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Facções criminosas não nasceram por geração espontânea. São produtos do sistema

Qualquer pacto deve ir ao fundo do problema com uma perspectiva de longo prazo e o compromisso de fazer as mudanças necessárias
Carolina Vásquez Araya
Diálogos do Sul Global
Cidade da Guatemala

Tradução:

Em dias recentes, um dos temas candentes tem sido a suposta abertura de diálogo entre o governo salvadorense e as quadrilhas, grupos criminosos temidos pela sociedade centro-americana em virtude de seu poder e a extrema crueldade de seus atos.

Imagens de jovens tatuados e semidespidos em filas perfeitas ou confinados em jaulas, percorrem as redes sociais e os meios de comunicação para pôr diante do olhar coletivo uma das grandes ameaças contra a paz social.

Incapaz de compreender a dimensão dos problemas e muito menos de digerir as causas de sua origem, a cidadania se une para condenar e exigir medidas extremas tendentes a “acabar com a peste”.

Numerosos têm sido os estudos e pesquisas dirigidos a entender porque esses meninos, adolescentes e jovens adultos entram nos bandos.

Mesmo quando resulta óbvio que se trata de quadro de abandono, pobreza e incapacidade do sistema para satisfazer as necessidades mais urgentes das novas gerações, quem observa o fenômeno à distância costuma ser mais inclinados a condenar do que buscar as origens deste drama humano.

No entanto, basta der uma olhada ao cenário no qual se desenvolve esta patologia social para compreender quanta responsabilidade recai na sociedade por sua atitude permissiva para a corrupção óbvia de suas autoridades e daqueles que manejam os bastidores do poder econômico. 

Qualquer pacto deve ir ao fundo do problema com uma perspectiva de longo prazo e o compromisso de fazer as mudanças necessárias

Prensa Libre
Incapaz de compreender a dimensão dos problemas e muito menos de digerir as causas de sua origem, a cidadania se une para condenar

Carentes de oportunidades de educação e, portanto, da possibilidade de ganhar a vida de maneira digna, estas crianças e jovens são facilmente recrutados por grupos criminosos – alguns dos quais são inclusive coordenados por elementos da polícia e do exército – com a promessa não apenas  de ganhar o sustento, mas também de ter a proteção do grupo.

Nos países que conformam o corredor da droga, as quadrilhas controlam bairros inteiros onde se concentram a venda de varejo e as milícias, atividades administradas por organizações vinculadas a personagens-chave em esferas mais elevados e, portanto, intocáveis.

Ao analisar a dimensão e o alcance do problema apresentado por este fenômeno das quadrilhas, uma primeira consideração é de que modo um governo poderia alcançar um acordo de paz sem ir à própria origem, reparando de maneira contundente todos os vazios e os abandonos cujas consequências têm gerado uma divisão tão profunda como letal nas sociedades centro-americanas.

Porque não se trata de acalmar o câncer com chá de melissa, mas sim de iniciar um processo amplo de reparação profunda das feridas causadas a estas sociedades marcadas pela miséria de grandes segmentos de sua população e, sobretudo, com um enfoque de integração – por parte das instituições de Estado – para as novas gerações. 

Com o propósito de iniciar um processo de cura da sociedade, é imperativo compreender que as quadrilhas não nasceram por geração espontânea, mas que são produtos da corrupção imperante no sistema político e econômico imposto por outros bandos interessados: um empresariado irresponsável, um sistema de justiça inoperante, uma assembleia legislativa aliada com aqueles que sangram seus países e governantes incapazes de compreender os alcances de sua responsabilidade com o futuro da nação.

Diante deste enorme desafio, qualquer pacto deve ir ao fundo do problema com uma perspectiva de longo prazo e o compromisso de fazer as mudanças necessárias para que nunca mais um menino ou jovem tenha que assassinar para comer.

Carolina Vásquez Araya colaboradora da Diálogos do Sul desde a Cidade da Guatemala

Tradução: Beatriz Cannabrava /Ana Corbusier


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Carolina Vásquez Araya Jornalista e editora com mais de 30 anos de experiência. Tem como temas centrais de suas reflexões cultura e educação, direitos humanos, justiça, meio ambiente, mulheres e infância

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