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Escarnio e extorsão das transnacionais no Panamá

Nils Castro

Tradução:

Construtoras ameaçam parar a obra de expansão do Canal do Panamá

Nils Castro* 
Os proprietários das construtoras transnacionais, Sacyr (espanhola) e Impregilio (italiana) estão cometendo um erro no Panamá que lhes custará mais caro do que imaginam. Fato nada raro entre as grandes transnacionais da construção, quando a obra de expansão do Canal do Panamá já estava avançada em 70 por cento, no final de dezembro apresentaram um ultimato à Autoridade do Canal do Panamá: ou pagavam, em prazo peremptório, uma soma tão enorme como engordada por supostos sobre-custos, ou eles paralisariam os trabalhos. Proceder que se assemelha a qualquer caso de extorsão.
Canal-do-Panama1-400x400Como explicar que esses cavalheiros, que foram tão hábeis em idealizar a melhor proposta de projeto praticam agora essa torpeza? Provavelmente tiveram péssima assessoria local. Pode ser que tenham pensado que, se o Panamá há mais de sete anos experimenta um notável crescimento econômico, é agora tem um governo demasiadamente liberal, que sem maiores cuidados reparte contratos diretos, aditamentos, subsídios e sobre-preços pagos através de diversos projetos estatais, não está na hora de tirar proveito sacar mais de um bilhão adicional?
Cabe supor que nem seus assistentes e amigos locais, nem o embaixador ibérico, tenham advertido que para os panamenhos o Canal e a entidade autônoma que o administra, não são uma recurso ou um investimento mais, mas sim a pupila dos olhos deste país. Nem os amos do consórcio, nem os apátridas nativos que os servem, têm o DNA nacional que se requer para perceber o que a empresa do Canal significa para a sensibilidade de uma nação que se formou como tal lutando por essa posse, desde os tempos da ferrovia inter oceânica e os enfrentamentos e massacres praticados pelos ianques há mais de meio século.
Lamentavelmente, a crise de finais dos anos 1980, a invasão militar estadunidense no Natal de 1989 e o tsunami neoliberal que veio em seguida, devastaram moralmente à República, até o extremo de que seu povo foi capaz de eleger um governo tão peculiar como o que agora reina no país. Porém, parafraseando a conhecida advertência de Omar Torrijos, não há mal regime que dure demasiado nem povo que o aguente. E a permissividade deste povo já está chegando a seu limite.
Claro que tal consórcio transnacional tem recursos de sobra para gastar na compra de porta-vozes e versões com que enganar a opinião pública local e estrangeira. Porém, como Panamá é um país que é grande por suas proezas históricas mas pequeno de tamanho, logo se espalhou que determinados membros da Junta Diretora da Autoridade do Canal tinham “recebido chamadas”. E nos  meios de comunicação, por sua vez, já aparecem os “especialistas” alarmando com o suposto desastre financeiro que a demora nas obras de ampliação do Canal ocasionaria ao país, ou engenhando-se para desacreditar as motivações da firmeza moral e técnica da administração do Canal.
O que não dizem é que os atrasos reais na obra se deve a uma deficiente administração dos trabalhos, ou que a atual lentidão com a que querem chantagear a empresa panamenha.
Não obstante, pouco vale o pretexto de que a licitação foi mal conduzida porque Sacyr já estava questionada no momento em que disputou, posto que o sócio mais forte e beligerante nesta maquinação é a próspera Impregilio, uma das maiores do mundo. E menos ainda alegar que o contrato deveria ter sido firmado com outro concorrente, posto que o “outro”, é a imperial Bechtel, cujo prontuário enrubesceria a qualquer competidor europeu (se alguém duvidar pode procurar, por exemplo, o historial dos sobre-preços praticados no metro de Boston). Como tampouco vale a desculpa de que se outorgou um contrato “secreto”, posto que, desde o início, este está disponível na página web da Administração do Canal, que há dois anos tem entregado cópias a quem solicite.
A Administração do Canal tem rechaçado com tranquilidade todas pressões e ameaças. E se fora pouco, reitera que se o consórcio persistir na soberba de seu erro, a Autoridade do Canal tem condições de terminar a obra sem as demoras com as quais os porta-vozes (oficiais ou oficiosos)  do consórcio procuram intimidar aos panamenhos e à navegação mercantil. No que se refira à negociação Panamá já teve êxito diante de contra-partes muito mais poderosas e em tempos mais difíceis. Se agora a empresa do Canal assumir e concluir a obra sob sua própria responsabilidade, nosso país voltará a ganhar o prestígio que sempre teve.
Por outro lado, os maiores integrantes do consórcio conquistarão todo o desprestígio que merecem. E quanto a seus corifeus, os mais desprezíveis são aqueles que anteriormente se opuseram ao projeto de expandir o Canal, que se equivocaram e agora procuram com que justificar seus antigos argumentos, sem perceber que com isso, mais que justificar, ignoram as deficiências do consórcio e sua tentativa de chantagear nossa nação.
O caso mais grave é o dos que aceitam as “propinas” das transnacionais que capitaneiam o consórcio. Por mais suculentas que sejam, ao recebe-las condenam suas famílias a longas vergonhas, pois passarão à memória do país não como meros vendilhões mas como traidores da pátria. Ignora que implicações legais isso poderá ter, mas seu escárnio será interminável.
*Da equipe de colaboradores de Diálogos do Sul


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Nils Castro Um dos mais prestigiados intelectuais da região. É autor do livro “As esquerdas latino-americanas em tempo de criar”

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