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EUA apoiam os primeiros reatores nucleares em 30 anos

Revista Diálogos do Sul

Tradução:

Carey L. Biron*

A energia nuclear fornece cerca de um quinto da eletricidade nos Estados Unidos, mas desde 1979 não são construídos reatores no país. Foto: Bigstock A energia nuclear fornece cerca de um quinto da eletricidade nos Estados Unidos, mas desde 1979 não são construídos reatores no país. Foto: Bigstock

O governo dos Estados Unidos anunciou que dará substanciais garantias de crédito a dois novos reatores nucleares, no que representa um grande impulso ao primeiro projeto de energia atômica neste país em mais de três décadas. A indústria nuclear, preocupada por sua viabilidade no atual panorama energético mundial, comemorou o anúncio.

No entanto, organizações ambientalistas o condenaram e alertaram que as autoridades não aprenderam as lições dadas pelos últimos desastres nucleares, acrescentando que esse tipo de projeto é de grande risco para os contribuintes. As garantias de crédito, de US$ 6,5 bilhões, têm por finalidade revitalizar a indústria nuclear, explicou o secretário de Energia, Ernest Moniz, que no dia 20 deste mês visitou o Estado da Geórgia, onde serão construídas as duas usinas.

“A construção de novas instalações de energia nuclear, não é apenas um grande marco no compromisso da administração (de Barack Obama) com o impulso à indústria de energia atômica”, disse Moniz a jornalistas. “Também é parte importante de nosso enfoque integral da energia norte-americana, conforme avançamos para um futuro baixo em carbono”, acrescentou.

O governo aprovou provisoriamente os empréstimos há quatro anos, e se esperava que fossem concretizados em 2012. Um crédito para um terceiro projeto continua em fase de negociação. Porém, o polêmico fracasso de uma companhia de energia solar que havia recebido apoio do governo federal levou as autoridades a congelarem os planos.

O capital privado mostrou, em geral, pouco interesse por esses projetos, devido ao fato de ainda se recuperar da recessão de 2008 e também pelos ecos do desastre na central nuclear japonesa de Fukushima, em 2011. O Departamento de Energia promove agora um novo desenho de reator que será usado nos dois projetos, e que em parte se difere por ter um sistema de desligamento automático em caso de emergência.

Entretanto, organizações ambientalistas afirmam que as iniciativas continuam sendo perigosas. “Temos especial preocupação com esse projeto. Fomos parte de uma iniciativa contra ele depois do desastre de Fukushima, e os Estados Unidos ainda não apreenderam as lições dessa experiência”, declarou à IPS a ativista Katherine Fuchs, da organização Amigos da Terra.

“Só na semana passada tivemos um terremoto na Geórgia e outro na Carolina do Sul (Estado próximo), que ilustra os contínuos riscos que devemos considerar”, acrescentou a responsável por campanhas contra os subsídios à energia nuclear. Para Fuchs, “é significativo que se trate das duas primeiras usinas construídas em décadas. Há razões muito boas para isso, especialmente questões econômicas e de segurança”.

Embora a energia nuclear continue produzindo cerca de um quinto da eletricidade do país, o último ciclo de construções de reatores terminou abruptamente em 1979. Em março daquele ano, um reator no Estado da Pennsylvania derreteu parcialmente em razão de vários fatores: projeto deficiente, mau funcionamento técnico e erros humanos em seu manejo.

Oficialmente nunca foi registrado nenhum efeito na saúde pública depois da liberação de material radioativo, mas o incidente motivou importantes mudanças nas regulamentações e nos sistemas de vigilância nas usinas nucleares. Desde então entraram em funcionamento outras usinas, a última em meados da década de 1990, como parte de um projeto iniciado nos anos 1970.

Contudo, tanto o governo federal quanto o setor privado se focam em outras fontes de energia. Em um contexto de auge das novas tecnologias de fracking (fratura hidráulica), que permitem acesso a depósitos de gás natural antes inalcançáveis, os investimentos exigidos para construir um novo reator atômico, estimados por alguns em cerca de US$ 9 bilhões, são cada vez mais considerados proibitivos.

Só no ano passado foram fechadas quatro usinas atômicas nos Estados Unidos, devido a problemas de viabilidade financeira, e Fuchs observou que vários planos para novos reatores foram arquivados. Investidores de Wall Street teriam se negado a participar dos projetos da Geórgia, o que tornou crítico o apoio do governo. Mas alguns alertam que as usinas representam um risco muito grande para os contribuintes.

“A construção dos dois novos reatores tem 21 meses de atraso e ultrapassou o orçamento em US$ 1,6 bilhão”, pontuou Allison Fisher, diretora de extensão para o programa de energia do grupo independente Public Citizen.

Isso “coloca em xeque a questão da decisão de assegurar esse projeto arriscado com dólares dos contribuintes”, afirmou Fisher, ressaltando que a tecnologia usada “continua apresentando inúmeros problemas de segurança e produz lixo tóxico para o qual ainda não há solução. Dificilmente se trata de uma tecnologia que o governo deva promover e apoiar com dinheiro dos contribuintes”.

A reação da indústria nuclear destacou a importância do apoio do Departamento de Energia para estes projetos. No dia 20 deste mês o Instituto de Energia Nuclear, uma associação comercial, qualificou o anúncio governamental de “histórico”.

O presidente do Instituto, Marvin Fertel, em declaração enviada à IPS disse que “o acordo demonstra o reconhecimento da administração de Obama ao papel estratégico que deve ter o setor nuclear em uma política de sucesso em energias limpas. O programa de garantia de empréstimos atuará como catalisador para acelerar a construção de fontes de eletricidade não emissoras, ou com baixa emissão de carbono, como as usinas atômicas”.

Como disse Fertel, as novas garantias de empréstimos procedem de uma partida de dinheiro criada pelo Congresso em 2005 para apoiar tecnologias “inovadoras” no setor energético. Ao anunciar o acordo, o governo o apresentou como uma forma de promover as energias limpas.

Os novos reatores “produzirão eletricidade limpa suficiente para mais de 1,5 milhão de moradias”, disse em um blog Peter W. Davidson, funcionário desse departamento. “Ao mesmo tempo, esse projeto ajudará a combater a mudança climática, mantendo cerca de dez milhões de toneladas de dióxido de carbono fora da atmosfera. É como tirar das ruas dois milhões de veículos”, destacou.

O debate sobre o impacto da energia nuclear no aquecimento global cresceu dentro da comunidade ambientalista nos últimos anos. Para alguns grupos, é enganoso apresentar a energia atômica como uma alternativa não contaminante. “A energia atômica não é limpa”, ressaltou Fuchs. “Não há forma de lidar com os dejetos e ainda não contamos com projetos seguros ou regulamentações adequadas. É completamente equivocado incluir a energia nuclear entre as energias verdes, e é incrível que a administração diga tal coisa”, enfatizou.

*IPS de Washington, Estados Unidos, para Diálogos do Sul

 


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

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