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Estratégia agressora do TIAR tem como propósito provocar uma guerra civil, diz analista

Tratado foi um mecanismo para apoiar golpes de Estado e intervenções militares na América Latina por razões ideológicas
Carmen Esquivel
Prensa Latina
Havana

Tradução:

Sete décadas depois do surgimento do TIAR, a decisão da Organização dos Estados Americanos (OEA) de ressuscitar um mecanismo obsoleto constitui um perigo para a América Latina, porquanto esse instrumento tem sido invocado historicamente para legitimar intervenções militares.

O Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR), também conhecido como Tratado do Rio, foi imposto ao continente pelos Estados Unidos em 1947, pouco depois de terminada a II Guerra Mundial, e no contexto da  Guerra Fria contra a União Soviética.

Segundo a letra desse pacto, um ataque armado a um Estado americano seria considerado como uma agressão contra todos os países da região e, como consequência, cada uma das partes contratantes se comprometia a fazer-lhe frente no exercício do direito de legítima defesa individual ou coletiva reconhecida no artigo 51 da Carta da ONU.

Mas, na prática, o TIAR jamais funcionou como instrumento de defesa, mas tudo o contrário. Foi um mecanismo para apoiar golpes de Estado e intervenções militares na América Latina por razões ideológicas.

Assim sucedeu, por exemplo, quando em 1954 a Guatemala foi invadida por mercenários organizados pela Agência Central de Inteligência (CIA), dos Estados Unidos, que provocaram o derrocamento do governo de Jacobo Arbenz.

O TIAR e a Organização dos Estados Americanos legitimaram a invasão mercenária contra Cuba por Playa Girón em 1961; assim como as intervenções militares norte-americanas contra a República Dominicana (1965), Granada (1983) e o Panamá (1989).

A OEA não se comoveu com as assassinatos torturas e desaparecimentos de milhares de opositores durante a época das ditaduras, nem quando do golpe de estado no Chile, em 1973, contra o governo de Salvador Allende.

Na teoria, o tratado interamericano propunha que no caso de uma nação ser ameaçada por uma potência extracontinental seriam analisadas medidas para protege-la. No entanto, durante a intervenção britânica das Ilhas Malvinas, em 1982, os Estados Unidos se puseram do lado do Reino Unido.

Quando ainda estão frescos na memória muitos daqueles acontecimentos, países membros da OEA se somaram aos Estados Unidos na cruzada para ativar o TIAR contra a Venezuela, sob o pretexto de que “a crise venezuelana é uma ameaça à paz e à segurança regional”.

Vários governos, não só da América Latina, mas também de outras partes do mundo, expressaram sua preocupação pelas consequências que pode trazer para a região a tentativa de ressuscitar um mecanismo que contempla o uso da força militar.

Invocar o TIAR pela Venezuela é uma ameaça também para qualquer outra nação na América Latina, alertou o chanceler mexicano, Marcelo Ebrard, cujo país se retirou desse pacto em 2002.

Cuba, por sua parte, advertiu de que se trata de uma deliberado intento por provocar uma situação que poderia desencadear no uso da força para derrocar o governo legítimo do presidente Nicolás Maduro, em oposição aberta aos princípios do Direito Internacional e a Proclamação da América Latina e do Caribe como Zona de Paz.

Na Rússia, a porta-voz do ministério de Assuntos Exteriores, María Zakharova, considerou que a ativação do TIAR contra a Venezuela poderia entranhar consequências graves para a segurança regional e a estabilidade da América do Sul.

Após considerar que a decisão representa um precedente gravíssimo em matéria de direito internacional, o Uruguai anunciou sua retirada desse mecanismo. “Saímos do Tratado por obsoleto, não condizente, por uso não apropriado do mesmo”, afirmou o chanceler uruguaio, Rodolfo Nin Novoa, e agregou que seu país não compartilha o fato de que se possa estudar um intervenção na Venezuela.

Tratado foi um mecanismo para apoiar golpes de Estado e intervenções militares na América Latina por razões ideológicas

Martí Notícias
A invocação do TIAR foi feita pela Colômbia

Porque a Venezuela abandonou o TIAR em 2012?

A Venezuela ingressou ao Tratado Interamericano de Assistência Recíproca em 1948, um ano depois desse pacto ser instituído em 2 de setembro de 1947 no Rio de Janeiro.

Em 2012, durante uma assembleia da OEA, o presidente Hugo Chávez anunciou a retirada de seu país desse instrumento, posição seguida por outros membros da Aliança Bolivariana para os Povos de Nossa América (ALBA), entre eles Bolívia, Equador e Nicarágua.

“Nossos países tomaram a decisão de enterrar o que merece ser enterrado, de jogar na lata de lixo o que já não tem serventia”, disse naquela ocasião o então chanceler equatoriano, Ricardo Patiño.

Sete anos depois, a Assembleia Nacional em desacato da Venezuela, presidida pelo autoproclamado presidente Juan Guaidó, aprovou a reincorporação do país ao TIAR, decisão declarada nula pela Sala Constitucional do Tribunal Supremo de Justiça (TSJ), que qualificou esse fato como “um assalto ao Estado de Direito e a todos os poderes públicos do Estado”.

Recordou o TSJ que a Venezuela formalizou sua saída da OEA em 27 de abril de 2019 e que, segundo o artigo 236 da Constituição, todos os tratados, convênios ou acordos internacionais devem ser ratificados pelo presidente da República, neste caso Nicolás Maduro. 

O que se pretende com a reativação do TIAR?

Para o jornalista e pesquisador do Centro Mundial de Estudos Humanistas, Javier Tolcachier, o objetivo é abrir a porta a um escalada bélica contra a Venezuela, apresentando como escusa algum ataque de falsa bandeira na fronteira com a Colômbia ou alguma escaramuça provocada por mercenários, ou paramilitares. 

De acordo com o analista a estratégia agressora tem o mesmo propósito tentado anteriormente por outros métodos: desatar uma guerra civil e estabelecer um governo fantasma em alguma porção territorial venezuelana.

Caso se verifique um cenário de tais características, as consequências para ambos os povos e para a região inteira seriam devastadoras, opina Tolcachier, e agrega que nada faz imaginar uma guerra relâmpago, muito menos um golpe de mão incruento, mas sim um conflito prolongado que teria severas implicações internacionais. 

O especialista em comunicação política, Arlenin Aguillón, coincide em que com o aval do TIAR trabalha-se para construir um incidente que justifique uma ação militar. 

Consciente da ameaça do uso da força para tentar derrocar o governo legítima, o ministro da Defesa da Venezuela, Vladimir Padrino, advertiu que um desenlace dessa natureza teria nefastas consequências para toda a América do Sul, convertendo-a contrariamente em uma zona de guerra”. 

A Força Armada Nacional Bolivariana reiterou sua vocação pacifista, mas ao mesmo tempo ratificou seu caráter anti-imperialista e sua inquebrantável resolução de defender a soberania e a independência, até perder a vida si for necessário. 

*Editora Chefa de Prensa Latina.

**Tradução: Beatriz Cannabrava

***Prensa Latina, especial para Diálogos do Sul — Direitos reservados.

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.
Carmen Esquivel

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