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ToggleUma facção de militares derrubou o governo do Gabão na manhã desta quarta-feira (30), em mais um golpe de Estado de cunho nacionalista em uma ex-colônia francesa no continente neste ano, e desta vez o primeiro fora da África Ocidental.
Aparentemente, o golpe conta com apoio da população. Imagens divulgadas por contas em mídias sociais mostram civis gaboneses nas ruas comemorando junto com comboios de soldados fardados. Soldados pedem para a população evitar saques e atos de vandalismo. Até a manhã de quarta-feira, não há notícias de mortos nem feridos.
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O Gabão era governado por Ali Bongo, que, segundo os resultados oficiais, tinha sido reeleito para um quarto mandato presidencial no pleito do último sábado (26).
Na apuração final, anunciada na madrugada desta quarta-feira, Bongo teria recebido 64,27% dos votos, enquanto o segundo colocado e principal líder da oposição, Albert Ondo Ossa, tivera 30,77%. Não houve observadores internacionais e acessos à internet e a transmissões internacionais de rádio e TV foram cortados durante a apuração, de acordo com a agência Reuters. O governo deposto também tentou impor um toque de recolher, que a população não respeitou.
O líder do golpe, segundo a imprensa gabonesa, é o general Brice Oligui Nguema, que até agora era o comandante da Guarda Republicana, responsável pela segurança da presidência. Mais cedo, em discurso televisionado, o tenente-coronel Ulrich Manfoumbi declarou: “Nós, o Comitê pela Transição e a Restauração das Instituições, decidimos defender a paz e pôr fim ao regime em vigor”.
“Nas últimas três eleições no Gabão, o governo restringiu o fluxo de informações alegando razões de segurança, mas o real motivo era impedir que jornalistas e observadores independentes acompanhassem a apuração”, comentou o cientista político ganês Michael Amoah, professor visitante da London School of Economics, em entrevista à TV Al Jazeera em inglês na manhã desta quarta.
Gabon 24
O general Brice Oligui Nguema é carregado por apoiadores em Libreville, a capital do Gabão
Prisão domiciliar
Os militares anunciaram que o presidente está mantido sob prisão domiciliar, suspeito de malversação de fundos públicos.
Horas mais tarde, a equipe de Ali Bongo divulgou um vídeo em que o político deposto, falando em inglês, afirma desconhecer a mudança de regime. “Não está acontecendo nada. Peço que vocês façam barulho, muito barulho”, disse.
Pobreza e desigualdade põem em risco paz, segurança e objetivos sustentáveis na África
Ali é filho de Omar Bongo, um dos líderes da independência do Gabão que governou de 1967 até sua morte, em 2009. Ele sucedeu o pai em eleições organizadas às pressas e foi reeleito em 2016 para um mandato de sete anos. Em 2018, sofreu um AVC quando estava em visita à Arábia Saudita e levou dez meses até voltar ao país natal.
Em 2019, militares gaboneses já tinham tentado derrubá-lo, numa quartelada que terminou em fracasso e repressão aos amotinados.
Primavera francófona
Esta é a terceira mudança de regime com apoio militar na África de língua francesa em menos de um ano. Em setembro de 2022, oficiais tomaram o poder em Burkina Faso, liderados por Ibrahim Traoré, que reivindica o legado do presidente socialista burquinabê Thomas Sankara, assassinado em 1987. E, no final de julho, o general Abdoulrahmane Tiani derrubou o governo no Níger prometendo redirecionar a economia do país, um dos maiores exportadores de urânio, em favor da população local.
“Esta é uma primavera francófona”, acrescentou Michael Amoah à Al Jazeera: “Há um sentimento anti-francês como fator dominante nesses processos, do Mali a Burkina Faso, no Níger e, agora, no Gabão. Se olharmos para o continente africano, exceto por Uganda, que é anglófona, e a Guiné Equatorial, que é hispânica, todas os países onde há governos presidenciais estendidos são de língua francesa, como nos Camarões, em Ruanda e no Togo, por exemplo. Esses chefes de estado ficam governando por décadas. Nos Camarões, o atual governo está há mais de 21 anos, no Togo, deve obter um quinto mandato em 2025, e por aí vai. E as pessoas estão cansadas dessa influência francesa, que acoberta corrupção e desvio de dinheiro público”.
A reação do Quay d’Orsay, o ministério das Relações Exteriores da França, foi imediata e condenou o golpe, pedindo que os resultados das eleições sejam “respeitados”. A primeira-ministra francesa, Elisabeth Borne, disse à imprensa que está “acompanhando com a maior atenção” o desenrolar dos acontecimentos no Gabão.
Intervenções
A França mantém uma base militar no país centro-africano: o Camp Général de Gaulle, perto do aeroporto da capital, Libreville, com 350 militares, segundo estimativas do Instituto Sueco de Pesquisa em Defesa.
O Gabão guarda importantes reservas petrolíferas, mas tem baixa capacidade de refino. É um dos maiores exportadores de petróleo da África, tendo exportado US$ 3,61 bilhões em barris de óleo cru em 2021, de acordo com a OPEP.
O presidente francês, Emmanuel Macron, esteve no Gabão em março, participando da reunião de cúpula de “proteção das florestas tropicais”. Na ocasião, discursou afirmando que a “era das intervenções” imperialistas na África tinha acabado. Meses depois, recusou-se a reconhecer o novo governo do Níger e suspendeu a ajuda financeira ao país.
“O que deve acontecer no Gabão agora é que os militares devem governar em transição até dar tempo para organizar uma eleição propriamente dita, na qual a comissão eleitoral possa conduzir o pleito de forma independente e apurar os resultados adequadamente”, previu Amoah.
Pedro Aguiar
As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul
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