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EUA e Israel querem expandir guerra no Oriente Médio e justificar confronto com Irã

“O cenário não poderia ser pior”, afirma André Martin, professor de Geopolítica da USP. Porém, vaticina: A Palestina vai ser vitoriosa
Amaro Augusto Dornelles
Diálogos do Sul
São Paulo (SP)

Tradução:

“Creio no kapital que governa matéria e espírito”, Paul Lafargue*

Setores da economia e do próprio governo da segunda maior potência nuclear da Terra, os EUA, não aprovam a Casa Branca tão atuante no conflito de Israel, como vem ocorrendo: “Tal caminho estaria sendo prejudicial aos interesses do país, graças a essa ligação absurda com o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu”, interpreta André Martin, professor de Geopolítica da USP. A desaprovação estaria crescendo visivelmente — enquanto Israel investe na ampliação da guerra.

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Através do Departamento de Defesa estadunidense (DOD, na sigla em inglês), o Pentágono revelou recentemente ter condições de sustentar três frentes de guerra ao mesmo tempo: China-Taiwan, Oriente Médio e Ucrânia. Detalhe: para a Casa Branca, isso é possível desde que taiwaneses, israelenses e ucranianos morram pelos soldados estadunidenses.

“Ou seja, eles fornecem armamento, material, logística, desde que os mortos sejam os outros”, explica Martin, também pesquisador da história das Forças Armadas do Brasil. Nesta conversa com a Diálogos do Sul, ele alinha fatos e interpretações ‘fora do foco’ da mídia e das redes antissociais.  

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Destaques:

* EUA buscam estender a guerra para provocar a entrada de novos atores e ter a possibilidade de lutar contra o Irã;

* Vão continuar tentando expulsar a população palestina de Gaza;

* Trata-se da maior catástrofe desde o holocausto;

* Perigo de uma guerra mundial se eleva a um nível absurdo;

* É hora de articular movimentos de massa contra a guerra.

Confira a entrevista.

* * *

Guerra expandida

Amaro Augusto Dornelles | Diálogos do Sul – No ataque aos arredores de Damasco, em 20 de janeiro, atingiu um acampamento do Irã. Um importante chefe militar iraniano foi morto, ao que consta.

O ataque prova e deixa bem evidente o interesse de Israel de engajar, provocar uma reação do Irã no conflito.

A prova material…

Exato. Israel mantém os ataques ao sul do Líbano, na Síria, ou seja: eles agem para estender a guerra, de preferência com o Iraque junto. Afinal, seu parceiro tem bases militares nesses países. É uma situação onde se observa o crescimento das tensões cada vez mais forte.

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Ora, os estadunidenses querem defender o bem-estar de seus conterrâneos e para tanto seguem com suas tropas de prontidão.  Mas no país já tem muita gente falando que a Casa Branca não deveria se meter tanto assim no conflito de Israel como vem ocorrendo. Estaria sendo prejudicial para os interesses deles, graças a essa ligação absurda com o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu. Esse movimento está crescendo visivelmente. Israel investe na ampliação da guerra.

Assista na TV Diálogos do Sul

Em recente entrevista, você alertou para o crescente descontentamento da população, de origem árabe, com a passividade do governo egípcio diante da faxina étnica na Faixa de Gaza.

E a temperatura continua a subir. De todos os países fronteiriços, vejo o Líbano e a Síria como mais consolidados politicamente do que o Egito. O poder no Egito não está lá muito consolidado. O atual governo não tem apoio popular, é um governo militar. Acredito que esteja na hora da onça – leia-se, o presidente general, Abdel Fattah Saeed Hussein Khalil as-Sisi – beber água. (Desde 2014 Sisi é chefe das Forças Armadas e ministro da Defesa do país, segundo a Wikipédia.)

Ele vem sendo encurralado por Israel, desde o começo. O general é muito condescendente com os israelenses. Isso vem deixando o povo árabe insatisfeito. Sisi terá de responder agora se vai aceitar essas pessoas que estão na fronteira. Essa gente toda será empurrada para o Sinai mesmo? O Egito aceitará o desejo de Israel? Vão morrer todos, qual vai ser o resultado?

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É possível projetar quanto tempo os árabes podem retardar um caminho que parece já estar traçado? 

Cinicamente, israelenses dizem que precisam de mais dois meses para limpar completamente a área. E para destruir o Hamas. Isso significa dizer que eles têm encontrado mais dificuldades do que previam, além das baixas que não esperavam ter. O Hamas não está derrotado. Aliás, este é o maior problema enfrentado.

Veja, a população não fugiu da guerra. Ela quer ficar na Faixa de Gaza destruída, preferem permanecer na sua Gaza por amor à terra. É um jogo duro para Israel. A população toda tem vontade nacional, como os palestinos têm demonstrado. Essa vontade é irrefreável.

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“O cenário não poderia ser pior”, afirma André Martin, professor de Geopolítica da USP. Porém, vaticina: A Palestina vai ser vitoriosa

Foto: U.S. Embassy Tel Aviv
"Para piorar as coisas, o Pentágono assume publicamente que os EUA têm condições de sustentar três frentes de guerra", afirma André Martin




Agressores impunes

Dando o próprio sangue para sustentar uma guerra desigual, considerada a mais letal da história…

São 13 milhões de palestinos no mundo. A causa deles é o Estado Palestino e algum dia ela será vitoriosa. Pode demorar um pouco mais, um pouco menos, mas ela será vitoriosa. Agora estamos em um embate decisivo. Por quê? Ora, Israel não pode continuar impune. E os países árabes vão ter de tomar uma posição. As coisas não podem seguir dessa forma.

Acho inclusive que – do ponto de vista diplomático – a liga árabe deveria dar um ultimato para parar com os bombardeios. Eles continuam tentando expulsar a população palestina de Gaza. Trata-se da maior catástrofe desde o holocausto.

Mas historicamente os árabes estão cada vez mais longe da unidade…

Eis a grande questão. Mas a atitude correta é essa. Seria o recado suficiente para EUA e Israel sentirem alguma reação.  Como os ‘aliados’ agiriam diante disso? Agora, enquanto permanecem impunes, eles podem fazer o que bem entender. Como jogar bombas em populações civis, atingir crianças palestinas, idosos.

Os argumentos sempre estão prontos: “mas os túneis passam por baixo da terra, onde terroristas se escondem; fazem escudos humanos. Enquanto as coisas estiverem assim, nós não temos culpa. Então, como temos que matar o Hamas, temos de matar toda a população palestina. 

Afinal eles estão misturados”. Puro cinismo e desumanidade. Chegamos ao fundo do poço e o Ocidente está completamente desmoralizado. Joe Biden mais ainda. Ele é um presidente totalmente desmoralizado no mundo e dentro do próprio país. Cada vez pior. É muito sério o que está acontecendo. É um caso de desgoverno, creio. Eles só querem saber de financiar guerras…

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Paz não interessa

Tem sua lógica: nada como o caos para receber um presidente com os predicados de Donald Trump…

Realmente, o cenário não poderia ser pior. Mas terminarei com uma informação que poucos têm. Para piorar as coisas, o Pentágono assume publicamente – mandou esse recado para o povo estadunidense – que tudo está indo bem nas guerras, e que eles têm condições de sustentar as três frentes de guerra: China-Taiwan, Oriente Médio-Israel e Ucrânia. Isso, desde que taiwaneses, israelenses e ucranianos morram por eles, ianques…

Assim, eles, os maiores fabricantes de armas do globo, têm condição de enfrentar uma guerra em três frentes. Ou seja, eles fornecem armamento, material, logística, desde que os mortos os outros. Veja bem, se o Pentágono pensa isso, imagine o que se passa na cabeça de quem ouve tal notícia? Não precisa falar mais nada.

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Mas como isso se tornou público? Noticiário? Vazamento? 

São públicas. Foi um general estadunidense que assumiu isso. É possível acessar no setor de defesa dos EUA: U.S Department of Defense, DOD. É mais uma evidência de que eles não estão interessados em paz. A coisa ainda se complica mais quando observamos que 4% do PIB mundial está indo para a guerra, armas, exército. Aqui a gente fica indignado quando sabemos que os militares recebem tanto dinheiro – em um orçamento tão pequeno. É preciso entender que o mundo está cada vez mais perto da guerra total.

Nesse contexto, gastar mais em armas do que na educação, como consta do orçamento do Brasil para 2024, se justificaria?

Na atual circunstância, sim. Porém, antes de mais nada é necessário mudar a maneira como administramos as Forças Armadas, mas isso fica para outra hora. Vivemos tempos de guerra. A propósito, você sabe que em 1936 o coronel Nery da Fonseca, gaúcho, escreveu um texto no qual dizia: “Não há no mundo nenhum país mais cobiçado e desarmado do que o Brasil”!? Isso ainda é válido para mim.


Referência

* “A Religião do Capital” – Paul Lafargue (genro de Karl Marx), 27/5/1891). Livraria Sebo Perdizes: 11 9 4963 1897.


Amaro Augusto Dornelles | Jornalista e colaborador na Diálogos do Sul.


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.
Amaro Augusto Dornelles

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