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Esqueletos no armário: Além de assediar sexualmente suas funcionárias, Andrew Cuomo escondeu mortes por Covid em NY

Andrew Cuomo, governador de Nova York, anunciou sua renúncia nesta terça-feira (10) motivado por inúmeras denúncias de assédio sexual
David Brooks
La Jornada
Nova York

Tradução:

*Atualização em 10.08.2021, às 17h51: Andrew Cuomo, governador de Nova York, anunciou sua renúncia nesta terça-feira (10) motivado por inúmeras denúncias de assédio sexual. O democrata sofreu pressão de deputados federais e senadores de seu partido para que renunciasse. Em 14 dias, sua vice, Kathy Hochul, assumirá o comando do país.

Andrew Cuomo é parte da aristocracia democrata deste país. Há alguns meses, foi declarado herói nacional por seu manejo da luta contra a Covid-19, a qual enfrentou e intimidou o então presidente Donald Trump, mas de repente está se convertendo em persona non-grata e agora enfrenta a pior crise de sua destacada carreira política — em grande medida por culpa de algo que foi identificado pelo antigos gregos:  altivez.

Arrogante sempre foi, e não lhe importava que o acusassem de ser “valentão” político —d e fato, lhe dava orgulho — até que ele mesmo caiu vítima de sua própria vaidade ao aparentemente cometer dois pecados: possivelmente enganar o público sobre seu manejo tão elogiado da pandemia e comportamento abusivo com mulheres em plena era #MeToo.

Filho mais velho de Mario Cuomo, o governador de Nova York e estrela nacional do Partido Democrata, Andrew Cuomo rapidamente escalou aos níveis mais altos do cenário político nacional, incluso considerado como possível candidato presidencial. Por algum tempo casado com Kerry Kennedy, filha de Robert Kennedy e parte do mais próximo da realeza política dos Estados Unidos, foi secretário de Moradia e Desenvolvimento Urbano no governo de Bill Clinton, e governador desde 2011 do Estado de Nova York, e presidente da Associação Nacional de Governadores.

Após pedir a renúncia do cargo, sua carreira agora está em xeque por um par de crises que apareceram como relâmpagos, e agora ele se encontra cada vez mais isolado e pela primeira vez não tem o controle de seu destino. 

Há algumas semanas, Cuomo foi golpeado com revelações de que seu governo fracassou em reportar milhares de mortes por Covid-19 nos asilos para anciãos e pouco depois autoridades estaduais o reconheceram ao agregar mais de 3.800 mortes mais ao seu saldo — algo que representa um incremento de 40% do reportado antes. 

Agora o assunto está sob investigação pela procuradora geral do estado, Letitia James e, além disso, por separado, pelo Escritório Federal de Investigações (FBI) e pela promotoria federal. 

Com isso, foi danificada de imediato a reputação de Cuomo como um político em controle e honesto em seu manejo da crise de saúde, algo que havia sido elogiado no nível nacional. 

E ainda mais, o New York Times revelou que alguns de seus assessores poderiam haver alterado as cifras entregues pelas autoridades de saúde pública estadual para minimizar o prejuízo político que isto poderia implicar para a imagem de Cuomo. Isso provoca perguntas não só sobre se Cuomo  sabia disso, mas também sobre se o encobriu. 

Andrew Cuomo, governador de Nova York, anunciou sua renúncia nesta terça-feira (10) motivado por inúmeras denúncias de assédio sexual

Mike Groll / Governo de Nova York
Andrew Cuomo, governador de Nova York é parte da aristocracia democrata

Pouco depois explodia outra crise que pelo momento é ainda mais perigosa para sua carreira: três mulheres apresentaram, separadamente, queixas de fustigamento sexual e outros tipos de comportamento inaceitáveis por parte do governador em anos recentes.  

A primeira, uma ex-assessora, Lindsey Boylan, acusou em fins de fevereiro ao seu ex-chefe de várias interações incômodas sem consentimento, a partir de 2016, incluindo um beijo não bem-vindo em seu escritório em 2018. Ela deixou o emprego pouco depois.  

Uns dias depois dessa acusação, outra mulher, Anna Ruch, acusou de que havia se encontrado pela primeira vez com Cuomo em um casamento, em 2019, e que ele a tocou de maneira não convidada e lhe perguntou se podia beijá-la – pior ainda, há uma foto do governador tocando a cabeça de Ruch nessa festa.  

Por sua vez, uma terceira mulher, Charlotte Bennett, acusou a seu ex-chefe Cuomo de fustigamento sexual queixando-se de que ele lhe perguntava sobre sua vida sexual e se estaria interessada em sexo com um homem mais velho. Bennett, que qualificou Cuomo com “um abusador” clássico, apelou a que se somem outras mulheres que poderiam haver sofrido coisas parecidas em mãos do governador. 

Cuomo respondeu em público, depois de guardar um silêncio pouco comum, na quarta-feira passada, declarando que “agora entendo que agi de uma maneira que fez sentir incômodas as pessoas…não foi intencional e verdadeira e profundamente ofereço desculpas por isso”. 

Ao mesmo tempo, pediu para o público esperar as conclusões de uma investigação independente que será contratada pela procuradora James, o que poderia durar meses, mas que potencialmente poderia culminar com a destruição política de Cuomo, sobretudo se forem descobertos ainda mais casos.  

De fato, neste sábado outras duas mulheres revelaram interações que qualificaram como impróprias com o governador em anos recentes, enquanto vários ex-funcionários de Cuomo desde seus tempos como secretário da Moradia, e de tempos mais recentes, comentaram ao Washington Post que ele havia criado um ambiente de trabalho “hostil e tóxico”. 

Por sua parte, Cuomo assegurou neste domingo que não tinha nenhuma intenção de renunciar, e que fazê-lo seria “antidemocrático”. Mas pelo simples fato de ter tido que dizer isso demonstra que não conseguiu controlar essa crise. 

Cuomo agora se encontra cada vez mais isolado politicamente. No domingo, os dois democratas de maior posto na legislatura lhe retiraram seu apoio, com a líder do Senado, Andrea Stewart-Cousins se convertendo na primeira do partido do governador a sugerir que deveria renunciar “pelo bem do estado”. 

Alguns políticos estaduais dizem que o poder massivo do governador está se desvanecendo rapidamente, indicam que a arrogância, a agressividade e a intimidação com que conquistou o poder agora resulta em que não necessariamente está encontrando muito amigos no momento mais vulnerável de sua carreira. 

Sua carreira política, financiada por interesses poderosos incluindo, por exemplo, os “fundos abutres” (hedge funds), com os quais promoveu uma semi-privatização da educação pública entre outras coisas, enquanto consolidou o apoio de setores liberais com sua legalização exitosa do matrimônio gay e do uso da maconha para fins medicinais, não necessariamente se manterá leal diante de seu desmoronamento pessoal.

Ao mesmo tempo, muitos advertem que Cuomo tem talento e astúcia política para sobreviver a isso e até ganhar uma reeleição. Mas isso depende muito de que não se apresentem mais denúncias sobre seu comportamento com mulheres e/ou evidência de que encobriu aspectos de seu manejo da pandemia. 

*Tradução: Beatriz Cannabrava


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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David Brooks Correspondente do La Jornada nos EUA desde 1992, é autor de vários trabalhos acadêmicos e em 1988 fundou o Programa Diálogos México-EUA, que promoveu um intercâmbio bilateral entre setores sociais nacionais desses países sobre integração econômica. Foi também pesquisador sênior e membro fundador do Centro Latino-americano de Estudos Estratégicos (CLEE), na Cidade do México.

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