelecido no gabinete para beneficiar o parlamentar, de acordo com a denúncia do MPE.

Ao todo, Queiroz movimentou R$ 7 milhões em três anos. Entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017, o ex-assessor de Flávio Bolsonaro fez diversos depósitos e saques que somam R$ 1,2 milhão. Um dos depósitos, de R$ 24 mil, foi feito na conta da primeira dama Michelle Bolsonaro, no ano de 2016.

Questionado sobre o repasse à sua esposa, o chefe do governo de ocupação informou que teria feito um empréstimo a Queiroz e que o referido depósito seria parte do pagamento. registrando ainda “que é amigo do ex-assessor do filho desde 1984”.

Escritório do Crime e o Clã Bolsonaro

Ronnie Lessa, Élcio Queiroz, Mad, Leléo e Macaquinho estão no catálogo de matadores de aluguel do Escritório do Crime, grupo de ex-agentes das forças de segurança que atuam na região de Rio das Pedras, zona oeste da cidade do Rio de Janeiro, há pelo menos 20 anos. Chefe da organização criminosa, Nóbrega era uma figura-chave para o esclarecimento de diversos crimes e também para a compreensão da relação do clã com as milícias cariocas.

O advogado do ex-agente do Bope, Paulo Emílio Catta Preta, em entrevista ao Globo, levantou a possibilidade de que seu cliente tenha morrido por saber demais. Porém, não especificou os segredos de Nóbrega. “Ele me disse assim: ‘doutor, ninguém está aqui para me prender. Eles querem me matar. Se me prenderem, vão matar na prisão. Tenho certeza que vão me matar por queima de arquivo’. Palavras dele”, afirmou o defensor.

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Amigos e aliados desde o Bope

A amizade também é a natureza da relação entre Adriano da Nóbrega e Queiroz, que se conhecem desde 2003, quando serviram juntos no 18º Batalhão da Polícia Militar do Rio de Janeiro (PMRJ). Justamente neste, Nóbrega recebeu a primeira homenagem de Flávio Bolsonaro na Alerj. A segunda viria em 2005, ano em que o ex-agente do Bope foi julgado e condenado por um júri popular, por conta de um homicídio. O miliciano não compareceu à premiação por estar preso.

Durante o seu julgamento, Nóbrega recebeu um apoio importante, do então deputado federal Jair Messias. Após a audiência que culminou na condenação do miliciano, o atual chefe do governo de ocupação chegou a usar até a tribuna da Câmara dos Deputados para defender o miliciano. “Ele sempre foi um brilhante oficial”.

Organograma das relações entre Bolsonaro e as milícias / Arte: Fernando Bertolo/Brasil de Fato

Em 2007, Nóbrega recorreu da decisão e foi inocentado. Em 2013, foi expulso da PM, por conta de seu envolvimento com o jogo do bicho.

Ronald Paulo Alves e o caso Beto Bomba

Outro importante personagem do Escritório do Crime, o major Ronald Paulo Alves, apontado por Beto Bomba como responsável por organizar o grupo de assassinos que executariam Marielle Franco e Anderson Gomes, também foi homenageado por Flávio Bolsonaro na Alerj.

Em 2004, o filho do chefe do governo de ocupação celebrou uma ação comandada por Alves que terminou com três mortes. Um ano antes, em 2003, o major teria participado da chacina de cinco jovens na boate Via Show, em São João de Meriti. Quatro policiais já foram condenados pelo caso e somente o agente condecorado por Flávio Bolsonaro ainda não foi julgado.

No último dia 15 de fevereiro, após a morte de Nóbrega, o chefe do governo de ocupação foi novamente questionado sobre suas relações com milicianos e negou qualquer vínculo. “Eu não conheço a milícia no Rio de Janeiro. Desconheço. Não existe nenhuma ligação minha com a milícia do Rio de Janeiro”, afirmou.

Ilustração.

Edição: Leandro Melito e João Baptista Pimentel Neto (para Diálogos do Sul)


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Redação Brasil de Fato

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